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Como as africanas estão conquistando o direito ao prazer

Têm se registrado avanços no combate à infame mutilação da clitoris na infância, e um dos motivos é que os homens estão sendo envolvidos nas campanhas.

O texto abaixo foi publicado originalmente na versão em português da África do site alemão DW.

Estima-se que entre 100 a 140 milhões de meninas e mulheres em todo o mundo, majoritariamente na África, sofram as consequências da mutilação genital feminina: um ato brutal com consequências dramáticas para a saúde.

Existem muitas variações de mutilação genital feminina, também conhecida por FGM (do inglês, Female Genital Mutilation). A Organização Mundial de Saúde estabeleceu quatro tipos principais:

a) FGM de tipo 1, ou clitoridectomia, são todos os procedimentos que retiram o clitoris, parcial ou totalmente. A função do clitoris é dar prazer sexual à mulher;

b) FGM de tipo 2, ou excisão, consiste em retirar não apenas o clítoris mas também os pequenos lábios (e por vezes  os grandes lábios);

c) FGM de tipo 3, ou infibulação, que consiste em fechar a abertura vaginal. Pode ou não incluir a remoção do clitoris.

d) FGM de tipo 4. Nesta última categoria cabem todos os tipos restantes de mutilação que não têm qualquer objetivo médico, como perfurar, raspar ou queimar a zona genital.

A mutilação genital feminina é mundialmente reconhecida como uma violação dos direitos humanos.

Avanços estão sendo feitos no combate a isso – e uma parte vital nisso foi o envolvimento de homens nas campanhas antimutilação.

“Tradicionalmente tudo o que tem a ver com a educação das meninas é tido como um assunto de mulheres. E esse foi um erro cometido no início pelas ONGs que lutavam contra a mutilação genital feminina: trabalhar apenas com mulheres”.

É o que afirma Franziska Gruber, ativista da ONG alemã “Terre des Femmes”, que se dedica a lutar contra a mutilação genital feminina onde ela é mais praticada – na África. “A experiência mostra que é muito importante envolver os homens. Porque estes em última análise são a razão pela qual a mutilação é praticada.”

Franziska está convicta que a mudança só é possível tendo em consideração a componente masculina.

Nos países onde se pratica a mutilação genital feminina ela é uma manifestação de desigualdade de gênero profundamente enraizada em estruturas de ordem social, econômica e política. Tal como a extinta prática de enfaixamento dos pés das mulheres na China, a mutilação representa uma forma de controle social sobre as mulheres e a sua vida sexual. “Mulheres circuncisadas são vistas como puras, como mulheres fiéis, como mulheres que chegam virgens ao casamento”, diz Franziska.

Nas comunidades onde é praticada de uma forma generalizada a mutilação é geralmente defendida de forma acrítica quer por mulheres, quer por homens. E quem a ela se opõe pode estar sujeito a coisas como perseguição,  desonra e ostracismo. O medo de ser excluído socialmente ou de não arranjar um marido contribui para perpetuar esta prática.

Não casar significa em muitas sociedades, onde a mulher não tem acesso a fontes de rendimento, uma ameaça existencial. Por isso é muito difícil conseguir que a mutilação seja abandonada sem envolver os homens: pais, maridos, líderes religiosos e a comunidade alargada.

Amdou Kani é um pai que dá a cara contra a mutilação numa campanha da UNICEF. “Eu tomei a decisão de não cincurcisar a minha filha. A família me pressionou muito. Mas sou inflexível nesta questão. No século em que vivemos é inimaginável que uma mulher seja mutilada”.

Protesto na Somália contra a mutilação

Apesar de a mutilação genital feminina ainda ser vista por muitos homens como um “assunto de mulheres”, há estudos que mostram que alguns homens se preocupam com as consequências físicas e psicológicas, e preferem casar com mulheres que não tenham sido sujeitas a esta prática.

“É importante tornar claro aos homens que eles se beneficiam do fato de terem uma mulher intacta. Uma mulher sem dores no acto sexual, que não corre o risco de perder o bebê durante o parto”, afirma Franziska. “É por isso importante envolver os homens e os líderes religiosos porque eles têm peso nas suas aldeias ou cidades. Se estes líderes disserem que a mutilação genital não tem nada a ver com o Corão então eles também podem dar uma ajuda importante para que esta prática acabe”.

Em algumas comunidades a mutilação é apoiada por crenças de ordem religiosa. Ainda que esta prática possa ser encontrada entre cristãos, judeus e muçulmanos, nenhum dos seus livros sagrados prescreve a mutilação feminina.

O chefe da Mesquita Central de Lisboa, o ímã David Munir, é muito claro na condenação: “Esta prática nada tem a ver com o Islã. Pelo contrário o Islã condena. É um pecado”.

Diario do Centro do Mundo

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