Como Elon Musk e outros bilionários planejam “salvar a Terra” com filhos “geneticamente evoluídos”

Atualizado em 29 de novembro de 2022 às 16:23
Elon Musk e alguns de seus filhos

A matéria é de Julia Black, no Business Insider. Tradução de Charles Nisz:

Sentados numa sala cheia de brinquedos, Simone e Malcolm Collins lidavam com duas crianças enquanto externavam suas ideias sobre o futuro da humanidade. “Acho que se alguém não resolver o problema, podemos ser extintos”, Malcolm meio que gritou enquanto empurrava seu choroso filho de 18 meses, Torsten, para frente e para trás em uma caminhonete tamanho infantil.

Junto com seu irmão de 3 anos, Octavian, e sua irmã recém-nascida, Titan Invictus, Torsten faz parte de um experimento audacioso. De acordo com os cálculos de seus pais, se cada  um de seus descendentes tiver oito filhos por apenas 11 gerações, a linhagem Collins acabará superando a população humana atual. Malcolm, 36, e sua esposa, Simone, 35, são “pró-natalistas”, um silencioso, mas crescente movimento no mundo da alta tecnologia e do capital financeiro.

Pessoas como os Collins temem que a queda nas taxas de natalidade nos países desenvolvidos, como os Estados Unidos e a maior parte da Europa, leve à extinção de culturas, ao colapso das economias e, por fim, ao colapso da civilização. ]

É uma teoria que Elon Musk defendeu em seu Twitter, que Ross Douthat defendeu no New York Times e sobre a qual Joe Rogan e o bilionário Marc Andreessen brincavam no podcast “The Joe Rogan Experience”. Também tem sido usado de forma alarmante por alguns para justificar a supremacia branca em todo o mundo, desde os manifestantes carregando tochas em Charlottesville, Virgínia, cantando “Você não nos substituirá” até o atirador da mesquita em Christchurch, Nova Zelândia, que abriu seu manifesto de 2019: “São as taxas de natalidade. São as taxas de natalidade. São as taxas de natalidade”.

Buscas sobre  “colapso populacional” no Google dispararam, depois que Musk continuou a levantar a questão depois dele ter gêmeos com uma de suas funcionárias. De acordo com as Nações Unidas, mais de um quarto dos países do mundo agora têm políticas pró-natalidade, incluindo benefícios de tratamento de infertilidade e incentivos em dinheiro para quem engravidar. Enquanto isso, uma série de novas startups de tecnologia de reprodução assistida está atraindo investidores de renome, como Peter Thiel e Steve Jurvetson, alimentando um mercado global de serviços de fertilidade, cujos investimentos em pesquisa atingirão US$ 78,2 bilhões até 2025. (…)

A Genomic Prediction é uma das primeiras empresas a oferecer PGT-P, um novo tipo controverso de teste genético que permite aos pais que fazem fertilização in vitro selecionar os “melhores” embriões disponíveis com base em uma variedade de fatores de risco poligênicos. Os Collins se tornaram a face pública da tecnologia depois de serem apresentados em um artigo de maio da Bloomberg, “A Caixa de Pandora para testes de embriões está oficialmente aberta”. Depois que a peça foi ao ar, disse Malcolm, eles começaram a ouvir falar de outros pró-natalistas ricos nos EUA. Os Collins são os pioneiros dessa aventura genética.

Os Collins me convidaram para ficar na casa deles em Valley Forge, Pennsylvania, antes mesmo de falarmos ao telefone. (Após nossa primeira ligação, na qual revelei que estava solteira, mas esperava ter filhos um dia, Simone também me enviou um e-mail para me convidar a participar de “um Tinder para indivíduos de alto desempenho”: “Como você provavelmente pode dizer, estamos fortemente engajados em ajudar as pessoas a terem famílias, já que os ventos contra ter filhos são fortes hoje em dia!”)

Embora eu não tenha preenchido o formulário de casamento, que listava “Quatro +” e “O máximo possível” como opções para quantos filhos eu queria, fui levada para uma visita a uma casa de fazenda do século XVIII. Na chegada, fui recebida no portão por um cachorrinho e por Malcolm, alegre e bem-apessoado em uma camisa polo preta.

Lá dentro, Simone, imponente até um mês antes da data do parto, usava seu uniforme de grávida com uma camisa oxford branca engomada, saia longa preta e batom vermelho (ignorando o apelo da sogra para não “se vestir como a porra de uma mendiga” na frente da imprensa). Suas roupas, Simone me disse mais tarde, são meticulosamente escolhidas para projetar o tipo de seriedade que seu trabalho exige. Por baixo dos óculos grossos de armação preta, o casal parece, como diriam, “biologicamente jovem”. (…)

Eles chamam o pró-natalismo de moderno, socialmente aceitável e acolhedor – especialmente para certas pessoas. Em 2021, eles fundaram a iniciativa sem fins lucrativos Pronatalist.org. Torsten, 1, cujo apelido é “Toastie”, recebeu seu nome da herança escandinava de sua mãe. Otaviano, 3, recebeu o nome do governante que inaugurou o Império Romano.

A obsessão em produzir herdeiros dificilmente é um fenômeno novo. As elites usaram a linhagem para consolidar dinheiro e poder durante a maior parte da história humana. Mas como os casais no mundo desenvolvido estão cada vez mais adiando a paternidade – ou abandonando-a completamente – pessoas como os Collins estão procurando truques para tornar famílias grandes viáveis em uma sociedade moderna e secular.

Elon Musk e seus gêmeos

Os Collins disseram que foram avisados por amigos para não falarem comigo. Afinal, um campo minado aguarda qualquer um que aborde o tema. A última grande figura a ser associada ao pró natalismo foi Jeffrey Epstein, que planejou engravidar 20 mulheres por vez em seu rancho no Novo México.

A triagem genética e a suposição subjacente de que alguns humanos nascem melhores do que outros muitas vezes criam associações com os experimentos nazistas. Além disso, nossa principal referência cultural para uma sociedade pró-natalista é o mundo brutalmente misógino de “The Handmaid’s Tale”.

Os Collins, que se autodenominam “pragmatistas impiedosos”, consideram a reação contra o pró-natalismo um pequeno preço a pagar. (…)

Os maiores empresários da tecnologia estão preocupados com seu legado há anos. Na década de 2010, a mania da longevidade varreu o Vale do Silício e gente como Jeff Bezos, 58, Sergey Brin, 49, e Larry Ellison, 78, despejaram bilhões de dólares em empresas de biotecnologia para ajudá-los a desafiar a morte. Jeffrey Epstein queria congelar a cabeça e o pênis para serem revitalizados centenas de anos depois, enquanto Peter Thiel, 55, disse ter procurado transfusões de sangue de jovens. (Em resposta ao boato, Thiel afirmou: “Deixo claro, eu não sou um vampiro.”)

A pesquisa antienvelhecimento teve algum sucesso contra doenças específicas, mas como os Ellisons e Bezos do mundo envelhecem, a chance de extensão radical da vida ainda nesta geração se torna mais improvável. Então, alguns deles estão se voltando para a segunda melhor opção: sua progênie. Para quem acredita profundamente na herdabilidade genética das características, transmitir o que consideram seu DNA superior pode ser o caminho definitivo para influenciar o mundo. (…)

Em 2018, Brin e sua então esposa, Nicole Shanahan, que enfrentaram problemas de fertilidade, fundaram o Centro de Longevidade Reprodutiva Feminina do Buck Institute. Thiel, que tem pelo menos um filho com sua parceira, investiu na startup de congelamento de óvulos TMRW e em um novo aplicativo de rastreamento de menstruação chamado 28. Enquanto isso, Ellison, que tem dois filhos na casa dos 30 anos, teve mais crianças – com sua namorada de 31 anos.

Embora o pró-natalismo seja frequentemente associado ao extremismo religioso, a versão que agora está em alta, tem mais em comum com a ficção científica distópica. Os Collins, que se identificam como calvinistas seculares, são particularmente atraídos pelo princípio da predestinação, o que sugere que certas pessoas são escolhidas por Deus para serem superiores na Terra e que o livre-arbítrio é uma ilusão.

Eles acreditam que o pró-natalismo é uma extensão dos movimentos filosóficos comuns em centros tecnológicos como Silicon Hills de Austin, Texas. As conversas frequentemente abordam o transumanismo (fundir capacidades humanas e mecânicas para criar seres superiores), longo prazo (uma filosofia que argumenta que o verdadeiro custo da extinção humana não seja a morte de bilhões hoje, mas a perda preventiva de trilhões de pessoas não nascidas) e altruísmo efetivo (ou EA, na sigla em inglês – um sistema filantrópico focado em impedir que a inteligência artificial elimine a população humana).

O que todos esses movimentos têm em comum é a fixação no futuro. E à medida que esse futuro começa a parecer cada vez mais apocalíptico para as pessoas mais ricas do mundo, a ideia de pró-natalismo soa heróica. É a arrogância típica do Vale do Silício: se a humanidade está à beira do abismo e só eles podem nos salvar, então eles têm a missão de se multiplicar o máximo possível.

De acordo com especialistas em tecnologia, essa retórica está se espalhando nos círculos privados do setor. Em fevereiro, o cofundador do PayPal, Luke Nosek, um amigo próximo de Musk, organizou uma reunião em sua casa no Lago Travis, em Austin, para discutir “O Fim da Civilização Ocidental”, outro bordão comum no discurso da taxa de natalidade.

Enquanto isso, os Collins disseram que um amigo em comum os encorajou a voar para Austin para se encontrar com Claire Boucher, a musicista conhecida profissionalmente como Grimes, que é mãe de dois filhos de Musk. (Grimes, que segue cerca de 1.470 pessoas no Twitter, seguiu os Collins enquanto esta matéria estava sendo produzida).

Faz sentido, uma vez que Musk, pai de 10 filhos conhecidos com três mulheres, é o pró-natalista mais famoso do mundo da tecnologia. Ele tem falado abertamente sobre sua obsessão por Genghis Khan, o governante mongol do século XIII, cujo DNA ainda pode ser encontrado em parte significativa da população humana. Uma pessoa que trabalhou diretamente com Musk, diz que o homem mais rico do mundo falava de “povoar o mundo com sua prole” já em 2005.

Musk tem usado cada vez mais suas redes sociais para defender a causa, tuitando dezenas de vezes nos últimos dois anos sobre a ameaça de declínio populacional. “Se o colapso alarmante na taxa de natalidade continuar, a civilização vai mesmo morrer com um gemido nas fraldas dos adultos”, tuitou ele em janeiro de 2022. A preocupação foca nas “nações produtivas”, para repetir um eufemismo usado em agosto de 2022  por Errol, pai de Elon Musk.

Os Collins chamam essa elite de “sociedade cosmopolita”. O próprio Elon Musk tuitou sobre o filme “Idiocracia”, em que a elite inteligente deixa de procriar, permitindo que os não inteligentes povoem a terra. “Ao contrário do que muitos pensam, quanto mais rico alguém é, menos filhos eles têm. Eu sou uma rara exceção”, escreveu Musk em outro tweet em maio passado. “A maioria das pessoas que conheço tem zero ou um filho.”

Musk estava repetindo um argumento criado por Nick Bostrom, um dos pais fundadores do longo termismo, que escreveu que temia que o declínio da fertilidade entre “indivíduos intelectualmente talentosos” pudesse levar ao fim da “sociedade civilizada avançada”. Émile Torres, um ex-filósofo defensor do longo termismo e hoje crítico da ideia, disse claramente: “Essa visão de mundo acha as pessoas nos países ricos são mais importantes”.

Uma fonte que trabalhou de perto com Musk por vários anos descreveu esse pensamento como central para a ideologia pró-natalista do bilionário. “Ele leva muito a sério a ideia de que sua riqueza está diretamente ligada ao seu QI”, disse ele. Segundo essa mesma pessoa, Musk pediu a “todos os homens ricos que ele conhecia” que tivessem o maior número possível de filhos.

Os laços de Musk com a ciência da longevidade foram gradualmente revelados nos últimos meses. Em setembro, conversas divulgadas como parte da batalha legal de Musk com o Twitter mostraram conversas entre Musk e o especialista em longevidade William MacAskill, que trabalha no Future of Humanity Institute de Oxford.MacAskill se ofereceu para apresentar Musk a Sam Bankman-Fried, empresário de criptomoedas que doou milhões de dólares para pesquisas sobre esse tema.

MacAskill nunca endossou explicitamente o pró-natalismo, mas dedicou um capítulo de seu livro “O que devemos ao futuro”, ao seu medo de que as taxas decrescentes de natalidade levassem à “estagnação tecnológica” – o que aumentaria a probabilidade de colapso civilizacional. Uma solução seria clonar ou otimizar geneticamente um pequeno subconjunto da população para ter “habilidades de pesquisa no nível de Einstein” para “compensar a queda da população”.

Malcolm disse que ficou feliz em ver Musk trazer essas questões ao debate. Ele não tem tanto medo de ser cancelado quanto todo mundo”, Malcolm me disse. “Qualquer pessoa inteligente com uma certa visão filosófica sobre a vida está olhando para o mundo e dizendo: ‘Como podemos criar culturas duradouras que levarão nossa espécie a ser um império interplanetário diverso, próspero e inovador um dia sem temer o impacto de uma pandemia ou um asteróide?'”

Sentado à mesa do café da manhã, após deixar as crianças na creche e ter feito a “caminhada estratégica matinal” que os Collins fazem todos os dias, Malcolm leu em voz alta uma mensagem de texto de sua mãe. Ela queria saber como ele e Simone planejavam monetizar seu “hobby” pró-natalismo. “Lembre-se: tudo é transacional”, disse a mãe de Malcolm.

Gengis Khan, modelo de Elon Musk pela quantidade de filhos

Nascido em uma rica família cantada e decantada em Dallas, Malcolm disse que seus ancestrais incluíam membros proeminentes dos jayhawkers, ativistas anti-escravagistas que se rebelaram contra o Exército Confederado. Após o divórcio de seus pais, Malcolm foi enviado para uma clínica para “adolescentes problemáticos”, uma experiência que ele compara à retratada no filme “Holes”, no qual crianças são enviadas para trabalhar em campos de trabalhos forçados no deserto. (…)

Os próprios Collins foram chamados de “eugenistas hipster” online, algo que Simone chamou de “incrível” quando chamei a atenção dela. Malcolm “vai querer fazer cartões de visita que digam ‘Simone e Malcolm Collins: hipster eugenistas'”, disse ela rindo. “É engraçado que as pessoas tenham tanto medo de serem acusadas de nazismo”, quando estão apenas melhorando seus próprios embriões, acrescentou Simone.

De acordo com a revista médica The Lancet, 183 dos 195 países do mundo estão previstos para ter uma taxa de natalidade abaixo da taxa de substituição – cerca de 2,1 crianças por mulher até 2100. Mesmo nações como a China e a Índia, que já lutaram contra a superpopulação, passarão por uma [ uma forte reviravolta nos próximos anos.

Os demógrafos rejeitaram a ansiedade da população como a de Musk, apontando que a migração internacional de países com populações crescentes ajudará a estabilizar as condições globais. Outros argumentaram que é uma distração ativamente prejudicial de questões mais urgentes, como a crise climática e a desigualdade econômica.

Ainda assim, os governos que temem os impactos de uma pirâmide populacional na qual os idosos superam muito os jovens, começaram a agir. “Alguns países estão restringindo acesso ao planejamento familiar; alguns estão restringindo o direito ao aborto; alguns estão banindo a educação sexual do currículo escolar; e alguns estão propagando estereótipos de gênero que vão contra o empoderamento das mulheres”, disse Michael Herrmann, consultor sênior do Fundo de População ONU.

Depois dos investidores passarem décadas desprezando o chamado mercado de saúde reprodutiva feminina, o mundo corporativo acordou. Martín Varsavsky, um empresário de fertilidade e pai de sete filhos, me disse que era “muito difícil” encontrar investidores em 2016. Mas agora, casais ricos e voltados para a carreira estão acordando em seus 30 e 40 anos e percebendo que é tarde demais para realizar seus objetivos reprodutivos, os investidores – muitos dos quais também querem filhos – estão investindo dinheiro em tudo, desde fertilização in vitro até ventres artificiais.

O mais recente empreendimento de Varsavsky, Gameto, que espera estender as janelas de fertilidade das mulheres, levantou US$ 40 milhões de investidores. Já a Conception, espera criar óvulos humanos viáveis a partir de células-tronco. “Se nossa tecnologia funcionar”, disse o cofundador da Conception, Matt Krisiloff, “ela abrirá as portas para que as mulheres possam ter filhos aos 40 e 50 anos confortavelmente”.

De acordo com os dados do PitchBook reunidos para o Insider, houve 138 negócios de venture capital em femtechs dos EUA em 2021, contra 57 em 2016. Agora em 2022, começaram a se espalhar rumores de que Musk estava pensando em comprar uma grande rede de clínicas de fertilidade.

Alguns investidores veem a tecnologia de fertilidade como uma parte fundamental da manutenção de uma vantagem competitiva no mercado global. Delian Asparouhov, diretor do Founders Fund, disse ao The Times de Londres que seu interesse no tema veio do desejo de “vencer a China” – para ele, a maior  ameaça para a democracia ocidental.

Simone e Malcolm não ficaram surpresos ao saber que, aos 31 anos, tenho apenas uma amiga próxima com um bebê. A média de idade para ter o primeiro filho passou dos 30 anos pela primeira vez em 2019, de acordo com Censo dos EUA, contra 27 anos em 1990. Os Collins não estão apenas preocupados que algumas pessoas estejam tendo filhos mais tarde. Eles temem que as pressões culturais, o surgimento de aplicativos de namoro, crise econômica até o niilismo millennial estejam convencendo as pessoas de que ter filhos é uma má ideia, ponto final.

Malcolm e Simone Collins, pró-natalistas

Em 2021, uma pesquisa com jovens em 10 países constatou que, entre os jovens de 16 a 25 anos, quatro em cada 10 temiam ter filhos por temerem as mudanças climáticas. (Um estudo de 2017 descobriu que cada criança adicional em países desenvolvidos representava 58,6 toneladas métricas de carbono por ano, embora esse número não represente nenhuma mudança política futura.) A Pew Research fez uma pesquisa em também 2021 e descobriu que uma parcela crescente de adultos estavam se comprometendo a permanecer sem filhos, citando razões como  “o estado do mundo”.

Os Collins temem que a sobreposição entre os tipos de pessoas que decidem não ter filhos com a parte da população que valoriza coisas como os direitos dos homossexuais, educação para mulheres e ativismo climático – características que eles acreditam serem geneticamente codificadas – é tão grande que esses valores poderiam finalmente desaparecer.

Muitas pessoas acham que os pró-natalistas querem proibir o aborto, mas quase todos os entrevistados para este artigo se identificaram como “pró-escolha”. Na verdade, a fertilização in vitro pode estar ameaçada em uma sociedade estritamente antiaborto. Os Collins não esperam que todos em países com baixa taxa de natalidade comecem subitamente a ter sete ou mais filhos. Em vez disso, eles se veem como parte de uma parcela da sociedade responsável por criar suas ninhadas para compensar todos os americanos que optarem por não fazê-lo.

Perguntei o que diferenciava sua visão de Gilead, o regime totalitário retratado em “The Handmaid’s Tale” que designa certas mulheres como reprodutoras. “Gilead é o que acontece sem um pouso suave para o colapso demográfico!” Simone respondeu apressadamente. Ainda assim, muitos observadores estão preocupados com o fato de que os pró-natalistas se preocupam menos com quantos filhos as pessoas estão tendo e mais com quem os está tendo.

Questões sobre classe e autonomia corporal podem ser exacerbadas por novas tecnologias de fertilidade. A demanda por mães de aluguel, muitas delas de baixa renda, disparou nos últimos anos, especialmente entre os ultrarricos. No mês passado, uma empresa chamada Cofertility ganhou as manchetes com a promessa de tornar o congelamento de óvulos acessível para aqueles que não podem pagar – desde que o cliente concorde em doar metade dos óvulos para famílias pagantes.

Crianças de famílias ricas sempre desfrutaram de vantagens, desde saúde e nutrição de alta qualidade, até educação cara e atividades extracurriculares. Agora, alguns temem que as tecnologias de testes genéticos darão aos ultrarricos mais vantagens antes mesmo de saírem do útero. “De certa forma, é a forma mais brutal de desigualdade que esse cara vai ser capaz de ter 20 filhos e, na verdade, 20 muito, muito saudáveis – tão bons quanto a tecnologia moderna pode torná-los”, disse Hsu. “Enquanto outras pessoas não poderão se valer disso.” (…)

Assim que os pró-natalistas atingirem uma massa crítica, esperam os Collins, eles poderão começar a moldar a sociedade em torno de suas necessidades. “É preciso criar culturas que recompensem” e ter estruturas para famílias grandes, explica Simone. As questões pró-natalistas para animais de estimação incluem tudo, desde o aumento do desenvolvimento habitacional até a mudança de leis sobre a regulamentação de assentos de carro (um estudo descobriu que as pessoas parariam de ter filhos quando não pudessem colocar mais assentos de carro em seus veículos).

Eles tentaram captar fundos para criar uma comunidade pró-natalista, mas fracassaram. Quando a arrecadação de fundos parou, eles redirecionaram seu foco para o Collins Institute for the Gifted, uma escola on-line especializada em parceria com a Universidade de Austin e bancada por bilionários. A lógica por trás do Collins Institute é: “Se você deseja tornar o futuro melhor para todos e pode optar por melhorar os resultados educacionais dos 10% mais pobres ou do 0,1% mais rico”, os Collins  dizem para escolher o 0,1%.

Os Collins também desenvolveram um sistema para rastrear o progresso futuro de sua família chamado The Index. “Nós registramos como seus filhos se saem emocionalmente, em termos de carreira e se seus filhos permanecem dentro da cultura com a qual foram criados”, explicou Malcolm. Ele disse que espera ver seus filhos discordarem de seu paradigma parental e que eles sejam competitivos o suficiente para criar o seu próprio. Então, 11 gerações depois, quando a extensa família Collins for a cultura dominante da Terra (ou de Marte), eles terão centenas de anos de dados para olhar para trás e aprender.

Um pouco mais de um mês após minha visita à Pensilvânia, Simone enviou uma série de atualizações sobre o nascimento de Titan, incluindo uma selfie de sua cama de hospital, com o bebê recém-nascido em seus braços, usando seu batom vermelho imaculado. Ela retomou seu horário normal de trabalho na segunda-feira após a cesariana (ocorrida na sexta-feira anterior) e daqui nove meses depois, será hora de fazer a próxima transferência de embriões. (…)

Os Collins esperam que os avanços na tecnologia acompanhem o crescimento de sua família. Os empresários reprodutivos que falaram comigo pareciam confiantes de que a ciência iria progredir rapidamente. “Acho que estamos chegando a um ponto em que estamos reinventando a reprodução”, disse Varsavsky. Se empresas como a Conception conseguirem criar embriões viáveis a partir de células-tronco, eles poderiam produzir um grande número deles. Combinado com a triagem genética aprimorada, os pais podem escolher o bebê “ideal” de um grupo muito maior.

“Há uma sedução nessas ideias, porque são grandiosas”, disse Torres. “Trata-se de assumir o controle da evolução humana.” Quanto a Simone e Malcolm Collins, Malcolm disse: “Estamos tentando dar aos nossos filhos a melhor oportunidade da vida”. Eles simplesmente acreditam que a melhor chance de seus filhos também é a da humanidade.