Como fez nos protestos de 2013, a Globo tenta cooptar as ruas despertadas pela morte de Marielle. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 16 de março de 2018 às 16:19
Sequestrando Marielle Franco

A Globo está fazendo uma cobertura extensa sobre uma pessoa que, viva, jamais foi lembrada pela emissora.

Desafio você a encontrar registros de entrevistas, análises, mesas redondas — qualquer coisa — com Marielle Franco.

Ou uma mísera menção a seu trabalho por parte dos jornalistas que ali militam.

Não tem nada, por razões óbvias.

Marielle, vereadora do Psol, defendia o oposto do que o grupo defende.

Seu ativismo pelos negros pobres das favelas, denunciando o abuso policial cotidiano, as chacinas diárias, simplesmente nunca coube na grade.

Mais recentemente, ela tornou-se crítica ferrenha da intervenção militar e relatora de uma comissão para acompanhar o Exército.

De uma hora para outra, gente como Merval Pereira, com sua dicção claudicante, passa a falar em “direitos humanos”, duas palavras que Merval não usa juntas, provavelmente, desde os bancos da escola nos anos 40.

Gerson Camarotti, com seus bastidores inúteis sobre um governo corrupto e golpista, afirma que o assassinato é um “atentado à democracia”.

Eliane Cantanhêde decreta que “o Brasil despertou”.

E por aí vai.

A Globo é cúmplice desse estado de coisas, inventou a farsa interventora com Temer e tenta sequestrar um cadáver e uma ideia que lhe são absolutamente antagônicos.

Foi assim também nos protestos de 2013. No início eram “vândalos” atentando contra o “estado de direito”, “vagabundos” etc.

Assim que o vento soprou para a direita, com as milícias tipo MBL tomando conta, a Globo acertou a rota e abraçou a causa.

Deu no que deu.

Está fazendo a mesma coisa com uma mulher cuja execução covarde acordou as ruas.

Infelizmente, Marielle não está aqui para dizer a esses abutres: “Tirem as mãos de mim”.

Mas nós estamos e isso precisa ficar claro antes que seja tarde.