O Grupo Folha, aos quais pertencem o jornal Folha de S.Paulo (o maior do país) e o portal UOL (o maior do país), deu mais uma prova, nesta quinta-feira (21), de que não age como um veículo à altura da responsabilidade que sua dimensão acarreta.
Se o faz em busca de mais audiência e anúncios ou por ideologia política colocada à frente da missão de praticar bom jornalismo, não se sabe. Mas fato é que uma reportagem com título e manchete mentirosos como a que foi colocada nesta quinta em seus veículos não pode ser explicada por mera incompetência. Com este benefício da dúvida a empresa não poderá contar.
Mas comecemos do começo.
No dia 11 de agosto, o governo federal lançou o programa “Itaipu Mais Energia”. Por meio dele, a empresa estatal Itaipu Binacional passou a participar do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado na mesma data.
Assim, desde então, a empresa passou a ajudar a compor os investimentos de R$ 104,2 bilhões previstos para o PAC no Estado do Paraná (em todo o país, o programa prevê investimentos de R$ 1,7 trilhão nos próximos quatro anos).
A decisão governamental faz todo sentido dentro da lógica de crescimento sustentável social e ambientalmente que o governo federal busca imprimir ao país, segundo já reiterou diversas vezes o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desde que tomou posse em seu terceiro mandato.
Então, o programa “Itaipu Mais que Energia” prevê um repasse total de R$ 931,5 milhões aos municípios paranaenses em projetos que devem fazer parte de, pelo menos, um dos quatro eixos de atuação do PAC: Manejo de Água e Solo; Saneamento Ambiental; Energia Renovável e Obras Sociais, Comunitárias e de Infraestrutura.
A presidenta do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, explica o que motivou o governo a incluir a estatal binacional em seu programa de aceleração do crescimento:
“Foi uma decisão do governo federal estender as ações da Itaipu para todo o estado”, revela Gleisi. “Quando a Itaipu foi criada, para gerar energia, ela tinha uma missão, utilização dos recursos hídricos do Rio Paraná, até a foz do Rio Iguaçu, para o aproveitamento hidrelétrico.
Isso vigorou até 2003 e ela não fazia nenhum investimento, a não ser na geração de energia. Quando o presidente Lula assumiu em 2003, ele deu uma orientação para que a gente mudasse a missão de Itaipu, que passou a ser, a partir de 2003, gerar energia elétrica de qualidade com responsabilidade social e ambiental, contribuindo com o desenvolvimento sustentável do Brasil e do Paraguai, além de garantir a segurança hídrica”.
O repasse em cifra bilionária que a estatal poderá realizar a partir de agora não contém, por óbvio, qualquer ilegalidade, eis a diferença entre uma empresa pública e uma empresa privada. É que a primeira pode direcionar parte de seus lucros para políticas… públicas! Enquanto isso, o lucro das empresas privadas não têm outro destino que não seja o bolso de seus proprietários.
O investimento bilionário da Itaipu em obras de interesse público só foi possível porque o governo Lula decidiu que, agora que foi finalmente encerrada a dívida adquirida pelos militares para construir a usina, que onerava mensalmente os cofres da estatal desde sua fundação (em 1975, quando tiveram inícios as obras, concluídas em 1982), o dinheiro sobressalente vai ser canalizado para obras de interesse social.
Um dos entes que mais comemorou a decisão foi a AMP (Associação dos Municípios do Paraná). É natural que seja assim.
Os prefeitos do estado do sul do país, em que foi instalada a usina, são em sua grande maioria oposicionistas ferrenhos ao PT e foram eleitos por partidos com discurso liberal, de menor intervenção estatal na economia.
Apesar disso, esqueceram seus posicionamentos e felicitaram a medida, visto que boa parte desses recursos ficará à disposição das administrações municipais que apresentarem projetos dentro de um dos eixos do PAC, que são, repita-se: Manejo de Água e Solo; Saneamento Ambiental; Energia Renovável e Obras Sociais, Comunitárias e de Infraestrutura.
Assim, os prefeitos podem até ser liberais, mas não serão contra verbas que poderão viabilizar obras que irão gerar benefícios às suas populações e, de quebra, poderão figurar em suas propagandas eleitorais gratuitas durante as eleições do ano que vem.
Já quem não gostou da medida governamental foi a Abrace, a Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres. É natural que seja assim.
Composta por boa parte das maiores empresas privadas atuando no país, tais como Ambev, Braskem, Bayer, Gerdau e Cargill, o que a Abrace queria era que o governo desonerasse as tarifas pagas pelas suas companhias associadas, e não que passasse a utilizar os recursos excedentes com o fim da dívida militar para financiar obras de interesse público. É a diferença entre uma empresa (ou associação) privada e uma estatal.
Nesta quinta-feira, o Grupo Folha, que não é membro da Abrace, mas que possui visão liberal semelhante à da entidade, achou por bem abordar o programa “Itaipu Mais Energia” em reportagem amplamente divulgada em seus veículos.
Leia, abaixo, a reprodução dos três primeiros parágrafos da citada reportagem. Os destaques em negrito foram incluídos pela reportagem do DCM:
Causou desconforto no setor de energia a ampliação da área de influência da hidrelétrica de Itaipu no lado brasileiro. A região com direito a receber projetos socioambientais e de infraestrutura passou de 55 para 434 municípios, levando o gasto para quase R$ 1 bilhão (US$ 193,9 milhões). Especialistas questionam o uso político e geopolítico de Itaipu com o dinheiro da conta de luz.
A expansão da área e o orçamento robusto sustentam a criação do programa “Itaipu Mais que Energia” para atender todos os 399 municípios do Paraná e outros 35 de Mato Grosso do Sul. Originalmente, eram beneficiadas áreas próximas a bacias hidrográficas de rios na região. Agora, até cidades na praia.
O novo direitor-geral (SIC) de Itaipu, Enio Verri, também já anunciou R$ 600 milhões, em três anos, para a conclusão da Unila (Universidade Federal da Integração Latino-Americana), o que fecharia R$ 1,2 bilhão em investimentos na região neste ano.
Bom, como se nota logo de início (e fica mais evidente ainda ao longo da reportagem), o Grupo Folha não achou graça na destinação dos recursos da estatal para as obras de interesse público.
Até aí, pode-se discordar da linha editorial e ideológica do grupo empresarial de comunicação, mas não se pode dizer que as jornalistas que assinam a reportagem, Alexa Salomão e Catia Seabra, estão sendo flagrantemente antiéticas ou deliberadamente faltando com a verdade em seu texto.
O mesmo já não se pode dizer do título escolhido pelos editores para figurar no topo da reportagem e na capa da Folha e do portal UOL. O título escolhido foi:
“Itaipu usa R$ 1 bi da conta de luz para fazer política para o PT”
Bom, você pode ser liberal o quanto for, mas não pode dizer que este título corresponde aos fatos ou mesmo à reportagem do jornal.
Fazer política para o PT? Financiar obras do PAC é fazer política para o PT? Alguém em sã consciência e moral teria a coragem de dizer isso? E o fato de que os recursos irão “ajudar” exatamente os prefeitos oposicionistas ao PT na eleição do ano que vem, também fazem parte da política para o PT?
E não para por aí.
Conforme exibido acima, as jornalistas da Folha afirmam em sua reportagem que “especialistas questionam o uso político e geopolítico de Itaipu com o dinheiro da conta luz”.
Bom, o jornal ouviu dois “especialistas”. O primeiro é Edvaldo Santana, identificado pelas repórteres como “ex-diretor da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica)”.
É verdade, ele foi mesmo diretor da Aneel, faz mais de dez anos.
Só o que Alexa Salomão e Catia Seabra não contaram é que, depois que deixou o cargo, ele foi para a iniciativa privada. Em 2016, ele assumiu a presidência da… Abrace! Sim, a associação empresarial que mais estrilou contra o investimento social do governo Lula, já que prefere os lucros nos bolsos dos acionistas e não em obras públicas. Nada contra a Abrace preferir que fosse assim, mas como não citar isso na reportagem?
Já o segundo “especialista” ouvido pelo periódico é, nas palavras do jornal, “Rodrigo Ferreira, presidente da Abraceel (Associação dos Comercializadores de Energia), defensor do mercado livre de energia”.
Quer dizer, os especialistas da Folha são defensores do livre mercado, como poderiam ter opinião diferente das que possuem? Caberia é ao jornal que diz plural ouvir fontes que possuem orientação diferente da sua, ou pelo contar o que está fazendo.
Bom, de qualquer forma, todos sabem que a maioria das pessoas só lê as manchetes e os títulos das reportagens hoje em dia. E veja o que foi feito com as manchetes e os títulos do grupo Folha, em apenas dois exemplos, o leitor pode entender que foram dezenas de publicações de mesmo teor:
Parabéns às envolvidas e aos envolvidos.
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