Como Guaidó perdeu a Assembleia Nacional para um ex-aliado. Por Fania Rodrigues, de Caracas

Atualizado em 6 de janeiro de 2020 às 18:05
O novo presidente da Assembléia Nacional, Luis Parra (Imagem: Fania Rodrigues)

POR FANIA RODRIGUES, de Caracas para o DCM

O ex-presidente da Assembleia Nacional Juan Guaidó perdeu a eleição do Congresso, depois de uma sessão parlamentar conturbada. O bloco de 54 deputados do partido chavista PSUV e um grupo 32 deputados opositores, até então opositores ao governo de Nicolás Maduro, se uniram para eleger uma nova mesa diretora, nesse domingo (05).

O novo presidente é o deputado Luis Parra, ex-integrante do partido Primero Justicia, que foi expulso recentemente do partido.

A mesa diretora também está composta de dois vice-presidentes: Franklin Duarte, do partido Copei e José Gregorio, do partido Primero Justicia. A mesa diretora foi eleita com 81 dos 104 deputados presentes. O congresso é composto de 167 deputados e quórum mínimo é de 84 parlamentares.

Bloco opositor se retirando do Congresso depois da derrota (Imagem: Fania Rodrigues)

Objetivo da nova diretoria, segundo o deputado Luis Parra, “é recuperar a institucionalidade da Assembleia Nacional”, que foi declarada em desacato pelo Tribunal Superior de Justiça, em 2015, depois que decidiu empossar dois deputados, acusados de fraude eleitoral, impugnados pela Justiça.

“Assembleia Nacional está em confronto há cinco anos. E qual é o resultado? Pior que nunca. Vá ás ruas e pergunte às pessoas para que veja o grau de frustração de todos. Hoje abrimos as portas para o futuro. Como irmãos podemos brigar, mas temos que buscar o entendimento através desse parlamento”, disse o presidente recém eleito Luis Parra.

Deputado Torroalba (Imagem: Fania Rodrigues)

Juan Guaidó nunca entrou no congresso, ficou do lado de fora, acompanhado por cerca de 10 deputados aliados.

“Fomos testemunhas de um fato inédito, mas que era previsível: o deputado Guaidó não tinha os votos necessários para ser reeleito e, diante dessa situação, se negava abrir a sessão”, afirmou o líder da bancada do PSUV Francisco Torrealba.

O bloco opositor liderado por Guaidó não reconheceu a eleição e afirmou que trata-se de “golpe parlamentário”. “Para nós não teve eleição”, disse o deputado Tomás Guanipa, do Primeiro Justicia. Parte do corpo diplomático, que estava presente, se retirou da Assebleia Nacional no momento em que sessão foi iniciada sem a presença de Juan Guaidó.

Entenda o que aconteceu

O deputado Juan Guaidó, que estava do lado de fora, no pátio do parlamento, desde às 10h da manhã, decidiu não entrar no edifício.

“Ele não entrou porque não tinha os votos”, afirmou Pedro Carreño, do PSUV. Uma comitiva conformada por chavistas e opositores aliados de Guaidó chegou a ser conforma para ir buscá-lo do lado de fora do Congresso, mas voltaram sem o deputado.

Novo presidente juramentando o Secretário da mesa diretora com megafone porque os opositores cortaram o sim (Imagem: Fania Rodrigues)

Todas as bancadas estavam presentes, menos o presidente da casa e os 10 deputados que o acompanhava.

Uma das explicações dos parlamentares presentes é de que segundo o regulamento do congresso, se o presidente da casa está dentro edifício e houver quórum mínimo a sessão pode ser iniciada.

“Ele já vai entrar”, disse o vice-presidente da Assembleia Nacional, Edgar Zambrano a essa reportagem por volta das 12h. No entanto, segundo as regras do parlamento a sessão deveria ter iniciado às 11h.

Depois de três horas espera, 13h, os deputados opositores contrários a Guaidó decidiram fazer um uso do regulamento que, na ausência do presidente do Congresso, permite que a sessão seja aberta pelo deputado mais velho, nesse caso o parlamentar Héctor Aguerro, de 79 anos.

Do lado de fora Guaidó decide entrar, no entanto, estava acompanhado de um ex-deputado que foi investigado, condenado e perdeu o cargo. “Guaidó disse que entraria se o deputado cassado entrasse com ele. O que não foi permitido pelo chefe de segurança do Congresso”, conta o jornalista argentino Hernan Cano, que testemunhos os fatos.

Já quando a sessão estava terminando, com a mesa diretora eleita pela maioria dos deputados, Guaidó tenta pular a grade do pátio com Palácio Legislativo e entrar a força (veja vídeo abaixo).

Porém, foi impedido pelos militares da Guarda Nacional Bolivariana. A sessão já havia terminado e a ordem da nova diretoria era que ninguém mais poderia entrar. Foi nesse momento que ocorreu a cena, que já viralizou nas redes, de Guaidó caindo da grade.

“Ficamos surpresos com o fato do deputado Juan Guaidó não ter entrado do parlamento, disse que era porque não o deixaram passar, mas a verdade é que seus próprios companheiros de partido e o setor opositor não o queria mais como presidente. Ele sabia que ele iria perder. Agora o Congresso tem um novo presidente, que também é um deputado opositor”, disse o deputado Dario Vivas.

O novo presidente da Assembleia Nacional, Luis Parra (Imagem: Fania Rodrigues)

Guaidó fez declarações à imprensa no lado de fora do parlamento. “O que estão fazendo é um golpe de Estado ao único reduto de poder democrático que restava à Venezuela. Tomaram fisicamente ao Palácio Legislativo, desmantelaram o Estado”, disse Guaidó.

Segundo o deputado Dario Vivas essa foi uma briga entre opositores, fruto da divisão entre eles. “Esse é um problema entre eles, um problema do setor opositor, porque estão totalmente divididos e cada um é mais corrupto que o outro. Nós estamos aqui buscando que esse parlamento funcione e realmente possa servir ao povo venezuelano”, disse Dario Vivas, do PSUV.

A próxima sessão do Congresso está convocada para terça-feira da semana que vem. Guaidó afirmou que vai informar, nas próximas horas, qual será a estratégia da oposição liderada por ele.