
Foto: Marcos Corrêa/PR
A elite da velha direita e da nova extrema direita de Bento Gonçalves, na Serra do Rio Grande do Sul, deve estar entre confusa e pesarosa com a situação do ministro Luiz Fux. Em maio de 2022, grandes empresários e altos executivos bolsonaristas impediram que o magistrado aparecesse na cidade.
Fux foi alertado sobre o que circulava em grupos de tios do zap e nas redes sociais de gente da região. Seria expulso, se passasse pelo pórtico em forma de pipa de vinho que há na entrada de Bento.
Fux desistiu de dar uma palestra no Centro da Indústria e do Comércio, marcada para junho, porque achavam que suas conexões eram com a esquerda e com o lulismo. A entidade promotora do evento avisou ao STF que não haveria como garantir a segurança do ministro.
Quem estava sendo ameaçado por facções endinheiradas da Capital do Vinho não era apenas um dos 11 integrantes do Supremo. Era o então presidente da mais alta Corte do país. Fux, a maior autoridade do Judiciário brasileiro, recuou e não foi. Porque tudo poderia acontecer.
Hoje, o ministro é apontado como alinhado às teses da defesa de Bolsonaro e amigo de Trump, que cassou os vistos de oito ministros do STF, mas poupou os de Kassio Nunes Marques, André Mendonça e Fux.
Hoje, lembram que já em 2018, dois anos antes de ser considerado inconfiável pela direita de Bento, Fux impediu Lula de conceder uma entrevista à Folha de São Paulo. Porque era preciso definir limites para a liberdade de expressão.

Vamos relembrar que Fux chegou a escrever que se fazia necessária “a relativização excepcional da liberdade de imprensa”, para que uma entrevista de Lula não interferisse nos resultados da eleição.
Hoje, o juiz punitivista do mensalão e aliado do lavajatismo de Sergio Moro concede a Bolsonaro o que negou a Lula. Hoje, Fux escreve que parte das medidas cautelares de Alexandre de Moraes, na tentativa de conter os ataques de Bolsonaro ao próprio Supremo onde Fux trabalha, “confronta-se com a cláusula pétrea da liberdade de expressão”. E Moraes não está censurando a imprensa, como Fux fez em 2018.
A cláusula pétrea que não existia para Lula se defender existe para Bolsonaro atacar e ameaçar. Porque o Fux de 2018, que censurou Lula, e o mesmo Fux de 2022, que os fascistas de Bento viam como ameaça, mudou de ideia.
Lembrando ainda que lá em 2018 Sergio Moro escreveu, em troca de mensagens com Deltan Dallagnol, que em Fux eles deveriam confiar, para enfrentar as resistências à República da Lava-Jato dentro do STF.
Hoje, Fux repete que as medidas adotadas por seu colega de STF no enfrentamento da extrema direita “restringem desproporcionalmente direitos fundamentais, como a liberdade de ir e vir e a liberdade de expressão e comunicação”.
Fux parece ser outro juiz, mas o fascismo de parte da elite econômica de Bento deve ter preservado suas ideias. Na linha de que a Justiça seja punitiva para as esquerdas e branda para o extremismo de direita.
Hoje, é bem provável que Fux possa entrar em Bento e fazer uma conferência sobre ‘Risco Brasil e Segurança Jurídica’, como deveria ter feito no inverno de 2022.
Bento, onde Bolsonaro teve 75,8% dos votos naquele ano, é um reduto da velha direita impregnado de extremismo. A cidade está no centro de uma região que sofrerá o impacto do tarifaço nos setores vinícola, moveleiro, metalmecânico.
Fux poderia aparecer para falar e para ouvir sobre garantismo, liberdades e altos riscos, incluindo os que chegam dos Estados Unidos, numa região próspera, uma das mais industrializadas do Brasil e com a marca da agricultura familiar de descendentes de italiano. Mas estigmatizada pela ação de extremistas e, dois anos atrás, pela repercussão nacional da exploração de trabalho escravo por grandes empresas.
O ministro ouviria, pela voz de muita gente, que a culpa toda é de Lula. Sairia aplaudido da cidade que um dia o impediu de chegar perto da pipa de vinho. E poderia dizer depois aos bolsonaristas: sempre teremos Bento Gonçalves.