
Foto: GloboNews / Reprodução
No dia 9 de outubro de 2001, o então deputado estadual Rodrigo Garcia (à época, filiado ao PFL) apresentou à Assembleia Legislativa de São Paulo o Projeto de Lei 623/2001. O atual governador e candidato (agora no PSDB) tinha 28 anos. Estava em seu primeiro mandato como parlamentar estadual.
Aquele era o sétimo projeto de lei do agora candidato que era aprovado na Alesp. Todos os anteriores eram dando nomes a viadutos e repartições públicas, além de um outro que tratava sobre colocação de placas turísticas em rodovias, como se pode ver no site da Alesp e em reprodução abaixo.

O referido projeto – que foi aprovado na Alesp e transformado em lei em um intervalo de dois meses – serviu para declarar de utilidade pública a Instituição Assistencial “Rancho de Luz Paulino Garcia”, fundada em 1994 e sediada em São José do Rio Preto, principal cidade da região em que se encontra Tanabi, município onde nasceu Rodrigo Garcia.
As vantagens para uma entidade que é declarada de utilidade pública estão previstas em duas normas estaduais de São Paulo: a Lei nº 10.112, de 04/12/1998 e o Decreto nº 22.695, de 13/09/1984. São, basicamente, os seguintes benefícios: desconto de 50% nas contas de água e luz, concessão de auxílios, verbas e subvenções e autorização para a celebração de convênios com o poder público estadual e municipais.
O projeto do então novato deputado resumia em uma página suas justificativas para a concessão do benefício. Defendia, por exemplo, o valor das ações da entidade voltadas “aos adolescentes e jovens entre 12 e 18 anos, na fase da vida onde a exposição aos vícios e maus costumes é gritante em nossa sociedade. Além das atividades sócioeducativas, também são criadas oportunidades através de cursos profissionalizantes”.
O que não constava na enxuta soma de justificativas apresentadas por Rodrigo Garcia é que a Associação Espírita “Rancho de Luz Paulino Garcia”, sem fins lucrativos, leva o nome de um irmão falecido do tucano, foi fundada e comandada pela mãe dele e hoje tem seu pai como presidente.
Quer dizer: a primeira lei que Rodrigo Garcia apresentou e aprovou na Assembleia Legislativa de São Paulo – com exceção de seis normas anteriores que batizavam viadutos e delegacias de polícia – serviu para conceder benefícios a uma entidade de sua família e, principalmente, para permitir que a mesma entidade passasse a receber verbas públicas e pudesse firmar convênios com prefeituras e governo estadual.
A partir de então, estava criado um duto milionário que canaliza até hoje uma série de verbas e recursos públicos de toda sorte para a associação da família Garcia. Quem mantém o fluxo corrente de ativos são políticos aliados do atual governador e candidato, seja através de emendas, doações, financiamentos ou convênios.
Entre 2003 e 2004, conforme informou o jornal Folha de S.Paulo, o então deputado federal Gilberto Kassab (hoje presidente do PSD, então no PFL) indicou ao menos R$ 300 mil em emendas parlamentares para a instituição. O ex-ministro e o governador eram aliados, mas romperam.
Outro que também enxergou a importância da associação comandada pelo pai de Rodrigo Garcia é o seu candidato a vice, o deputado federal Geninho Zuliani (União Brasil). Foi ele quem assinou duas emendas – em março deste ano, 2022 – direcionando mais de R$ 500 mil ao “Rancho de Luz Paulino Garcia”, conforme também noticiou a Folha de S.Paulo.
Aliado de longa data de Rodrigo Garcia, Geninho justificou suas emendas louvando as qualidades dos serviços prestados pela associação do pai do governador. Mas, para a população de São José do Rio Preto, a prefeitura local preferiu omitir a informação sobre o parentesco famoso dos donos da associação, e assim informou oficialmente aos munícipes a respeito de parte da verba alocada:
A Prefeitura de Rio Preto, por meio da Secretaria de Assistência Social, entregou na quinta-feira, dia 3, para a Associação Espírita Rancho de Luz Paulino Garcia, materiais permanentes adquiridos por meio de emenda parlamentar, indicada pelo deputado federal Geninho Zuliani, no valor de R$ 200 mil.
“A iniciativa de indicar emenda parlamentar ao nosso município é digna de reconhecimento, ainda mais sendo destinada a essa entidade que presta um serviço tão sério. Rio Preto agradece de coração”, disse o prefeito Edinho Araújo em seu discurso.

Geninho e Kassab estão longe de serem os únicos políticos aliados de Garcia a beneficiar a entidade dos pais do governador. O prefeito de São José do Rio Preto, Edinho Araújo (MDB), é só mais um deles. O político é amigo pessoal e um dos articuladores da campanha do candidato tucano.
Só entre 2017 e 2018, por exemplo, por meio de um só termo de colaboração, o prefeito canalizou quase R$ 1 milhão à entidade do pai de seu aliado, conforme se lê em documento oficial da prefeitura, que pode ser visto na íntegra clicando aqui, ou em trecho reproduzido abaixo.

O mesmo prefeito Edinho, durante mandato anterior no mesmo município, foi autor do projeto e sancionou a lei nº 9283, de 21 de junho de 2004, por meio da qual fez correr mais R$ 3.000 por mês – durante 24 meses iniciais, que foram acrescidos de mais 24 ao fim do contrato – ao “Rancho de Luz” dos Garcia.
Esses valores – de 2004 – não entram na conta que fez o jornal Folha de S.Paulo, que demonstrou, com base em documentos públicos, que a entidade do pai do governador recebeu R$ 4 milhões de aliados políticos somente de 2017 até hoje.
Também adiciona-se ao montante milionário divulgado pelo periódico os recursos públicos advindos da Lei Municipal nº 9.284, de 21 de junho de 2004, que despejou mais R$ 30 mil no Rancho dos Garcia.
Ainda é preciso somar a quantia de R$ 1,74 milhão, que desaguou na entidade dos pais de Rodrigo Garcia por meio do Convênio 024/2015, assinado pelo então prefeito Valdomiro Lopes da Silva Júnior (PSB), outro aliado de longa data do governador.
Ainda a todos esses recursos devem ser acrescidos aqueles vertidos pela Lei 10.100, de 24 de março de 2008, também de São José do Rio Preto. Por meio da norma, sancionada pelo então prefeito Edinho, a entidade do pai de Rodrigo Garcia recebeu a concessão gratuita de um imóvel público de mais de 3.000 metros quadrados, para ocupação e usufruto exclusivos por cinco anos, vigência esta que foi posteriormente expandida por mais três anos.
Em 2016, chegou ao fim o prazo de ocupação gratuita do grande imóvel (para se ter uma ideia, a mansão que a apresentadora Xuxa colocou à venda em 2019 na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, tem 2.600 metros quadrados. Veja fotos aqui).
Eis que o então prefeito de Rio Preto, Valdomiro Lopes da Silva Júnior (PSB), assinou a Lei 12.205 de 29 de junho de 2016, por meio da qual renovou por mais cinco anos o uso livre de qualquer custo do imóvel da prefeitura concedido à entidade dos Garcia.
Se por excesso de verba pública canalizada ou por serviços prestados, fato é que o vice de Rodrigo Garcia ainda teve o requinte de indicar a associação do pai de Rodrigo Garcia para o Prêmio Zilda Arns 2022, a maior honraria concedida pelo Congresso Nacional a entidades sem fins lucrativos, como se pode ver clicando aqui ou em trecho de documento, reproduzido abaixo.

Outro lado
A respeito das leis criadas e do fluxo de recursos públicos direcionados à entidade “Rancho de Luz Paulino Garcia”, tanto Rodrigo Garcia quanto seu candidato a vice afirmaram que o fato da entidade ser pertencente à família Garcia é mera concidência, e que as leis e recursos que verteram à entidade se devem aos bons serviços que a associação presta em Rio Preto.