Como uma operação contra o Hezbollah no Brasil em 2016 prendeu criador de galinhas

Atualizado em 9 de novembro de 2023 às 11:57
Israel Pedra Mesquita. Foto: reprodução

Operação da Polícia Federal deflagrada nesta quarta-feira (8) reascendeu o interesse no caso de Israel Pedra Mesquita, jovem criador de galinhas do Rio Grande do Sul condenado à prisão por envolvimento em uma célula terrorista durante os preparativos para os Jogos Olímpicos Rio 2016. O objetivo da ação, chamada “Tapiche”, foi interromper atos preparatórios de terrorismo no Brasil. Os alvos são ligados ao Hezbollah, que estaria planejando ataques contra prédios da comunidade judaica no país.

Em 2016, evidências coletadas pela PF na Operação Hashtag, uma das maiores ações antiterrorismo já realizadas no Brasil, incluíram interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, que revelaram planos de ataques inspirados no Estado Islâmico (EI).

Nos diálogos interceptados, Mesquita afirmou: “É hora de caçar judeus, esses ratos. O mundo deve ser libertado dessa nova ordem mundial vigente. Adolf Hitler começou o serviço, temos de concluir.” No entanto, quando depôs à PF após ser preso em junho do ano passado, o agricultor não negou sua simpatia pelo EI, mas alegou que não tinha a intenção de realizar ataques no Brasil.

Durante o processo, o jovem afirmou, em resumo, o seguinte:

  1. Ele simpatiza com o EI devido à luta contra injustiças contra muçulmanos.
  2. Concorda com o atentado ao jornal satírico francês Charlie Hebdo devido ao uso inadequado da imagem do profeta, resultando em mortes.
  3. Participou do grupo Sharia no Brasil Já, que prega a guerra santa em defesa do islamismo.
  4. Conheceu virtualmente homens que o convidaram para lutar na Síria, embora isso nunca tenha se concretizado.
  5. Expressou hostilidade em relação aos judeus devido ao ódio.
  6. Não planejava realizar ataques no país.
  7. Acredita que os xiitas, uma vertente minoritária do islamismo, são infiéis e concorda com as quatro opções dadas a eles: pagar para viver, aceitar o Islã, morrer ou deixar as terras sunitas, uma vertente muçulmana à qual o EI está ligado.

Meses após seu depoimento à PF, em dezembro, o juiz Marcos Josegrei da Silva da 14ª Vara Federal de Curitiba interrogou os oito suspeitos denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) e que se tornaram réus. A versão de Mesquita mudou durante esse interrogatório.

Ele afirmou que estava “nervoso” quando depôs à PF e falou o que eles queriam ouvir. Mesquita destacou que não tinha advogado na ocasião. Na sentença de condenação, o juiz explicou que a lei não prevê a presença de advogado em todas as fases da ação e que o depoimento foi filmado, sem indícios de coação.

Ao juiz, Mesquita negou ser administrador do perfil Mujahedin, ligado ao EI, no Facebook, mas se recusou a comentar a postagem, na linha do tempo de sua conta pessoal, dos dizeres: “Cada dia que passa tenho mais nojo desse maldito povo judeu. Ratos imundos, que insultam o nome do Profeta”.

Açoita Cavalo, interior da cidade de Morro Redondo, no Rio Grande do Sul, onde Mesquita vive com a família. Foto: Marcelo Kervalt / Agência RBS

Afirmou não se recordar ao ser apontado como administrador do grupo Jundallah (admiradores do EI) no Telegram e disse que, a inteção das comunicações mantidas pelo aplicativo e pelo WhatsApp com os outros réus era a de “basicamente aprender religião”: “Conheci eles (pessoalmente) na prisão”, disse.

Após mais alguns minutos da conversa, o procurador insistiu: “Vocês ficavam só perdendo tempo conversando nos grupos então?”. “(Ficávamos) só brincado, só de brincadeira”, respondeu o criador de galinhas.

Dias após esse depoimento, em dezembro, o gaúcho foi libertado sob a condição de permanecer em sua cidade e se apresentar regularmente à PF. A mãe de Mesquita, que tem grande afeto por animais, compartilhou como ele costumava preferir receber animais como presentes durante a infância, como galinhas, porcos e cavalos.

No bairro onde Mesquita cresceu, os amigos de infância mencionaram que notaram suas primeiras manifestações de interesse pelo islamismo cerca de cinco anos atrás, embora tenham inicialmente acreditado que ele estava apenas brincando para chamar a atenção.

Em 2016, a comunidade em Pelotas, onde sua família vivia, ficou chocada ao saber da prisão do jovem, que foi acusado de ultrapassar os limites de sua crença e seguir um caminho extremista. Na cidade de Morro Redondo, onde Mesquita vive com sua família, os moradores não têm queixas sobre ele.

Desde que deixou a prisão, ele tem se dedicado a buscar leite e cuidar de seu avô doente e dos animais de sua propriedade. Torcedor do Grêmio, quando vai ao mercado, gosta de conversar sobre futebol e discutir o desempenho do time.

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