Conib porta-se como bancada política israelense, aproxima-se de evangélicos e ataca Lula

Atualizado em 25 de novembro de 2023 às 12:44
Cúpula da Conib durante convenção: ao centro, o presidente Claudio Lottenberg e à esquerda Daniel Leon Bialski, vice

No últimos dias, o Brasil tem sido, insistentemente, apresentado pela chamada grande mídia a uma certa Conib, sigla que, se fôssemos chutar pela combinação de letras, parece representar uma cooperativa de crédito ou algum congresso batista. A Conib, Confederação Israelita do Brasil, fundada em 1948, diz “representar e coordenar” a comunidade judaica do Brasil, a segunda maior da América Latina, com 120 mil judeus, antecedida apenas pela da Argentina.

Tem site politicamente engajado, que divulga notícias, lança campanhas, avisa de censuras travestidas de processos e pede doações – não que precise, claro. É muito bom que as comunidades de povos que migraram para um país tenham representantes, caso da Federação Árabe-Palestina do Brasil (Fepal), que estima ter 60 mil imigrantes e refugiados palestinos, incluindo os descendentes, vivendo em sua maioria em São Paulo. A Fepal é bem mais jovem, de 1979, e não consegue na mídia uma fração mínima do espaço dado à sua congênere judaica.

O presidente da Fepal é Ualid Rabah, um ativista de direitos humanos, que chegou a ir ao Congresso, em 7 de novembro, denunciar o “primeiro genocídio televisionado da história humana”, mas ninguém deu muita bola.

Tente achar notícias sobre isso. A Conib, no entanto, tem bombado – o trocadilho foi involuntário – na mídia brasileira e suas informações, releases, vídeos e declarações, mesmo em off, viraram a palavra de defesa do povo judeu na mídia brasileira. Por trás de tudo, um médico oftalmologista, o chefe do Hospital Albert Einstein e presidente da Conib, Claudio Lottenberg, fugurinha carimbada, com suas mensagens contra o “crescimento exponencial do antissemitismo” no Brasil.

Lottenberg lidera, junto com o embaixador de Israel, Daniel Zonshine – aquele mesmo que convidou Jair Bolsonaro, no último dia 8, ao Congresso, e tentou capitalizar em favor do ex-presidente a repatriação dos brasileiros que ainda estavam impedidos de deixar a Faixa de Gaza – a frente de ataques diretos ao governo brasileiro, especialmente depois que o presidente Lula ousou dizer o óbvio: que o contra-ataque que o Estado de Israel pratica não passa de atos de terrorismo, um massacre contra civis, sob a justificativa de apenas combater o Hamas.

Se você ouvir uma frase em off, na mídia, de “líderes” da comuniade judaíca, não tenha dúvidas: a Conib se pronunciou. Especialista em pautar temas sociais e religiosos que possam causar combustão política e beneficiar a direita, a Frente Parlamentar Evangélica tem feito coro à causa judaíca. Uma espetacular frente de chantagens.

Mas a Conib, nos últimos anos, não feito apenas o seu papel civil de “preservação da memória e da não banalização do Holocausto, contra o antissemitismo e contra o discurso de ódio” – com diz, em seu site, pregar – e sobre isso, total apoio. No último dia 16/11, quinta, a Conib fez sua 54ª Convenção, liderada por Claudio Lottenberg, que, lembrando muito a dicotomia dos discursos rasos de Jair Bolsonaro em seu governo, discursou dizendo que “existem dois lados, o do bem e o do mal”.

Além de Lottenberg, também discursou Ben Sax, chairman da ADL (Anti-Defamation League), instituição norte-americana à frente de uma espécie de cruzada mundial contra o antissemitismo. Entre outros políticos, estava lá o governador de São Paulo, o bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos), babando tabules – e sem ser fustigado pela mídia por tomar partido no conflito.

Cúpula da Conib com o governador Tarcísio de Freitas, de SP, durante convenção. Ao fundo, entre Tarcísio e o vice Bialski, o presidente da Conib, Claudio Lottenberg

O chefe da Conib, Claudio Lottenberg, que também vem a ser presidente do Conselho do Hospital Albert Einstein, referência nacional, e do Instituto Coalizão Saúde, não é uma figura estranha ao clã Bolsonaro. Com a Covid campeando e Bolsonaro fazendo campanha anti-vacinas, foi ele um dos convidados, em abril de 2021, de um jantar com Bolsonaro e a cúpula do governo federal para discutir medidas para amenizar os efeitos da pandemia.

Saiu de lá não defendendo vacinas, mas concordando que o lockdown não deveria ser generalizado e argumentando que “decisões envolvendo a crise gerada pela pandemia não devem ser politizadas”. Na mesma época, em entrevista à Jovem Pan, defendeu maior “aquisição de vacinas pelo setor privado como facilitador”. Para ele, a vacina não é nem privada e nem pública, mesmo naquelas circunstâncias, com a Covid ceifando milhares de vidas.

No começo do seu mandato, Bolsonaro, que, como seus filhos, viu Israel como exemplo de Estado militarizado e belicista dos sonhos, deu um tratamento especial à comunidade judaica e prometeu até levar a embaixada do Brasil para Jerusalém. Era evidente, já na época, que essa aproximação do presidente com o Estado de Israel foi uma tentativa de buscar apoio dos papa-bíblias do eleitorado evangélico. Agora, com o massacre de palestinos em Gaza, Bolsonaro vê, de novo território para pregar no deserto para seus patriotas, com seu filtro para as verdades, usando, como sempre, sem escrúpulos, um assunto grave e complexo – pouco compreendido pela maioria da sociedade.