Coordenador de campanha de Doria é acusado em esquema de carga roubada. Por José Cássio

Atualizado em 23 de outubro de 2018 às 18:05
Doria e Orlando Morando

O coordenador de campanha do tucano João Doria ao governo de São Paulo, Orlando Morando, que é também prefeito de São Bernardo do Campo pelo PSDB, é citado junto com seu irmão, Deiner Antônio Morando, no inquérito policial 134/2018, que apura receptação e venda de carga roubada em São Paulo.

Consta no boletim de ocorrência 165/2018, da delegacia seccional Norte, no bairro da Casa Verde, lavrado pelo delegado Carlos Alberto da Cunha em 5 de setembro.

Na síntese do documento, Cunha expõe que “policiais civis da equipe BS 11 comunicaram que uma carga de papeis sulfite A4 havia sido desviada e distribuída a diversas lojas da empresa Mercadão Atacadista”.

A Mercadão Atacadista, em seus cadastros, não consta no histórico da empresa vítima. Foram levantados os endereços “onde tais mercadorias estariam sendo comercializadas, locais estes visitados, bem como localizados e apreendidos papeis da marca ALLMAX, apreendidos e devolvidos à vítima”.

Ainda de acordo com o BO, o empresário Eduardo Munhoz, proprietário da Mercadão Atacadista, compareceu ao distrito informando que adquiriu a mercadoria da empresa MD Supermercado, cujo proprietário é Deiner Orlando Morando, irmão e sócio do prefeito de São Bernardo.

Leia o que diz o documento sobre a justificativa de Eduardo Munhoz, proprietário da Mercadão Atacadista:

“Seu amigo Rodrigo Faias, proprietário do Supermercado Public, o procurou informando que tinha conhecimento de uma carga da papel sulfite, questionando se tinha interesse na compra; informou ainda que o vendedor seria Orlando Morando, pessoa que já havia vendido outras cargas para Rodrigo e que já existia uma boa relação comercial entre ambos”.

O comprador prossegue informando que sentiu confiança “quando soube que Orlando Morando seria prefeito de São Bernardo do Campo e que, após o acerto do preço, passou a tratar com Deiner Morando”, irmão do coordenador de campanha de Doria, pessoa que, ainda segundo o proprietário da Mercadão Atacadista, “realizou toda a negociação”.

No interrogatório contou ainda que após receber os fiscais em seu estabelecimento entrou em contato com Morando “solicitando a nota de compra da mercadoria”.

Recebeu o documento mas acabou surpreendido por um outro fato: constatou que a empresa que “vendeu” o produto para os Morando, a Nascimento e Menezes Comércio de Alimentos Ltda, “cancelou a nota fiscal de venda minutos após sua emissão. E que, mesmo tendo recebido a notificação do cancelamento pelo sistema eletrônico, a Supermercado Morando não repassou a informação”.

Pouco se sabe sobre Deiner Morando, mas sobre o irmão, Orlando, sabe-se que, além de histórico papagaio de pirata de figuras do PSDB, surgiu e cresceu na vida pública destilando ódio ao PT e fala dos horrores da corrupção como se fosse madre Teresa de Calcutá.

Conseguiu eleger a mulher, Carla, para uma cadeira na Assembléia Legislativa de São Paulo a partir do ano que vem.

Carla anunciou para a imprensa do ABC na semana passada que o foco da sua atuação é economizar dinheiro público – lançou um abaixo-assinado eletrônico para que deputados que residam a menos de 100 quilômetros da Assembleia abram mão de carro oficial.

Prevê uma economia de R$ 5 milhões por ano com combustível e manutenção.

“Austeridade financeira tem sido item fundamental em administrações públicas. Trata-se de um dever com a sociedade e responsabilidade de parlamentares, prefeitos governadores para manter os órgãos com saúde financeira, preservando os serviços ofertados, futuros projetos e investimentos”, ensinou a primeira-dama de SBC.

A austeridade que prega para a administração pública parece não ter respaldo nas empresas da família.

Diante do delegado de plantão, o cunhado Deiner Morando tentou explicar a aquisição e a venda da carga roubada de sulfite. 

Diz nos autos que “foi procurado através de contato telefônico por um conhecido denominado Leandro, cujo nome completo desconhece, porém é um antigo conhecido comercialmente, e que Leandro lhe ofereceu 24 paletes de papel e que então passou a realizar contatos telefônicos com algumas pessoas para adquirir a mercadoria oferecida de forma repartida…”

O irmão e sócio do prefeito prossegue contando sobre a operação e se mostra surpreso ao ser informado de que a nota de venda que recebeu, fornecida pela empresa Nascimento e Menezes Comercial, foi cancelada minutos após a emissão.

Então conta ter tentado contato com Leandro, aquele de quem não faz a menor ideia do sobrenome, mas este “não mais atendeu suas ligações”.

Leandro, que vem a ser Leandro Berdaque Gonçalves, comerciante, também compareceu ao distrito para se explicar.

Consta nos autos que, inquirido pela autoridade, respondeu que “foi procurado por Carlos Eduardo, revendedor da Menezes e Nascimento” (a empresa que cancelou a nota de venda da carga ao supermercado dos Morando) “e que, por não ter aporte para a compra, sugeriu que procurassem Deiner Morando, ate porque ambos já se conheciam e já tinham feito outros negócios.”

E segue o baile.

Essa história, que começou em setembro e ainda não terminou, é um pequeno recorte que pode, ou não, dependendo do desfecho, revelar algo que muitos desconfiam mas é sempre difícil provar: nem sempre o que os políticos pregam em cima do caminhão do som condiz com a realidade das suas ações no dia a dia.