Coronel bolsonarista que negava gravidade do coronavírus quase morre de covid e avisa: “O vírus é mortal”

Atualizado em 23 de setembro de 2020 às 21:05
O coronel, nos tempos em que demonstrava arrogância, e agora, no leito hospitalar

Por Joaquim de Carvalho

O coronel da reserva Carlos Alves, que ganhou notoriedade ao ameaçar a ministra Rosa Weber, presidente do TSE nas eleições de 2018, e mais recentemente por divulgar vídeos que colocam em dúvida a pandemia, andou sumido da rede social. Hoje, ele reapareceu, depois de 24 dias sem postar nada no YouTube, onde tem mais de 90 mil inscritos. E revelou que quase morreu por conta do coronavírus.

Carlos Alves também ameaçou o STF e, por medida cautelar, é proibido de se aproximar da corte em Brasília.

No vídeo de hoje, o homem que demonstrou arrogância quase chora, ao falar do que sofreu por causa do coronavírus, que não considerava grave como os cientistas diziam.

Segundo seu relato, no dia 12 de setembro, ele teve parada cardíaca durante cinco minutos, o cérebro deixou de receber oxigênio, e ele desmaiou.

A mulher fez massagem cardíaca enquanto ele defecava e urinava. “Como acontece com todas as pessoas que morrem”, afirmou.

Carlos Alves expeliu pela boca um líquido esverdeado, que ele comparou ao vômito que apareceu no filme O Exorcista.

Foi levado para o hospital e lá ficou até que hoje, sete dias depois, ele voltasse a se comunicar com seus seguidores.

Seu relato é muito do diferente de outro que fez no dia 6 de maio, quando a pandemia já estava em ascensão.

No Rio de Janeiro, onde mora, havia oficialmente mais de 60 mil casos notificados e cerca de 5 mil óbitos. Hoje são cerca de 260 mil casos, e 17 mil mortes.

No Brasil, são mais de 4,6 milhões de casos e cerca de 140 mil óbitos.

Na live realizada em maio, o coronel está em um cemitério no Rio de Janeiro, que ele avisa ser um dos maiores da cidade. A intenção dele é mostrar que há exagero nas notícias sobre a pandemia.

“Mas o que eu quero mostrar a vocês meus amigos é que o ccoroavírus deve ter feito um milagre tremendo. Fala-se em muitas mortes, milhares de mortos, milhares de pessoas baixadas aos hospitais e, no entanto, vejam bem a tranquilidade, o vazio em um cemitério”, comenta.

Ele, então, decide entrevistar funcionários do cemitério, próximo do carrinho onde se lê Rio Pax.

“Como está o movimento aqui no cemitério? Está normal?”.

O funcionário não percebe que o coronel fala com ele e continua a mexer nos pequenos contêineres de lixo. O coronel segue na narrativa. “

Normalmente, o cemitério, minha família toda está enterrada aqui. Nossa, é cheio demais, está vazio demais. Está vazio, vazio, vazio, vazio.”

O funcionário pergunta então se o coronel fala com ele.

“Não, não. Não estou falando com você, não.”

O coronel continua caminhando e, aparentemente, toca no tema central do vídeo:

“Afinal de contas, estamos sendo enganados? O que está por trás do coronavírus? Qual é, realmente, a intenção da nova ordem mundial, mancomunada com governantes mal intencionados?”

Ele se dirige à capela e comenta que está vazia. “Não há velório”.

O coronel registra que só os coveiros estão no local e diz que, há mais de dois meses, ninguém é enterrado ali.

“A pergunta que não quer calar: Onde estão sendo enterrados, onde estão sendo sepultados os mortos do chamado coronavírus? Onde? É o que nós queremos saber: não é montagem, não é fake. Eu estou realmente dentro de um cemitério.

Alves compara o cenário vazio com o dia em que o tio foi sepultado, em 2018. “Além do meu tio, havia mais uns dez ou 15 sepultamentos aqui”.

Ele, então, coloca em dúvida as informações oficiais sobre a pandemia.

“O que está acontecendo, gente? O que está acontecendo? Só Deus sabe o que se passa na mente satânica das pessoas que estão tentando destruir o nosso país. Tudo por ganância. Estão tentando destruir o Brasil.”

Quando foi internado no Hospital Central do Exército, no Rio de Janeiro,  o coronel descobriu que estava com 50% do pulmão comprometido.

No vídeo de hoje, ele não faz propaganda da cloroquina, embora diga que o medicamento fez parte do coquetel que lhe foi ministrado, juntamente com muitos outros remédios.

Ele também recomenda aos seguidores que usem a máscara ao irem para a rua, o que ele não fez, por exemplo, em maio deste ano, quando transmitiu a live diretamente do cemitério.

Também falou para os que o seguem para respeitarem o distanciamento social, o que Bolsonaro — a quem ele apoiou a ponto de ameaçar Rosa Weber — não faz, como se vê em seus atos de campanha eleitoral antecipada.

O coronel da reserva também pediu para que as pessoas não usem o ônibus lotados. “Eu sei que, se você não pegar, vai chegar atrasado e vai perder o emprego. Mas e se você perder a vida?”, pergunta.

Claro que a solução está no fortalecimento de programas sociais que garantam proteção a quem  não tiver remuneração, mas o arrependimento de Carlos Alves não chegou a tanto.

O que ele sabe é que o coronavírus é muito mais letal do que imaginava antes de adoecer.

“Pessoal, o coronavírus mata. No começo, não se tinha ainda esse conhecimento que se tem hoje”, afirmou.

Tinha, mas a politização da doença, capitaneada por Bolsonaro, impedia que seus apoiadores enxergassem a realidade.

No vídeo, ele avisa que seu propósito é fazer um apelo, em razão do compromisso com a verdade que firmou com seus seguidores.

“Pessoal, não facilitem com essa doença. No dia 7 de setembro, houve um abuso dos cariocas na praia, por total irresponsabilidade das pessoas que não informam, não sabem como informar, por má intenção, não sei por que motivo é. Fato é, meu amigos, o seguinte: a covid é um mal que não escolhe idade, não escolhe idade (repete, com ênfase), não escolhe local”, afirmou.

Os servidores públicos, incluindo ministros, que informavam a população foram demitidos por Bolsonaro e, apesar da dramaticidade do relato do coronel, alguns seguidores comentavam no chat que ele deveria ter tomado o vermífugo invermectina depois dos primeiros sintomas da doença.

Como se vê, em alguns casos, a ignorância é um mal de cura muito mais difícil do que o coronavírus. E mata, sobretudo quando ela é parte dos atributos de quem ocupa a presidência da república.

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Seguem os três vídeos em que trata da doença. No primeiro, ele nega gravidade. Nos outros dois, conta que quase morreu: