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Crise com Mais Médicos é a mais grave até agora. Por Helena Chagas

Jair Bolsonaro. Foto: José Cruz/Agência Brasil/Agência Brasil

Publicado originalmente no site Os Divergentes

POR HELENA CHAGAS, jornalista

Pelo jeito, será a duras penas que o presidente eleito Jair Bolsonaro aprenderá a diferença entre o discurso fácil de campanha e a responsabilidade pelos atos de governo. Depois da confusão sobre a transferência da embaixada brasileira em Israel, que colocou em risco nosso pujante comércio com os países árabes, e outros vaivéns, o episódio que levará à retirada de quase nove mil médicos cubanos do país é, sem dúvida, a mais grave consequência de sua incontinência verbal.

Grave porque, acima e além de qualquer ideologia ou troca de desaforos internacionais, está a retirada do atendimento médico a milhões de brasileiros que vivem nas periferias das grandes cidades e nos grotões do interior.

Os médicos cubanos não vieram parar aqui por acaso, nem por uma irresistível afinidade ideológica com o governo do PT. Aqui chegaram para preencher vagas nas unidades básicas de saúde que os médicos brasileiros não quiseram ocupar. É bom lembrar: o primeiro ato do programa Mais Médicos foi oferecer esses empregos a médicos brasileiros. Poucos se interessaram, e déficit na relação medico-pacientes no Brasil continuou enorme até a chegada dos cubanos. Ainda é grande, mas se você fizer uma pesquisa junto aos pacientes da periferia verá que eles preferem ter os médicos cubanos do que médico algum.

A decisão de Cuba, provocada pelas palavras do novo presidente brasileiro e pelas exigências anunciadas pelo novo governo, deve representar, de quebra, o fim do Mais Médicos. Os brasileiros não vão preencher essas vagas. Outros estrangeiros serão desencorajados pela necessidade de fazer o Revalida, principal obstáculo ao exercício da medicina aqui por médicos formados no exterior.

Só para lembrar: o STF julgou legal o programa Mais Médicos quando as corporações médicas brasileiras contra ele recorreram, autorizando a dispensa da validação do diploma no acordo fechado com Cuba em julgo de 2013, intermediado pela Opas.

Destruir é fácil. Faz-se num instante. Difícil será construir uma solução para milhões de pacientes. E não falamos sequer do problema diplomático que se avizinha, com o convite de Jair Bolsonaro aos médicos cubanos que não querem deixar o país. Poucas vezes viu-se oferecimento tão claro e desabrido de refúgio ou asilo internacional nesse tipo de circunstâncias.

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