Cúpula do Exército burla Lei para proteger Mauro Cid. Jeferson Miola

Atualizado em 22 de janeiro de 2024 às 23:19
Tenente-coronel Mauro Cid. Foto: Lula Marques/Agência Brasil

O Alto Comando do Exército burla leis e normas militares com objetivo de proteger o multi-delinquente Mauro Cid.

A cúpula fardada apenas simula compromisso com a legalidade, mas na realidade atua para proteger o tenente-coronel, garantir sua impunidade e a promoção dele ao posto de coronel.

Reportagem do jornalista Cézar Feitosa com “generais ouvidos [em off] pela Folha” relata que “a cúpula do Exército espera que o Ministério Público Federal apresente denúncia contra o tenente-coronel Mauro Cid antes de abril”.

Segundo esta versão militar, caso Mauro Cid não seja declarado réu pela justiça civil até o dia 30 de abril, não haverá nenhum impedimento para o ascenso dele na carreira. “Pelas regras atuais, Cid poderia ser impedido de concorrer à promoção caso se tornasse réu na Justiça”, alegam.

No fundo, o Alto Comando trabalha pela impunidade de Mauro Cid, do mesmo modo como procede em relação a todos oficiais e militares implicados em diversos crimes, ilícitos, desvios, esquemas de corrupção e, claro, nos atendados contra o Estado de Direito.

É preciso lembrar que os militares continuam impunes e praticamente impuseram uma anistia tácita a si próprios. Desde os atentados de 8 de janeiro, há mais de um ano, apenas três militares foram julgados.

Um deles, o coronel da reserva Adriano Camargo Testoni, participante ativo da depredação do Palácio do Planalto, foi punido apenas com um mês e 18 dias de prisão. E em regime aberto. A punição, no entanto, não foi pela participação dele na invasão do Planalto, mas por ter xingado seus superiores que não providenciaram a intervenção militar.

O caso dos outros dois militares que o Comando do Exército alega terem sido condenados por participação no 8 de janeiro também é outro deboche.

Um deles pegou três dias de prisão, e o outro foi “punido” com advertência. É um absoluto disparate em relação à condenação a mais de 17 anos imposta pelo STF a extremistas pelos crimes de ameaça de deposição violenta do governo e de abolição do Estado de Direito.

A complacência da cúpula do Exército com Mauro Cid é tão ou mais vergonhosa que nos casos acima citados. E tem um toque de astúcia.

Os comandantes cruzaram os braços no caso, prevaricam e apostam na lentidão do judiciário para responsabilizarem a justiça civil pela impunidade que, no fundo, eles programaram para safar Mauro Cid de condenações.

Mauro Cid é um réu confesso. Ele fez delação premiada e assumiu os crimes cometidos. Isso seria suficiente para o Comandante do Exército, o Ministério Público Militar e a Justiça Militar instaurarem inquéritos criminais e levarem-no a julgamento.

Apesar disso, contudo, a cúpula do Exército aguarda providências do MPF “antes de abril”, o que é no mínimo acintoso.

De acordo com o Decreto-Lei nº 3038/1941, Mauro Cid está sujeito à declaração de indignidade para o oficialato devido à prática, pelo menos, de crimes que ele próprio confessou: de peculato, no caso do roubo de joias e bens da União para contrabando e venda nos EUA [inciso IV do artigo 1º]; e de falsidade documental, na falsificação das carteiras de vacinação para si, família e para Bolsonaro [inciso VII].

É da competência do Ministério Público Militar promover a declaração de indignidade ou de incompatibilidade para o oficialato [inciso II do artigo 116 da Lei Complementar nº 75/1993].

No artigo 7º, o Decreto-Lei 3038 dispõe que “uma vez declarado indigno do oficialato, ou com ele incompatível, perderá o militar seu posto e respectiva patente, ressalvada à sua família o direito à percepção das suas pensões, como se houvesse falecido” – o morto ficto, invento sui generis dos militares para preservar esta imoralidade a que nenhum servidor público civil ou trabalhador comum faz jus.

Essa situação absurda evidencia que o Superior Tribunal Militar, o Ministério Público Militar e os demais órgãos da justiça militar são excrescências remanescentes da ditadura que devem ser extintas, pois servem para proteger os maus militares que cometem crimes.

O ministro da Defesa José Múcio Monteiro tem a obrigação legal de agir. Caso permita que a cúpula do Exército continue prevaricando para proteger Mauro Cid, estará validando como critério valorizado para o ascenso na carreira militar aqueles militares com trajetória delinquencial, que passam em revista o Código Penal brasileiro.

Publicado originalmente no blog do autor

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