Damares Alves, Pé de Goiaba e a Teologia do Domínio. Por Clériston Andrade

Atualizado em 13 de dezembro de 2018 às 22:27
Damares Alves é pastora, advogada e assessora do senador Magno Malta (Foto: Reprodução / Youtube)

Publicado originalmente no ValePensar

POR CLÉRISTON ANDRADE

Vocês se assustaram com a pregação da ministra/pastora Damares Alves? A história do Jesus no pé de goiaba é só mais uma das inúmeras coisas estranhas que acontecem em igrejas evangélicas atualmente. Entre suas palestras estão mensagens contra religiões afro, o tal “marxismo cultural” (uma teoria conspiratória que ganhou força através do Olavo de Carvalho e seu fã clube) e uma guerra aberta contra partidos de esquerda.

Mas nem sempre foi assim. A pregação que viralizou nas redes sociais foi feita na Igreja Batista da Lagoinha. Até alguns anos atrás, denominações tradicionais rejeitavam testemunhos e práticas que se aproximam mais da esquizofrenia do que de manifestações de fé. Ocorre que nem as igrejas batistas escaparam da chamada “Teologia do Domínio”.

Ela busca sistematizar teologicamente as crenças do Movimento de Batalha Espiritual, que tem no escritor americano Peter Vagner seu grande precursor. Outros nomes proeminentes são os de Larry Lea, John Dawson, Cindy Jacobs e Edgardo Silvoso.

De maneira resumida, essa teologia afirma que Deus deu ao homem o mandato de sujeitar a Terra (“Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; Gênesis 1:28). Os males existentes são a prova de que o demônio roubou essa prerrogativa humana e caberia à igreja resgatar o poder sobre a Terra e dominá-la, especialmente no âmbito político. Não por acaso, a militância fervorosa de muitas denominações no campo eleitoral.

A base desta teologia reside numa visão maniqueísta. Deus e o diabo lutam por espaços territoriais, numa guerra que não encontra sustentação bíblica coerente. Nela, o Criador é apresentado como soberano. Satanás, seu adversário, jamais se colocou em pé de igualdade.

No Brasil, esta concepção teológica ganhou força nas chamadas igrejas da teologia da prosperidade, cuja lógica capitalista permeia toda relação entre o crente e Deus. No entanto, as igrejas tradicionais mergulharam nesta nova visão a partir da chegada do movimento denominado de G12, um modelo que promete crescimento exponencial do número de membros com adoção de uma estrutura hierarquizada de criação de células (pequenos grupos). Esse modelo foi criado pelo pastor colombiano César Castellanos e introduzido no Brasil por Renê Terra Nova, que se autodenomina apóstolo.

Você já deve ter visto adesivos, cartazes e até outdoors com a frase “Esta Cidade é do Senhor Jesus”. Tal declaração, na mentalidade dos adeptos da teologia do domínio, é um ato profético para que Deus possa verdadeiramente governar municípios tidos como dominados por demônios, quase sempre associados, no Brasil, a santos católicos ou entidades das religiões de matriz africana.

Os atos proféticos não têm medo do ridículo. Já teve igreja que espalhou os seus homens ao redor de uma cidade para que, urinando em pontos estratégicos, se garantisse a demarcação territorial espiritual. Ali, após esse ato, os demônios seriam expulsos e índices de violência e prostituição, por exemplo, cairiam milagrosamente.

Veja bem. Na disputa entre Deus e Satanás, o que se prega é que o homem decidirá o vencedor. A ele também é concedida uma espécie de salvaguarda, uma vez que seus erros, crimes, tentações são sempre atribuídos às forças espirituais do mal.

O propósito deste texto não é fazer uma refutação à teologia do domínio, algo já feito em diversos artigos publicados na Internet, mas apenas apresentar, aos que hoje se surpreendem com pregações como a da nova ministra dos Direitos Humanos, a origem da insanidade teológica que influencia significativa parte dos evangélicos atualmente ocupando espaços políticos.