Um levantamento recente do Datafolha revela que 60% das pessoas que se autodeclaram pardas no Brasil não se consideram negras. Apenas 40% desse grupo se identificam como tal. Entre os que se declaram pretos, a identificação é quase unânime: 96% se identificam. A pesquisa, realizada entre 5 e 7 de novembro com 2.004 pessoas em 113 municípios, tem margem de erro de até 5 pontos percentuais para os diferentes grupos raciais.
A liderança de projetos Rebheka Quintão, 27, de Recife (PE), exemplificou esse ponto para a Folha de S.Paulo. Filha de mãe negra e pai branco, ela cresceu enfrentando comentários racistas contra a mãe e questionamentos sobre sua própria identidade. “Sou muito clara para ser negra, mas muito escura para ser branca”, explica.
Já Danilo Machado, 37, administrador de São Paulo, afirma ser tanto pardo quanto negro. Após enfrentar racismo e refletir sobre sua origem, ele diz ter encontrado pertencimento na negritude. “A sociedade nos distancia de quem somos. Enxergar-me como negro foi um processo de descoberta.”
A concepção de que negros incluem pretos e pardos foi consolidada pelo movimento negro brasileiro na década de 1990 e formalizada em 2010 no Estatuto da Igualdade Racial. Contudo, especialistas afirmam que a identidade parda é heterogênea, influenciada por fatores como ascendência indígena, contexto político e desconhecimento sobre o que constitui a negritude.
Para a historiadora Luciana Brito, da UFRB, discursos políticos recentes têm enfraquecido políticas de identidade racial, mas não diminuem a violência contra negros. “Há um imaginário que associa negritude apenas à pele escura, ignorando outros fenótipos como nariz, boca e cabelo”, afirma.
Já Verônica Toste Daflon, da UFF, aponta que as contradições na autodeclaração podem estar ligadas a interpretações pessoais e ao contexto familiar multirracial. “A pessoa pode concordar que negros são pretos e pardos, mas não se incluir nessa definição individualmente.”
Dados do levantamento mostram que pardos enfrentam discriminação em menor escala que pretos: 17% dos pardos relatam preconceito racial, ante 56% dos pretos. Contudo, especialistas como Marcelle Felix, da UERJ, defendem que ambos os grupos devem continuar sendo beneficiários de políticas de cotas devido às semelhanças nas condições socioeconômicas.
“A dificuldade de ascensão social enfrentada por pretos e pardos comprova os obstáculos impostos pelo racismo, mesmo que nem todos percebam isso claramente”, avalia Felix.
O levantamento ainda aponta que 65% da população brasileira acredita que a categoria negra é a soma de pretos e pardos. Entre pretos o número é ainda maior, de 77%. E, por mais que a maior parte da população parda não se identifique como negra, a maioria (67%) também diz acreditar que a soma de pretos e pardos é igual ao total de negros.
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