De onde veio o dinheiro que Queiroz deixou no Einstein? De um amigo, do colchão ou da milícia? Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 24 de maio de 2019 às 14:40
Fabrício Queiroz, um chinelão

Para quem diz estar empenhado no combate ao crime organizado e aos consequentes delitos de lavagem de dinheiro, como Sergio Moro, o caso de Fabrício Queiroz, ex-funcionário do filho do seu chefe, deveria chamar muito a atenção.

Moro não fala sobre Queiroz, e nem é obrigado a falar, mas deveria ficar atento. O ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro preenche todos os requisitos que definem um lavador de dinheiro, tema de um livro do ministro da Justiça.

Queiroz fazia depósitos e saques em espécie, em valores acima de sua capacidade financeira.

Agora, na mais recente revelação, publicada no jornal O Globo, sabe-se que Fabrício deixou no caixa do hospital Albert Einstein R$ 64,6 mil em dinheiro vivo, como parte de uma fatura de R$ 70 mil cobrada por uma cirurgia para a retirada de um tumor cancerígeno no intestino.

Se Fabrício morasse em Portugal, França ou Itália, ele não poderia efetuar esse pagamento em espécie, já que lá — e na maior parte dos países europeus —, a lei limita o uso de dinheiro em espécie em qualquer transação.

O limite varia entre 1 mil e 3 mil euros — cerca de 14 mil reais — e foi criado para coibir a lavagem de dinheiro.

No Brasil, não há limite.

No caso de depósitos em espécie, norma do Banco Central obriga a comunicação ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) de depósitos em dinheiro acima de determinado limite.

Para pagamentos em dinheiro, não há limite nem necessidade de comunicação.

No ano passado, instituições financeiras e autoridades do governo federal chegaram a se reunir para estudar um teto de uso de dinheiro vivo.

A discussão não evoluiu e não foi aproveitada para compor o pacote de medidas anticrime de Moro.

Mas existe na Câmara dos Deputados um projeto para seguir o modelo europeu e dificultar a lavagem de dinheiro através de pagamento em moeda sonante.

“O trânsito de dinheiro em espécie facilita a lavagem de recursos em atividades de corrupção, a sonegação fiscal e, ademais, oportuniza a prática de crimes como assaltos a bancos, arrombamentos de caixas eletrônicos, entre outros”, escreveu o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), na justificativa de sua proposta.

O projeto de lei fixa esse limite em R$ 10 mil.

Fabrício Queiroz é investigado pela suspeita de participação em uma organização criminosa que teria se instalado no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, de onde este saiu para assumir uma cadeira no Senado.

A investigação foi aberta no ano passado, depois que o Coaf detectou movimentações financeiras atípicas tanto na conta bancária dele quanto na de Flávio Bolsonaro.

O Ministério Público do Rio de Janeiro informou que vai investigar o pagamento de Fabrício Queiroz ao hospital Albert Einstein.

Até agora, no entanto, Queiroz nem sequer prestou depoimento presencial aos promotores. Ele apenas encaminhou respostas por escrito a um questionamento. Encontra-se em local não revelado.

Se quiser mesmo investigar Queiroz, os promotores terão que refazer o caminho do dinheiro. É difícil, mas não é impossível.

Se era dele, como alega seu advogado, terá que mostrar o registro de saque. Se estava em casa, debaixo do colchão, terá que mostrar declaração de renda com esse registro.

Se recebeu de outra pessoa, terá que informar de quem, e esta pessoa terá que informar de onde saiu o dinheiro.

Como se sabe, milícias costumam fazer transações em dinheiro vivo, já que não podem justificar receita de atividades ilícitas.

Resta saber até onde o Ministério Público do Rio de Janeiro está disposto a ir.