Denúncia de trabalho escravo mancha de novo a imagem da cidade que afrontou Luiz Fux

A bolsonarista Bento Gonçalves, terra do vinho e de Renato Portaluppi, afugentou o então presidente do Supremo no ano passado

Atualizado em 23 de fevereiro de 2023 às 18:03
Alojamento dos trabalhadores contratados sob condições análogas à escravidão em Bento Gonçalves (RS). Foto: Polícia Federal-RS/Divulgação

Bento Gonçalves, principal centro da produção do vinho gaúcho, volta a ser notícia nacional, quase um ano depois de empresários terem afrontado o ministro Luiz Fux, do Supremo, no ano passado, alertando-o para que não aparecesse na cidade para uma palestra.

Agora, Bento – a cidade da infância e da adolescência de Renato Portaluppi (que nasceu em Guaporé) – ganha destaque por causa de denúncias de trabalho escravo comprovado por flagrantes de agentes do Ministério Público do Trabalho e Emprego (TEM), da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal.

Empresários do setor da uva município, um dos mais fortes redutos bolsonaristas do Estado, estavam explorando pelo menos 150 trabalhadores.

A maioria era da Bahia e havia sido recrutada por um “gato” daquele Estado, o intermediário que atrai a mão-de-obra.

Os trabalhadores eram usados na colheita manual da uva. Os baianos foram localizados em alojamentos no Bairro Borgo, em Bento, a partir de denúncias de colegas.

Moravam em locais insalubres, alguns dormiam no chão, não recebiam os salários em dia, sofriam agressões físicas, comiam alimentos estragados e tinham jornadas diárias de até 12 horas e apenas um dia de folga na semana.

A empresa intermediária tem contratos com diversas vinícolas da região, cujos nomes não foram ainda divulgados. O apontado como aliciador, Pedro Oliveira Santana, foi preso nessa quinta-feira.

O gerente do MTE, Vanius Corte, disse ao jornal Zero Hora que a produção da uva está atrasada nas relações de trabalho na comparação com outras áreas no Rio Grande do Sul.

Mas um aviário de Bento já enfrentou, em 2021, denúncias de que mantinha trabalhadores em situações análogas à da escravidão.

O alojamento precário foi encontrado, mas os operários haviam desaparecido com a chegada de procuradores do Trabalho.

Detalhe do alojamento dos trabalhadores em Bento Gonçalves. Foto: PRF/Divulgação

Bento é reduto bolsonarista com fama nacional. Bolsonaro teve, no segundo turno, no ano passado, 75,8% dos votos no município.

Em junho do ano passado, o ministro Luiz Fux, que ocupava a presidência do Supremo, deveria ter ido à cidade para uma palestra no Centro da Indústria, Comércio e Serviços (CIC).

Mas um grupo de empresários bolonaristas lançou uma forte campanha, um mês antes, contra a presença de Fux, que falaria sobre Risco Brasil e segurança jurídica.

Entre os empresários que protestaram estava Roni Kussler, da Saif, fabricante de produtos de limpeza, que pediu o cancelamento da palestra nas redes sociais e depois apagou a postagem.

O banco Sicredi enviou mensagens aos associados (funciona como cooperativa de crédito), nas quais avisava que o nome da instituição seria retirado do material de divulgação.

A campanha mobilizou extremistas da região, e a própria CIC acabou admitindo que não poderia garantir a segurança do ministro na sua sede, no Parque da Fenavinho. A palestra seria transferida para o prédio da OAB.

Constrangido e temeroso com sua segurança, o ministro mandou avisar que não iria mais. E assim a extrema direita empresarial de Bento e região afugentou o presidente do Supremo.

A denúncia de trabalho escravo abala ainda mais a imagem da região de colonização italiana, famosa pelos seus vinhos e por ser a terra do técnico bolsonarista do Grêmio.

Abaixo, vídeos da operação policial que descobriu o alojamento:

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