Depois da educação, governo Bolsonaro mira na saúde pública. Por José Cássio

Atualizado em 18 de maio de 2019 às 12:50

Depois da Educação, Bolsonaro prepara um novo ataque, desta vez na área da Saúde a partir da desconstrução do SUS – Sistema Único de Saúde.
Neste caso, com consequências ainda mais graves, já que um dos pilares da iniciativa está na revogação da Emenda Constitucional 95, que determina um percentual específico de investimento do orçamento público no setor.
Pela Constituição brasileira, duas áreas básicas da prestação de serviços públicos ao cidadão são sustentadas por essa vinculação: Educação e Saúde.
Por ela, cada ente federativo deve alocar percentuais mínimos dos recursos arrecadados.
No caso da saúde, estados e o distrito federal têm que destinar pelo menos 12% do total de seus orçamentos – aos municípios, o índice é de 15%.
Para a União, a regra determina a aplicação mínima de 15% da receita corrente líquida.
Embora a vinculação seja uma garantia de que o dinheiro não será desviado para outras finalidades, não é bem isso o que pensa o ministro da Economia, Paulo Guedes.
O “posto Ipiranga garantia soy yo’ de Bolsonaro entende que a vinculação engessa a gestão do recurso e não é garantia de qualidade na prestação do serviço.
“Ricardo Barros, ex-ministro de Michel Temer, foi o primeiro que vi defender que a saúde não precisa de novos investimentos. O Luiz Henrique Mandetta é o primeiro que vejo defender abertamente a desvinculação dos recursos do orçamento”, alerta o deputado federal Jorge Solla (PT-BA), ex-secretário de Vitória da Conquista e um dos principais especialistas em saúde pública do país.
Criado pela Constituição de 1988 com a finalidade de transformar em realidade um de seus grandes avanços — o direito de todos os brasileiros à saúde —, o SUS é considerado um gigante.
Atende 200 milhões de brasileiros, 80% deles dependentes exclusivamente do setor público, seja para uma simples consulta médica ou para procedimentos de pequena, média e alta complexidade.
O início do desmonte do sistema, na realidade, começou após a vitória de Bolsonaro nas urnas, no período da transição, quando foi aprovado o orçamento para 2019 com aumento de apenas 0,84% em relação a 2018, contrariando um dos princípios da ‘vinculação’ que é prever um aumento das despesas pela inflação do ano anterior, no caso de 4,39%.
Aos prejuízos iniciados por Temer – entre outras iniciativas acabou com o Farmácia Popular, programa de parceria entre a União e os municípios para fornecer, por meio de rede própria ou privada, medicamentos de uso comum a preços reduzidos -, o capitão acrescentou o fim do Mais Médicos, retirando do sistema, sem colocar nada no lugar, pelo menos 10 mil profissionais que prestavam atendimento na área da Atenção Básica.
O Revalida (Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos) está parado desde 2017 e não há perspectiva de que será retomado.
Bolsonaro prometeu a alguns cubanos que constituíram família e acabaram ficando no Brasil, além de milhares de médicos brasileiros que se formaram na Bolívia, Cuba, Argentina, entre outros países, que iria agilizar o exame mas não há nenhuma sinalização de que isso vai caminhar.
Na realidade, o desmonte da saúde sob Bolsonaro está ocorrendo de forma silenciosa porque os brasileiros estão ainda muito ocupados com as palhaçadas do presidente nas redes sociais, com os embates tresloucados na educação, a bateção de cabeça na câmara, a última imbecilidade dita pelo guru Olavo de Carvalho, o bilhete premiado de Sergio Moro no STF, o fim da aposentadoria, enfim.
Enquanto o circo pega fogo, o ministro Mandetta se sente à vontade para prosseguir na sua inoperância sem ser incomodado e oferecer a mesma justificativa para os problemas todos os dias: não há orçamento.
No Estado da Bahia, por exemplo, foram inaugurados cinco novos hospitais e oito policlínicas – seis outras serão entregues ainda neste ano.
Toda essa estrutura de atendimento pelo SUS não recebe um único centavo da União.
É assim no estado comandado pelo governador Rui Costa e em todos os outros novos serviços inaugurados por prestadores públicos e privados de pequena, média e alta complexidade pelo país.
Também por ineficácia, o desabastecimento já bate à porta do serviços: medicamentos de alto custo fundamentais para transplantados, pacientes oncológicos e toda a cesta de drogas para tratamento de Aids, hepatite C, diabetes, entre outros, ou já estão faltando ou têm os dias contados nas prateleiras.
“O Brasil que sempre foi uma referência nessas áreas perdeu a mão e começa a seguir num caminho sem destino certo”, analisa o deputado Jorge Solla.
Ao desmonte da estrutura e do conceito de atendimento universal, gratuito e equânime, some-se outra praga levada para dentro do sistema pelos aloprados de plantão no palácio do Planalto: o viés ideológico.
Por ele, entenda-se a exclusão do termo violência obstétrica, para ficar na maldade da vez, e toda sorte de atrasos em curso nos procedimentos em saúde mental.
“Embora o cidadão comum ainda não esteja percebendo, o fato é que há uma clara decisão de esfacelar o SUS sem colocar nada no lugar”, diz Jorge Solla.
“De um lado, o desfinanciamento. De outro, a imposição da ideologia por meio de um moralismo atrasado e sem qualquer respaldo científico e de resolutividade”.
Como se nota, a crise na Educação é apenas a ponta do Iceberg. Pode se segurar na cadeira que vem muito mais pela frente.