Desemprego faz crescer o número de usuários de crack. Por André Lobão

Atualizado em 5 de setembro de 2019 às 12:50
Homem usa crack na avenida Brasil. Foto de Marcos Serra Lima / G1

Em 2016, uma pesquisa coordenada pelo sociólogo Jessé Souza, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apontou a relação entre exclusão social e o uso do crack. A pesquisa foi encomendada pelo então Ministério da Justiça e Cidadania – Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas.

“Essas informações nos levaram a concluir que exclusão social e uso de crack provavelmente formam um ciclo vicioso que se retroalimenta e, pior, estende seu efeito mesmo àqueles que sequer fazem uso da droga. Coerentemente, quando perguntados pelos pesquisadores sobre o que esperavam de um tratamento para seu problema com as drogas, os usuários responderam com a reivindicação de um verdadeiro pacote de direitos sociais, para além dos serviços de saúde: moradia, educação, emprego, alimentação, banho etc. A resposta poderia ser a mesma vinda de qualquer jovem das periferias brasileiras”, diz Jessé, na apresentação do estudo.

Na reportagem no centro do Rio de Janeiro, para aferir o impacto do desemprego nas ruas da cidade, os relatos colhidos indicam o consumo de drogas aumentou. Na avenida Presidente Vargas, perto da Central do Brasil, por exemplo, o consumo de crack é visto qualquer hora do dia.

Como apontou outra pesquisa, realizada pela Fiocruz, com com financiamento da SENAD/MJ (Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas – Ministério da Justiça), a maior parte dos usuários é formada por negros e negras — oito em cada dez.

Quatro em cada de dez usuários de crack vivem em situação de rua e metade não tem passagem pelo sistema prisional. As mulheres usuárias regulares de crack têm o mesmo padrão de vulnerabilidade social, com o agravante que 47% relataram histórico de violência sexual (comparado a 7,5% entre os homens). Outra pesquisa já havia indicado que a mortalidade de usuários de crack é sete vezes superior à população em geral, sendo os homicídios a causa de morte em 60% dos casos.

Segundo a Prefeitura do Rio, em 2017, foram identificados 150 locais da cidade em que dependentes químicos se juntam para fazer uso de crack e outras drogas. Estes pontos têm, ao todo, 1.939 pessoas.

Fernando Freitas, professor e pesquisador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial do Departamento de Direitos Humanos, Saúde e Diversidade Cultural da Escola Nacional de Saúde Pública, avalia que a crise econômica agravou de fato o problema do consumo de drogas como o crack. Mas não só.

“Sem dúvida, houve aumento, mas também para todos os tipos de drogas psicoativas, ilícitas como o próprio crack, e lícitas como o álcool, tabaco, e também das drogas psicoativas prescritas pelos médicos”, afirmou.

A angústia de não saber se terá como comer é um convite à entrada ao labirinto das drogas. No caso de quem vive nas ruas, as drogas prescritas por médicos estão longe da realidade. Ali o cotidiano é mais bruto.

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Amanhã, na terceira reportagem da série, você lerá sobre o aumento dos casos de assédio moral nas empresas. Com menos oferta de vagas, trabalhadores se submetem a situações humilhantes e acabam tendo problema de saúde.