Detector de metais revela possível corrente da escravidão dentro de árvore em Minas Gerais

Atualizado em 5 de outubro de 2025 às 17:07
Paineira centenária em cafezal de Cabo Verde (MG) apita quando avaliada por detector de metal. Foto: Coletivo Memora

Pesquisadores identificaram, em Cabo Verde (MG), uma paineira centenária que pode guardar vestígios do período da escravidão. O tronco da árvore, com cerca de três metros de diâmetro, reagiu a um detector de metais, indicando a presença de um objeto metálico em seu interior. Segundo relatos transmitidos por gerações, o local teria sido usado no século 19 para castigar e vender pessoas escravizadas. As informações são do g1.

A descoberta foi feita pelos pesquisadores Lidia Maria Reis Torres, da Unicamp, e Luís Eduardo Oliveira, da Universidade Federal de Alfenas (Unifal). Eles investigam a história negra e indígena do município, fundado em 1762. O equipamento apontou a existência de metal em um ponto específico da árvore, reforçando a hipótese de que se trata de uma corrente de ferro usada para prender escravizados.

A propriedade onde a paineira está localizada pertence à família de Daniel Paiva Batista desde 1930. Ele conta que escuta desde a infância relatos de que o local servia para punir e vender escravizados “folgados”, presos ao tronco com correntes. “Conforme a árvore cresceu, a corrente ficou apertando até ser escondida dentro dela”, relatou Batista, que procurou os pesquisadores para investigar a história.

O professor Luís Eduardo Oliveira defende que o artefato permaneça dentro da árvore, transformando-a em um espaço de memória. “Se a gente tirar o objeto, ele vira apenas um pedaço de ferro. Assim como está, é um símbolo vivo da história de Cabo Verde e da escravidão na região”, disse.

Paineira centenária em cafezal de Cabo Verde (MG) apita quando avaliada por detector de metal. Foto: Coletivo Memora

Segundo a bióloga Luciana Botezelli, da Unifal, é raro uma paineira viver por séculos, mas possível. Ela explica que árvores podem envolver objetos metálicos à medida que crescem. “É um processo de adaptação. A árvore cria uma estrutura ao redor do material que impede seu crescimento, até engoli-lo por completo”, afirmou.

A descoberta surgiu após a produção de um documentário sobre a presença negra e indígena na cidade, que revelou a ausência de registros formais sobre o passado escravocrata local. Para os pesquisadores, a paineira é prova de como as histórias orais ajudam a preservar memórias silenciadas. “Importa menos a prova material e mais o que ela representa: um símbolo de resistência e de memória coletiva”, concluiu Lidia Maria Reis.