Dono de empresa investigada confirma que trabalhou para campanha de Bolsonaro em 2018

Atualizado em 19 de fevereiro de 2020 às 22:50
À esquerda, o empresário Lindolfo Neto / Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Publicado originalmente no Brasil de Fato

Em depoimento prestado nesta quarta-feira (19), na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News, no Senado, o empresário Lindolfo Antônio Alves Neto afirmou que a AM4, agência de publicidade que fez a campanha de Jair Bolsonaro, utilizou a plataforma da empresa Yacows – da qual Alves Neto é socioproprietário – para disparo de propaganda eleitoral via WhatsApp.

Após um questionamento feito pelo deputado Rui Falcão (PT-SP), o empresário disse que o pacote adquirido pela campanha de Bolsonaro teria custado R$ 1.680. “Ele contratou a BookService, num plano de 20 mil disparos, envios de mensagens, no qual utilizou apenas 900”. O depoente negou que a empresa tenha feito divulgação de fake news na ocasião.

Especializada em marketing digital, a firma é uma das suspeitas de participação em um esquema criminoso denunciado pelo jornal Folha de S. Paulo logo após as eleições de 2018. A reportagem dizia respeito à utilização de dados fraudulentos, como nomes e CPFs não autorizados, para registro em aplicativos de mensagens e posterior articulação de disparos em massa de conteúdos falsos em benefício de políticos. Por esse motivo, Alves Neto foi convidado para prestar depoimento na CPMI nesta quarta-feira, após requerimento apresentado por Rui Falcão.

Questionado por mais de uma vez pelos parlamentares se aceitava a quebra dos seus sigilos – bancário, telemático e outros –, o empresário negou, afirmando que estaria seguindo orientação do seu advogado, José Caubi Diniz Junior, que o acompanhou durante o depoimento.

Na ocasião, ele disse também que a companhia teria prestado serviços de forma indireta para a campanha de Fernando Haddad (PT). Ao ser interpelado pela relatora da CPMI, deputada Lídice da Matta (PSB-BA), sobre possível relação da empresa com serviços prestados a alguns dos candidatos a presidente da República, ele afirmou que Henrique Meireles (MDB), Haddad e Bolsonaro constavam em sua lista de serviços no período.

“O que se discutiria era se o conteúdo desses disparos se caracteriza como propaganda eleitoral de cada candidato ou como uma propaganda contra outro candidato por meio de mentiras.”

“Fernando Haddad é um caso específico porque uma agência, que eu acredito que faça campanha para ele, já utilizava a plataforma e utilizou a nossa ferramenta, então, diretamente não foi feito. Indiretamente, sim”, pontuou Alves Neto, sem nomear qual seria a companhia e mencionando que a Yacows lida com diferentes empresas por meio de terceirização de serviços.

A relatora sublinhou que o convite para que a companhia se manifestasse junto à CPMI foge ao trabalho de veiculação de conteúdos em si.

“Queria deixar claro que a empresa não está sendo investigada pelo seu tipo de negócio. Os disparos, como um negócio, não são proibidos no Brasil. Nem na ultima eleição era proibido. O disparo coletivo era absolutamente permitido, desde que constasse na prestação de contas de cada candidato”, frisou a pessebista, acrescentando que o alvo das polêmicas sobre esse tipo de situação seria a eventual prática de irregularidades.

Ela afirma que a legislação em vigor determinava que os disparos durante o pleito poderiam ser feitos por cada candidato por meio de um cadastro partidário.

“O que se discutiria era se o conteúdo desses disparos se caracteriza como propaganda eleitoral de cada candidato ou como uma propaganda contra outro candidato por meio de mentiras, difamação, etc.”

Crivo de conteúdo

Questionado pelo presidente se lembrava de algum conteúdo de mensagens disparadas pela companhia durante o período, Alves Neto negou. “Eu sou executivo, participo de outras empresas e não participo da parte operacional”, disse, numa resposta que gerou manifestações no plenário.

“O senhor trabalha pras empresas todas que o senhor mostrou aqui, várias empresas, que lhe mandam conteúdo pra que sua empresa faça a divulgação, e o senhor não sabe de nenhum conteúdo delas? Ou seja, se alguém chegasse para o senhor e mandasse divulgar um chip sobre incentivo à pedofilia ou à prostituição, sua empresa iria fazer, já que ninguém faz um crivo pra saber o que vai ser divulgado? Na verdade, o senhor deixou subentender isso”, provocou o presidente da CPMI, senador Angelo Coronel (PSD–BA).

“Quero salientar que eu não fiquei satisfeito com nada do que o nosso depoente falou aqui hoje, mas espero que, ao final do relatório, possamos chegar à verdade”, acrescentou o parlamentar do PSD.

Juramento

O depoimento também teve como ponto de realce a negativa de Alves Neto em jurar que falaria a verdade durante a sessão na CPMI, um procedimento típico desse tipo de audiência. Segundo ele, a opção se deu porque seu advogado entende que o fato de ele ser alvo da comissão não o obrigaria a dizer a verdade, já que os acusados têm o direito de não produzirem provas contra si.