Duas peças sobre Murdoch estreiam — mas por que não temos nenhuma sobre Roberto Marinho?

Atualizado em 17 de outubro de 2014 às 14:31

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A trajetória de Roberto Marinho daria alguns filmes, algumas peças, alguns livros. Mas o que sai são produções chapa branca normalmente financiadas pela própria Globo, pela família ou pela Fundação Roberto Marinho. A razão é relativamente simples: é uma fria para quem se mete nessa empreitada.

Veja o caso do australiano Rupert Murdoch, uma espécie de RM do mundo desenvolvido, dono de um império de mídia que inclui a Fox e mais 800 empresas em 50 países. A peça “Rupert”, escrita por um dos mais conhecidos dramaturgos da Austrália, David Williamson, estava em cartaz em Melbourne. É meio musical, meio cabaré, e foi sucesso de público. Outro autor, o britânico Richard Bean, anunciou também uma peça, a ser encenada no National Theatre, em Londres, sobre o magnata e a prática de grampear o celular de celebridades utilizada por alguns de seus jornalistas no sensacionalista News Of The World.

Assim como Randolph Hearst, o homem que inspirou “Cidadão Kane”, Murdoch não é nenhum santo. Construiu o seu império usando as estratégias de praxe, engolindo empresas concorrentes, influenciando pesadamente na política australiana, conquistando espaço e poder. Teve uma competição duríssima, ao contrário do doutor Roberto. Um personagem e tanto. E é capaz de tolerar que seja motivo de risadas no seriado ‘Simpsons’, em que aparece como um poderoso inescrupuloso, algumas vezes emprestando sua própria voz. Detalhe: o seriado é produzido pela Fox.

Mas com Roberto Marinho, não. Fora do Brasil, nos Estados Unidos, por exemplo, a Globo é considerada apenas uma produtora de telenovelas latinas para um público saudoso de dramalhões. Por que não um espetáculo teatral sobre ele? Há uma ameaça sub-reptícia de que não se pode tocar no homem sem pagar caro pelas consequências, sejam elas quais forem — por exemplo, não arrumar patrocinador, não ter seu trabalho divulgado, não conseguir mais emprego.

É possível imaginar que um ator aceite o papel de interpretar um Sr. Marinho  que chama os empregados de inúteis, faz negociações políticas para obter concessões de rádio e TV e tem uma tartaruga de estimação? Ou um diretor de cinema que retrata um Sr. Marinho sonhando em ser o dono do mundo? Não.

E se por acaso houver algum destemido que resolva ir a fundo na história de Roberto Marinho, será com a consciência de que sua peça não terá financiamento, patrocinadores, divulgação e, muito possivelmente, onde ser exibida. Isso é um dos preços que se paga pelo monopólio da Globo.