E a Veja passou a Globo como símbolo do que existe de pior em ‘jornalismo’

Atualizado em 24 de outubro de 2014 às 15:57
Gongorismo de Taquaritinga
Gongorismo de Taquaritinga

Graças a um trabalho cotidiano, persistente, meticuloso, a Veja conseguiu uma coisa que parecia impossível: deixou para trás a Globo no topo da lista do que existe de mais infame, mais abominável e mais primitivo no jornalismo, aspas, brasileiro.

Tive, pessoalmente, uma breve ilusão de que os filhos de Roberto Civita combateriam ao menos a canalhice editorial da revista, mas foi exatamente isso, uma ilusão.

Com seu gongorismo de Taquaritinga, com sua vasta cultura que cabe num livro de bolso, o blogueiro Augusto Nunes se tornou um símbolo disso.

Em sua louca cavalgada para agradar aos patrões, ele vai extrapolando limites da sanidade jornalística.

Você lê e pensa: “Onde o editor para conversar com ele?” E então você lembra que os editores da Veja são quem são e entende que ninguém dirá a Augusto Nunes: “Isso não dá.”

Pouco tempo atrás, ele se gabou de ter vencido uma disputa judicial com Collor, a quem chamou de bandido e outras coisas do gênero.

Li a sentença, para entender um pouco mais.

Vi que Collor tinha sido absolvido das denúncias pelo mesmo STF que Augusto Nunes tanto louva ao tratar do Mensalão. Um dos juízes que o absolveu é Celso de Mello, para o qual Nunes reserva sua verve caipira no que ela tem de mais louvaminheira.

É sabida a influência que a Abril exerce em certas varas da Justiça, e então não havia ali propriamente surpresa. A não ser a afirmação da juíza de que Augusto Nunes não ultrapassara os limites do razoável ao chamar Collor de ladrão – mesmo com a absolvição do Supremo.

Quer dizer: nem os juízes brasileiros respeitam o Supremo.

Dias atrás, Augusto Nunes produziu mais uma de suas palhaçadas destinadas a boçais que o lêem e aos patrões que ele imagina agradar.

O alvo era Dirceu. Mais uma vez.

Uma rápida olhada nos textos de Nunes – deve ser rápida ou você sente embrulhos – mostra o seguinte. Nenhuma palavra sobre a meia tonelada de cocaína apreendida num helicóptero de amigos de Aécio, nenhuma palavra sobre os 33 milhões de reais pagos por governos paulistas do PSDB a um ex-dirigente do Metrô processado por corrupção na Suíça, nenhuma palavra sobre nada que faça sentido.

Vale a pena ler na íntegra:

“O presidiário José Dirceu, alojado na cela S 13 da Papuda por corrupção ativa e formação de quadrilha, exerce o ofício de xerife de cadeia enquanto espera que a Justiça o autorize a disfarçar-se de gerente-administrativo de hotel. Se a ameaça for consumada,os hóspedes do St. Peter terão de fazer o contrário do que fazem, desde o aparecimento da primeira estalagem, todos os fregueses  de todos os estabelecimentos do gênero.

No mundo inteiro, o manual de instruções básicas recomenda ao cliente que, para não ter o patrimônio reduzido por larápios que agem nas ruas, deixe guardados nos cofres do hotel objetos de valor e quantias consideráveis em dinheiro. Com a mudança de gerente, o St. Peter será o primeiro e único a inverter a regra. Os hóspedes tratarão de  carregar nos bolsos maços de cédulas, joias valiosas ou mesmo bijuterias de R$ 1,99.

Não faltam ladrões nas avenidas e superquadras de Brasília. Mas a cidade é bem menos insegura que qualquer espaço controlado pelo gerente-geral do mensalão.”

Num país em que imprensa e o judiciário não fossem tão primitivos, pode-se imaginar o que ocorreria.

Apenas para lembrar, Paulo Francis por muito menos foi intimado pela Justiça dos Estados Unidos a mostrar as provas de que diretores da Petrobras eram corruptos.

Os executivos puderam processá-lo lá porque as calúnias de Paulo Francis foram proferidas em solo americano.

Se Paulo Francis fosse processado no Brasil, fatalmente ampliaria as acusações contra os homens da Petrobras, na certeza da impunidade.

Fui ler os comentários dos leitores. A manada delirou. Não existe nada de pior, entre os leitores da mídia brasileira, que os da Veja.

Havia uma única exceção.

Um leitor, Francisco, tentou falar, pelo que entendi. Foi censurado.

Sabemos todos o conceito de livre expressão de Augusto Nunes, Reinaldo Azevedo et caterva: “livre expressão é me elogiar”.

É mais fácil o Corinthians fazer um gol do que você emplacar uma crítica nos blogs da Veja.

Pelo menos isso – evitar a censura feroz – os irmãos Gianca e Titi Civita talvez pudessem fazer. Já seria um avanço.

Bem, o leitor tentou ponderar.

“Eu não leio …”

Foi interrompido imediatamente. E em negrito.

“Então não comente. Se não leu, como o Lula, fala do que ignora. Cai fora.”

No futuro, uma peça dessas mostrará à posteridade quanto era ruim o jornalismo praticado na Veja, notadamente por Augusto Nunes.