“E daí?”, “maricas” e “gripezinha”: os absurdos ditos por Bolsonaro na pandemia

Atualizado em 18 de setembro de 2025 às 12:44
Jair Bolsonaro, então presidente, se atrapalha para colocar máscara durante entrevista coletiva em 2020. Foto: Adriano Machado/Reuters

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino determinou a abertura de um inquérito para investigar a conduta do ex-presidente Jair Bolsonaro e de aliados durante a pandemia de covid-19. A decisão atende a um pedido da Polícia Federal, que terá 60 dias para complementar as apurações iniciadas pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid, cujo relatório final foi entregue em 2021.

A medida reverte a posição da Procuradoria-Geral da República (PGR), que em 2022 pediu o arquivamento do caso. Na ocasião, a então vice-procuradora Lindôra Araújo afirmou não haver elementos suficientes para a abertura de uma investigação formal.

O relatório da CPI apontou Bolsonaro como responsável por nove crimes, entre eles charlatanismo, prevaricação, epidemia com resultado morte, incitação ao crime, emprego irregular de verbas públicas e crimes contra a humanidade.

A pandemia deixou mais de 716 mil mortos no Brasil, de acordo com dados do Ministério da Saúde. O relatório final da CPI sustentou que parte desse impacto foi agravado por decisões do governo federal, especialmente pela postura do presidente. Entre as críticas, estão a resistência à vacinação, a promoção de remédios sem eficácia e o menosprezo às medidas de isolamento.

Ao longo do mandato, Bolsonaro fez uma série de declarações que se tornaram símbolos de sua condução da crise. Ele disse, por exemplo, que o Brasil precisava “deixar de ser um país de maricas” ao falar sobre a pandemia e celebrou a suspensão dos testes da vacina do Instituto Butantan: “Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”.

O ex-presidente também se colocou contra a obrigatoriedade da vacinação. “Ninguém pode ser obrigado a tomar a vacina”, declarou em 2020. Em outubro daquele , foi além e publicou nas redes sociais uma foto com seu cachorro: “Vacina obrigatória só aqui no Faísca”, escreveu.

Em março de 2020, quando o Brasil registrava as primeiras mortes, Bolsonaro minimizou a doença. “Pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado pelo vírus, não precisaria me preocupar… quando muito, de uma gripezinha ou resfriadinho”, disse em pronunciamento em rede nacional.

Outras falas também ganharam repercussão. Em abril, questionado sobre o recorde de mortes em um único dia, respondeu: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”. O então presidente também promoveu uma série de “motociatas”, aglomerado com apoiadores, durante a crise sanitária.  “Vamos enfrentar como homem. Todos nós iremos morrer um dia”, disse ele em um dos atos.

Jair Bolsonaro em aglomeração com apoiadores durante a pandemia, em 2020. Foto: Alan Santos/PR

Durante um evento em Miami, ainda no início da crise, o então presidente declarou que a gravidade da covid-19 estava “superdimensionada” pela imprensa. Poucos dias depois, membros de sua comitiva testaram positivo para o vírus.

Bolsonaro contraiu covid-19 em julho de 2020, mas afirmou que sentiu apenas “mal-estar e dor muscular” e recomendou que a população não entrasse em pânico. “A vida continua”, disse.

Em outra ocasião, quando perguntado sobre as mortes, mandou uma apoiadora “cobrar do seu governador”, reforçando a narrativa de que o STF havia transferido a responsabilidade de combate da pandemia a estados e municípios.

O inquérito autorizado por Flávio Dino poderá retomar todos esses episódios e confrontá-los com as conclusões da CPI. Caberá à Polícia Federal coletar novos elementos para avaliar se Bolsonaro deve ser responsabilizado criminalmente.

Caique Lima
Caique Lima, 27. Jornalista do DCM desde 2019 e amante de futebol.