E daí o nazismo, se der dinheiro? O mercado explicita quem é o seu Deus. Por Fernando Brito

Atualizado em 2 de abril de 2020 às 12:45

PUBLICADO NO TIJOLAÇO

POR FERNANDO BRITO

Na Folha, Júlia Moura mostra a reação – ou a falta de reação – do mercado financeiro ao embrulho que durou todo o dia pelas citações do nazista Joseph Goebbels feitas pelo ex-enfant gaté de Jair Bolsonaro, Roberto Alvim.

É coisa de doer.

Dizem que está tudo bem, que as questões morais não interferem no essencial: estarem ganhando dinheiro.

Vejam, são os mesmos sujeitos que dizem que “responsabilidade social” é um diferencial de mercado, que enchem a boca para falar de “boas práticas”, de “compliance”.

Nada de espantar, pois desde que o inventaram, o dinheiro é a maçã e o pecado que se dane.

Mas é diferente que o aquilo que valha para suas ganancias – e uso a palavra no espanhol, no sentido de ganhos – possa servir para reger a vida de uma sociedade.

Mas não, mesmo com o sangue e as dores se seus antepassados a doerem nas consciências, acham isso uma bobagem ante seus extratos bancários:

“Sou judeu e me preocupo muito [com o discurso de Alvim]. É triste vermos uma cena assim, fico pensando os predicados que o levaram a ocupar o cargo. No entanto, economicamente, não há impacto, pois não interfere na aprovação das reformas, que é a métrica pela qual o mercado vai avaliar o governo”, diz Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos.

É coisa de doer, repito.

Como sou velho, conheci judeus no Brasil, vindos da 2a. Guerra, que tinham os braços marcados a ferros em brasa dos campos de concentração nazistas.

É triste ver que seus netos já não lhes ouvem os gritos de dor.

Levado ao pé da letra, o “mercado” nada tem a a ver com os seres humanos.

Sendo assim, o que nós, seres humanos, temos a ver com o mercado, se este desconsidera a humanidade?

Ainda não somos – e isto se provou hoje – um país capitulado.

Nem vivemos num mundo que reproduz integralmente nossa selvageria local.