E se bloquearem as reservas do Brasil? Por Reynaldo Aragon

O confisco de reservas internacionais já foi usado contra Rússia e Venezuela. Com a escalada entre EUA e Brasil, o risco não é teoria conspiratória — é geopolítica pura.

Atualizado em 27 de julho de 2025 às 16:10
Donald Trump, presidente dos EUA, com camiseta da Seleção Brasileira de Futebol. Foto: reprodução

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) não é um bloco econômico. É uma aliança militar liderada pelos Estados Unidos. Ainda assim, ela exerce influência decisiva sobre decisões econômicas internacionais sempre que os interesses de Washington estão em jogo. Quando se trata de reservas internacionais e sistemas bancários ocidentais, a OTAN e seus aliados atuam com mão de ferro.

Foi assim com a Venezuela, quando os EUA bloquearam bilhões em reservas do Banco Central venezuelano e entregaram parte ao autoproclamado Juan Guaidó. Foi assim com a Rússia, quando cerca de US$ 300 bilhões foram congelados e redirecionados para sustentar a guerra da OTAN contra Moscou. Nada disso passou pela ONU ou por tribunais internacionais. Foram decisões políticas unilaterais travestidas de moralidade.

Agora, o Brasil entrou no radar.

As relações com Rússia e China, a reaproximação com os BRICS, a recusa em aderir a sanções e o novo conflito comercial com os Estados Unidos — com tarifas agressivas sobre o aço brasileiro — colocam o país em situação de risco real. E o ponto mais vulnerável da economia brasileira está justamente fora do seu território.

Sede da Otan. Foto: Pascal Rossignol

Hoje, o Brasil possui cerca de US$ 345 bilhões em reservas internacionais, majoritariamente aplicadas em títulos do Tesouro dos EUA, mantidas em bancos centrais, instituições financeiras ocidentais e sistemas sob jurisdição anglo-americana. É dinheiro que não está sob controle direto do governo brasileiro. Está em cofres alheios.

Diante da guerra híbrida global, das campanhas de desinformação e da nova ofensiva imperial sobre o Sul Global, surge a pergunta: o que impediria o confisco dessas reservas?

A resposta é simples: nada, se houver decisão política e narrativa construída para isso. Basta um pretexto — como acusar o Brasil de “lavar petróleo russo”, como já apareceu em relatórios — para que medidas extraordinárias sejam adotadas. E o histórico recente mostra que os EUA e seus aliados não têm escrúpulos quando se sentem ameaçados.

O impacto de um bloqueio seria devastador. O real entraria em colapso. O Banco Central perderia poder de intervenção. As importações básicas seriam afetadas. E o país, sem acesso às suas próprias reservas, ficaria vulnerável a chantagens, crises e caos interno.

Não se trata de paranoia, mas de realismo geopolítico. Estamos diante de uma arquitetura global assimétrica, onde soberania é tolerada apenas quando submissa. Para resistir, o Brasil precisa diversificar seus ativos, repatriar parte das reservas e construir uma nova rede financeira soberana com países que não obedeçam à lógica de sanção e confisco.

A guerra já não se dá apenas com tanques e mísseis. Ela é travada em linhas de código, moedas, dados e sistemas bancários. O Brasil precisa acordar enquanto ainda há tempo.