
Publicado originalmente no blog do autor
Por Moisés Mendes
É corajosa a carta dos funcionários do Banco Mundial ao comitê de ética da organização, com o alerta sobre a indicação de Abraham Weintraub para uma das diretorias.
A mensagem aponta tudo o que o sujeito representa, para advertir que ele pensa na direção contrária de todos os esforços do banco, incluindo o atendimento de direitos e demandas dos povos indígenas.
Mas parece que há uma armadilha na carta, quando sugere a possibilidade de aceitação do ex-ministro analfabeto da Educação, se o homem reavaliar o que pensa e diz.
Isso quer dizer que, se Weintraub declarar amor incondicional à China e aos índios, ele poderá ser aceito?
Como todo bolsonarista tenta a se adaptar às circunstâncias para sobreviver, reavaliando à tarde o que disse pela manhã, tudo é possível.
Os funcionários, diplomaticamente, ficam com um pé atrás, porque talvez tenham de engolir o sujeito.
O Banco Mundial deve saber que, no dia 4 de junho, em depoimento por escrito à Polícia Federal, no inquérito em que é acusado de racismo, Weintraub reafirmou a acusação de que “há fortíssimas evidências de que o vírus foi criado em laboratório e que o Partido Comunista Chinês escondeu o início da pandemia e informou à OMS (Organização Mundial da Saúde) que não havia contágio entre humanos”.
Mas Weintraub é esperto e pode se retratar. Se a retratação for feita e aceita, o cinismo de Weintraub terá submetido o Banco Mundial e todos os seus membros ao deboche da extrema direita brasileira.
Eis a carta:
Caros Sr. Schoenleitner e Sra. Shuaibu.
A Associação dos Funcionários do Banco Mundial deseja chamar a atenção do Comitê de Ética da Diretoria o registro do Sr. Abraham Weintraub, que deve começar a trabalhar no Banco Mundial na qualidade de diretor-executivo interino da EDS15. Muitos funcionários ficaram profundamente perturbados ao saber o seguinte:
De acordo com várias fontes, Weintraub publicou um tuíte de acusação racial que zomba do sotaque chinês, culpando a China pelo novo coronavírus e acusando-os de “dominação mundial”, levando o Supremo Tribunal Federal a abrir uma investigação sobre acusações de racismo (crime no Brasil).
Weintraub sugeriu que os juízes da Suprema Corte fossem presos. Weintraub deu declarações públicas contra a proteção dos direitos das minorias e a promoção da igualdade racial (seu último ato como ministro da Educação foi revogar diretrizes para promover cotas para afrodescendentes e povos indígenas no ensino superior). Ele já disse odiar o termo “povos indígenas”.
Embora sua indicação tenha sido condenada por vários países clientes, a Associação dos Funcionários entende que a escolha deste diretor-executivo é do Brasil e somente do Brasil.
Dito isto, podemos e devemos garantir que o comportamento e as ações de nossos membros efetivos modelem o Código de Conduta para Funcionários do Conselho —exigindo os mais altos padrões de integridade e ética em sua conduta pessoal e profissional — e alinhados com nossas políticas operacionais, como nossa política de povos indígenas.
Portanto, solicitamos formalmente ao Comitê de Ética que reveja os fatos subjacentes às múltiplas alegações, com vistas a (a) suspender sua indicação até que essas alegações possam ser revisadas e (b) garantir que o Sr. Weintraub seja avisado de que o tipo de comportamento pelo qual ele é acusado é totalmente inaceitável nesta instituição.
O Grupo Banco Mundial acaba de assumir uma posição moral clara para eliminar o racismo em nossa instituição. Isso significa um compromisso de todos os funcionários e membros do Conselho de expor o racismo onde quer que o vejamos.
Confiamos que o Comitê de Ética do Conselho compartilhe essa visão e faremos tudo ao seu alcance para aplicá-la.
Atenciosamente, Assembleia Delegada da Associação de Funcionários do Banco Mundial