Economia forte e resiliência nas pesquisas sinalizam boas chances para Lula em 2026

Atualizado em 1 de julho de 2025 às 16:52
Lula, presidente do Brasil em evento em Tocantins. Foto: Foto: Cláudio Kbene/PR

Desde muito tempo, poucas atividades me dão mais prazer do que desconstruir crises políticas ou econômicas fabricadas artificialmente, tão comuns ao senso comum de quem pensa ou analisa a política nacional.

Boa parte dessas crises, eu sei, nasce da mídia corporativa, ou “legacy media”, como agora chamam os americanos, atolada em tantos vícios de linguagem, presa a tantas regras obsoletas, que desenvolveu enorme dificuldade de fazer o básico, que é se apegar estritamente aos fatos.

Nem vou falar aqui de geopolítica, onde a mídia tradicional afunda melancolicamente nesta cultura sombria, maligna, de um imperialismo baseado puramente em mentiras e violência.

Hoje vamos falar de economia brasileira e eleições nacionais.

Outra origem importante dessa neurastenia insuportável das redes sociais vem de setores da esquerda, que transformaram seu radicalismo num moralismo despolitizado, para o qual o governo não apenas comete erros, como o faz de propósito, por que é mau, covarde e desonesto. Dentro de bolhas da própria esquerda, afastamo-nos de uma discussão, mesmo que dura, sobre estratégias, e a transformamos num jogo pesado de acusações morais e xingamentos ad hominem.

Daí o debate pũblico degenera numa algaravia caótica, esquizofrênica, em que o governo é ao mesmo tempo comunista e gastador, de um lado, e conservador e neoliberal, de outro. De um lado, o Brasil é amigo da China, da Rússia, do Irã, dos Brics, de outro abandonou os Brics e se vendeu aos EUA. Essa confusão afasta o brasileiro médio, que encontra ainda mais dificuldade para entender o que está acontecendo e se torna presa vulnerável de oportunistas políticos, picaretas religiosos e influencers mal intencionados.

“O que observamos não é a natureza em si, mas a natureza exposta ao nosso método de questionamento”, dizia Werner Heisenberg, um dos pais da física quântica, inaugurando um maneira de ver o mundo que deveríamos usar também na análise política.

Vamos em frente. Comecemos examinando rapidamente as últimas pesquisas Datafolha (11 de junho) e Quaest (1 de junho). Volto em seguida.

(Datafolha 11 de junho)

Os números mostram uma situação de empate técnico entre dois pólos políticos muito bem definidos: um lado mais conservador, liderado pelo campo que apoiou Bolsonaro em 2022, outro mais progressista, ligado àqueles que apoiaram Lula nas últimas eleições.

Interessante notar que não se trata mais apenas de Lula ou Bolsonaro. Aparentemente, o eleitor está se identificando com um campo político, não com nomes. Tanto é que Fernando Haddad, hoje ministro da Fazenda, apresenta uma performance não muito diferente de Lula, num eventual embate direto contra Bolsonaro. Segundo o Datafolha, Haddad teria 40% contra 45% de Bolsonaro. Já o presidente Lula pontuaria 44% X 45%.

Tanto na Quaest quanto no Datafolha, o presidente Lula empata ou vence em todos os cenários com seus principais adversários.

Entretanto, a eleição de 2026 não acontecerá no vácuo. Apesar de alguns analistas entenderem que a situação econômica não parece mais tão determinante hoje como se dava no passado, eu consideraria isso com mais cuidado. De fato, nota-se na psicologia política dos últimos anos, em alguns países como EUA e Brasil, uma influência maior das chamadas “guerras culturais”, em que fatores puramente ideológicos parecem determinar mais o voto, ao menos de alguns setores, do que o bem estar econômico.

Mas isso também pode ser uma ilusão de ótica, baseada numa interpretação possivelmente mesquinha do que entendemos por “fator econômico”. Se a qualidade do transporte usado pelo cidadão, incluindo o tempo gasto para ir de seu trabalho à casa, está piorando, isso não deveria ser também incorporado às suas preocupações econômicas?

O mesmo raciocínio poderia ser aplicado para a sensação de segurança pública, que expõe o cidadão a situações que lhe causam impacto financeiro.

Entretanto, independente dessas especulações sobre a influência direta da economia sobre a formação do voto, é obrigação cívica de todos oferecer uma análise independente e objetiva da situação econômica do país. Não é prudente terceirizar essa análise nem para a mídia tradicional, tampouco para setores emocionados da militância.

Eu reuni muitos dados nesta postagem para ajudá-los e pensar por conta própria. Eles nos ajudarão, a propósito, desconstruir muitas mentiras, exageros, fantasias, que vem se falando sobre a economia brasileira.

Vamos começar pela inflação, que possivelmente é o indicador econômico mais diretamente ligado à aprovação do governo nacional, porque o eleitor faz essa associação de maneira muito direta. Se a calçada em frente à sua casa tem um buraco, o cidadão culpa o prefeito. Se o transporte coletivo se deteriora, a responsalidade é compartilhada com o governador. Mas um eventual aumento no preço dos produtos e serviços cai diretamente na conta do presidente da república.

Para entender a inflação, temos que observar os seguintes indicadores. O mais importante é o IPCA, informado mensalmente pelo IBGE. O último foi divulgado no dia 10 de junho, e mostrou uma inflação de 0,26% em maio, e de 5,32% no acumulado 12 meses. No caso do acumulado, é a primeira queda em meses.

Ainda segundo o IPCA, houve melhora no preço dos alimentos em domicílio para 0,02% em maio, o menor em quase um ano.

No acumulado em 12 meses, todavia, a inflação de alimentos ainda está acima de 7%, um patamar muito elevado. A sensação de alívio nos preços dos alimentos apenas será plenamente sentida pelo consumidor quando estes efetivamente caírem na média e no acumulado.

Há dados mais recentes que confirmam a tendência de queda na inflação para este ano. O IPCA-15, outro indicador do IBGE, divulgado no dia 26 de junho, registrou inflação de 0,26% em junho e 5,27% em 12 meses; ainda segundo o mesmo indicador, a inflação de alimentos ficou em 0% em junho e 6,94% em 12 meses.

Um termômetro importante vem da Fundação Getúlio Vargas. O IGP-M, divulgado no dia 27 de junho, caiu para abaixo de 4,5% em 12 meses. Mais promissor: o IPA-M, indicador do preço dos alimentos também da FGV, e responsável por cerca de 60% do IGP-M, caiu para 4,0% em 12 meses.

Um fator extremamente positivo da economia brasileira, neste terceiro mandato do presidente Lula, tem sido a recuperação do parque industrial brasileiro.

Segundo o IBGE, a indústria brasileira de tranformação vem crescendo de maneira vigorosa desde o início de 2024, o que é, aparentemente, resultado de políticas de fomento do governo federal para o setor. E não são apenas setores de baixa complexidade, pois o crescimento na produção de bens de capital e bens duráveis mostra que as áreas mais sofisticadas, com mais valor agregado, vem desempenhando um papel relevante no processo de neoindustrialização do país.

A área fiscal tem sido alvo de muita propaganda negativa por parte de setores oportunistas e reacionários do mercado financeiro. Além disso, este também é um dos fatores que mais suscitam confusão à esquerda e à direita.

Vamos provar que há exageros de ambos os lados, e que a gestão econômica do governo Lula se caracteriza por muito equilíbrio, mesclando um forte aumento dos investimentos sociais com um grande cuidado para não perder o controle sobre as despesas.

Embora a direita acuse o governo de populismo e gastança, isso não está traduzido nos números. A evolução das despesas do governo federal (ou governo central, como também se diz) mostra uma queda gradual em relação ao PIB. Segundo o Tesouro Nacional, as despesas do governo corresponderam a 18,25% do PIB em maio, o menor patamar desde o início de 2024, quando haviam subido por causa do pagamento dos precatórios que Bolsonaro não pagou e que Lula decidiu quitar.

Quando olhamos para as despesas com pessoal, outro alvo de narrativas exageradas da mídia, igualmente se constata que o governo Lula, a despeito de estar promovendo uma ampla recuperação do serviço público, vem conseguindo reduzir sensivelmente a participação deste fator no PIB. Segundo o Tesouro, as despesas com pessoal e seus encargos corresponderam a menos de 3,2% do PIB em maio deste ano, o menor patamar da história.

Com isso, o déficit primário do governo Lula III, no acumulado destes dois anos e meio de gestão, já é o melhor dos últimos dez anos. Até maio, estava em -0,86% do PIB, contra -2,43% do PIB no governo Bolsonaro.

Nos últimos 12 meses até maio, a propósito, houve superávit de 18 bilhões de reais, ou 0,15% do PIB.

Mas seria obviamente temerário afirmar que o Brasil não enfrenta nenhum problema fiscal ou econômico.

Do ponto-de-vista fiscal, ainda estamos numa situação delicada por causa dos juros monstruosos definidos pelo Banco Central, que impactam de maneira devastadora no resultado nominal do setor público consolidado (governo central, mais estados, estatais, banco central, etc).

Por isso mesmo é quase um milagre que o governo esteja, ainda assim, conseguindo reduzir a necessidade de financiamento do setor público (déficit nominal mais ajustes) nos últimos meses. Isso apenas é possível, naturalmente, por causa do crescimento econômico.

Quando se calcula o déficit nominal em percentual do PIB, o crescimento faz com que o número caia. Em maio, a necessidade de financiamento do setor público, que é o déficit nominal mais alguns ajustes importantes, caiu para menos de 7,6% do PIB, depois de ter chegado a perto de 10% em meados de 2024.

De qualquer forma, o déficit nominal do Brasil ainda é um dos maiores do mundo, e isso não é saudável.

Há perspectivas positivas, todavia, para os próximos anos.

O Instituto Fiscal Independente, órgão do Senado conhecido por suas previsões rigorosas e conservadoras, desenhou uma previsão otimista para o Brasil na qual o déficit nominal deve cair paulatinamente nos próximos anos. Para 2025, deve fechar em 8,2%, o que já será menor do que 2023 (8,8%) e 2024 (8,5%), cair para 8,0% em 2026, e daí seguir caindo até chegar a 4,4% em 2035.

O resultado primário do setor público, ainda segundo o IFI, deve se manter sempre 0% e -1% até 2035, com tendência de melhora a partir daí.

Não se justifica, portanto, nenhuma previsão catastrófica para a situação fiscal do país.

Esses números, a propósito, empalidecem o impacto que o aumento do IOF pode ter nas contas públicas, com seus 10 ou 20 bilhões de reais que o governo deixaria de arrecadar. A arrecadação federal, no acumulado de 12 meses até maio último, ficou perto de 3 trilhões de reais. Certamente não será perdendo um recurso que o governo já não tinha que haverá crise fiscal. Governo e legislativo jogam um jogo, por isso mesmo, um pouco teatral, no qual o governo finge que perde para deixar a oposição mais calma, mais distraída, ganhando tempo para entregar obras e programas.

O mesmo IFI, aliás, prevê crescimento real do Brasil de 2,37% este ano, 1,7% em 2026, e acima de 2% de 2027 a 2035. É uma taxa modesta, mas considerando que pode ser acompanhada de inflação baixa e melhora nas contas públicas, poderá deflagrar um período de mais investimentos em infra-estrutura e mais desenvolvimento para o país. Em seus livros, o economista francês Piketty lembra que crescimentos de 2%, se estáveis e duradouros, são muito expressivos. Por outro lado, não podemos esquecer que a previsão do IFI é conservadora. Se houver aumento nos investimentos produtivos, essa taxa de crescimento pode ser maior.

Quanto ao mercado de trabalho, a última estimativa do IBGE é de que o desemprego caiu para 6,2% em maio, a menor taxa para esse período. O aumento do emprego foi puxado sobretudo por aqueles de carteira assinada no setor privado. O Brasil agora tem 103,9 milhões de pessoas trabalhando. Há uns 10 anos atrás, éramos 90 milhões de trabalhadores. A informalidade está caindo pela primeira vez em muitos anos, e fechou em 37,8% em maio, uma das menores da história.

O governo Lula deverá entrar em seu último ano de governo com excelentes indicadores econômicos e sociais para mostrar à população. É óbvio que isso não deve atrapalhar a construção de uma estratégia forte para disputar sua reeleição.

Publicado em O Cafézinho