A nova campanha publicitária da Volkswagen traz Elis Regina, morta em 1982, cantando com a filha Maria Rita em um dueto (obviamente) inédito.
A “parceria” entre mãe e filha só foi possível graças à inteligência artificial, que resultou no dueto com a canção imortal “Como Nossos Pais”, de Belchior.
Na campanha, criada pela agência AlmapBBDO para a montadora alemã no Brasil, Elis aparece na versão tradicional de uma Kombi, enquanto Maria Rita pilota o ID.Buzz, modelo elétrico recém-lançado.
Que o resultado “artístico” da produção com o auxílio da Inteligência Artificial é comovente e emocionante, não temos dúvidas: a potência de Elis Regina e Maria Rita juntas é incontroversa.
A questão, entretanto, não é esta. A questão que primeiro se coloca é: quando começaremos a discutir os limites éticos para o uso da inteligência artificial, sobretudo quando a finalidade é ganhar (muito) dinheiro?
Viveremos em um mundo em que pouco importa se estamos vivos ou mortos?
A autorização da família – inclusive de Maria Rita – resulta obviamente em ganhos por direitos autorais e sabe-se lá mais quais vantagens.
Quem se importa se a imagem de Elis será utilizada em uma campanha com um apelo absurdamente assustador?
A Inteligência Artificial, aliás, é por si só assustadora. Embora seus resultados sejam realmente impressionantes e úteis à humanidade, as consequências de seu uso desmedido são ainda desconhecidas, mas já geram absurdos como a ressurreição de uma artista pra vender automóvel.
“Nada mais emocionante do que promover um encontro inédito entre a mãe Elis Regina e a filha, Maria Rita, dois ícones da música que estão nos corações dos brasileiros, assim como a Volkswagen do Brasil, que neste ano celebra seus 70 anos de história e sucesso no País”, afirmou, em nota, Roger Corassa, vice-presidente de vendas e marketing da montadora no Brasil.
O apelo emocional da Volkswagen nessa campanha é abjeto e anti-ético.
Não é preciso dizer que talvez Elis não gostasse de ter sua imagem associada a uma montadora instrumental para a ditadura, mas sua família segue “contando o vil metal” sobre a memória da artista.
Em um mundo em que os mortos já não podem se defender, os vivos usam suas imagens e sua memória para continuar contando o vil metal, como cantava Belchior.
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