Em novo livro, Lula chama Guedes de “notório especulador” e propõe frente de defesa da soberania. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 25 de novembro de 2019 às 17:41
Lula no 7o. Congresso do PT

Em artigo publicado no livro “E agora, Brasil?”, lançado esta semana, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz um convite a “todos os brasileiros e brasileiras, quaisquer que sejam suas preferências políticas e partidárias”: a união “em defesa da soberania nacional” — que, na visão dele, está ameaçada.

Lula define a soberania como um conceito muito maior do que a defesa do território, do patrimônio público, das riquezas naturais e culturais.

“O Estado e o governo têm de usar todos os recursos possíveis para cuidar bem da população. E cuidar bem significa garantir saúde, educação, segurança, cultura e proteção social; direito ao trabalho e à aposentadoria; salário digno e crédito para produção e consumo; acesso à terra e à assistência no campo; acesso à Justiça; liberdade e democracia”, afirmou.

Em resumo, segundo Lula: “Um país só é soberano quando fortalece, todos os dias, seu maior patrimônio: o povo.”

Para o ex-presidente, desde o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, os governos brasileiros têm traído a soberania nacional, pois permitem que “o presente e o futuro”da nação sejam decididos por outros países.

Isso acontece quando interesses econômicos externos predominam sobre os interesses da maioria da sociedade. “Infelizmente, é isso que vem ocorrendo no Brasil desde o golpe do impeachment de 2016 e está sendo violentamente agravado pelo atual governo”, afirmou.

Sem citar a Venezuela, Lula fala da posição subalterna do governo brasileiro diante do conflito dos EUA com o país vizinho, que ameaça envolver o país em “aventuras militares”, “como se a missão das nossas Forças Armadas fosse viabilizar os interesses econômicos e geopolíticos norte-americanos na América do Sul.

Também discorre sobre a Base de Alcântara, ao criticar a entrega aos norte-americanos do controle de instalações estratégicas dentro do território nacional, “sem exigir qualquer contrapartida”.

Ao tratar da economia, o ex-presidente critica a venda dos bancos e empresas públicos a “preço vil”.

“Eles não conhecem o Brasil e não entendem nada de economia, não da economia real, que move o país nos ciclos de produção e consumo”, destacou. Lula chama Paulo Guedes de “notório especulador”, que quer entregar o controle do Banco do Brasil ao Bank of America.

O ex-presidente adverte que agentes públicos como Paulo Guedes serão responsabilizados e avisa aos grupos estrangeiros que se aproveitarem dessa “farra de entreguismo e privatização predatória” que ela não durará para sempre: “O povo brasileiro encontrará as formas de recuperar aquilo que lhe pertence”.

As palavras de Lula se dirigem a público que vai muito além do PT, do qual é presidente de honra.

“Neste momento dramático da vida nacional, é necessária a unidade de todas as forças populares e progressistas, sindicatos, universidades, movimentos sociais e organizações da sociedade civil para enfrentar os vendilhões da pátria, os destruidores de direitos e os inimigos da democracia”.

O livro “E agora, Brasil?”, organizado pelo sociólogo Emir Sader, é uma publicação do Laboratório de Políticas Públicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Livro “E agora, Brasil?”

Lula escreve o primeiro capítulo.

Também fazem diagnóstico da situação brasileira e apresentam propostas outros dezesseis autores, como Fernando Haddad, Gleisi Hoffmann, Guilherme Boulos e Leonardo Boff.

Eu escrevo o capítulo sobre a imprensa brasileira — “Os Davis da comunicação na luta contra os gigantes da imprensa corporativa”.

“Procuramos reunir uma lista de pontos de vista diferentes, tanto na sua abordagem, como no lugar desde o qual se desenvolvem essas reflexões. Há momentos em que, sem contar com todo o potencial de pensamento, vinculado à prática social e política, fica mais difícil transitar entre as dificuldades que enfrentamos”, explica Emir Sader, no texto de apresentação.

“A democracia, os movimentos populares, o próprio país são vítimas de uma ofensiva devastadora, que pretende arrasar tudo o que se constrói de positivo, em termos de direitos sociais, de liberdade de expressão, de lideranças políticas e de movimentos sociais”, acrescenta.

A proposta do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj resgata, no campo democrático-progressista, um princípio que a direita conhece bem, e pratica, com a máquina de imprensa que tem sempre à sua disposição: a difusão das ideias em tempos de crise e também de aparente tranquilidade institucional.

No prefácio do livro “Capitalismo e Liberdade”, publicado pela Universidade de Chicago em 1982, ele escreveu:

“Somente uma crise – real ou percebida como real – produz mudança de fato. Quanto essa crise ocorre, as ações dependem de ideias que estão disponíveis no momento. Acredito que essa é a nossa função básica: desenvolver alternativas para as políticas existentes, manter essas alternativas prontas e disponíveis até que aquilo que antes parecia politicamente impossível se torna politicamente inevitável”.

“E agora, Brasil?”  é um projeto que não deixa os arautos do neoliberalismo falar sozinhos.