Entenda as falsas denúncias de Tagliaferro usadas por bolsonaristas contra o STF

Atualizado em 3 de setembro de 2025 às 14:32
Eduardo Tagliaferro e Alexandre de Moraes. Foto: reprodução

O perito Eduardo Tagliaferro, ex-assessor do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), está sendo questionado sobre a veracidade das denúncias feitas por ele contra o magistrado. Em seu histórico no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Tagliaferro atuou como chefe de gabinete na Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação durante a gestão de Moraes à frente da Corte, entre 2022 e 2024.

Em agosto de 2022, o Metrópoles revelou trocas de mensagens entre empresários que defendiam abertamente um golpe de Estado para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder. Dias depois, alguns desses empresários foram alvos de operações da Polícia Federal (PF). Segundo registros oficiais, a lista incluía Luciano Hang, da Havan, José Koury, do Barra World Shopping e Ivan Wrobel, da construtora W3 Engenharia.

Tagliaferro alegou que os relatórios usados para justificar essas ações foram produzidos depois da operação, nos dias 26, 27 e 28 de agosto, e não antes, como consta nos documentos oficiais. “A busca e apreensão foi realizada em 23 de agosto. Porém, se os senhores observarem, os relatórios e todo o material que a mim foi passado para montar aquela farsa, são dos dias 26, 27 e 28 de agosto”, afirmou.

O ex-assessor apresentou prints dos supostos materiais produzidos a mando do juiz auxiliar de Moraes, Airton Vieira, incluindo mapas mentais sobre as investigações e o envolvimento dos empresários. Segundo ele, Moraes não tinha conhecimento da delegação da produção do material.

“Esse documento que foi apresentado por Alexandre de Moraes para justificar e dizer que existia uma investigação preliminar para a busca e apreensão, foi confeccionado por mim, a pedido de Airton Vieira, que não sabia mexer com computador. Isso chegou às minhas mãos por acaso, Moraes nem sabia que Airton Vieira tinha me passado. Airton me pediu para não falar nada”, declarou.

Mentira sobre o 8 de janeiro

No final do mês passado, circulou nas redes sociais que o ex-assessor de Moraes teria vazado as “verdadeiras” imagens do 8 de Janeiro. Os vídeos supostamente mostrariam manifestantes criticando os atos de violência e depredação, e o ministro do STF Flávio Dino teria mandado apagá-los para ocultar que não houve tentativa de golpe de Estado.

O Estadão Verifica, coluna de checagem de fatos do jornal, analisou o caso e concluiu que a afirmação é falsa. Tagliaferro negou possuir gravações inéditas do 8 de Janeiro. Além disso, os vídeos citados não são novos: foram publicados em redes sociais no mesmo dia ou logo após os ataques em Brasília, em 2023.

As imagens voltam a circular frequentemente em postagens que tentam sustentar a versão enganosa de que “infiltrados de esquerda” seriam responsáveis pela depredação. No entanto, investigações da Polícia Federal, denúncias apresentadas pelo Ministério Público Federal e decisões da Justiça confirmam que os atos violentos foram praticados por apoiadores de Bolsonaro inconformados com o resultado eleitoral.

Tagliaferro durante sessão direto da Itália, onde está foragido. Foto: reprodução

Denúncia da PGR

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, denunciou Tagliaferro ao STF pelos crimes de violação de sigilo funcional, coação no curso do processo, obstrução de investigação envolvendo organização criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Somadas, as penas podem chegar a 22 anos de prisão.

Gonet afirma que Tagliaferro “de maneira livre, consciente e voluntária” atuou para “atender a interesses ilícitos de organização criminosa responsável por disseminar notícias fictícias contra a higidez do sistema eletrônico de votação e a atuação do STF e TSE, bem como pela tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito”.

O ex-assessor atuou como chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação, vinculada à Presidência do TSE, entre agosto de 2022 e julho de 2023. A Polícia Federal o aponta como responsável pelo vazamento de informações confidenciais do gabinete de Moraes para o jornal Folha de S.Paulo – acusação que Tagliaferro nega veementemente.

Em depoimentos anteriores, o ex-assessor já havia manifestado preocupação com sua segurança após o vazamento de conversas internas. Ele chegou a afirmar que existia uma “manipulação para perseguição da direita” dentro do gabinete do ministro.

A PF, por sua vez, sustenta que o objetivo dos vazamentos seria minar a credibilidade do Poder Judiciário e interferir em investigações sobre disseminação de notícias falsas.

Bolsonaristas usam Tagliaferro contra STF

No mesmo dia em que começou a fase final do julgamento de Bolsonaro e outros sete réus no STF, Tagliaferro participou, por videoconferência, de uma sessão da Comissão de Segurança Pública do Senado, presidida por Flávio Bolsonaro (PL).

O ex-assessor afirmou que o TSE tinha “poder de polícia” e que Moraes ordenou que a PF obtivesse todas as câmeras que registraram os crimes, além de instruí-lo a coordenar consultas a dados no TSE para identificar pessoas presas.

Bolsonaristas nas redes sociais transformaram a sessão em ferramenta de rivalidade com o julgamento de Bolsonaro, e o nome de Tagliaferro foi um dos mais comentados no X.

Flávio Bolsonaro publicou que as falsas denúncias de Tagliaferro “são gravíssimas” e que revelam como o ministro “agiu para beneficiar um lado e para prejudicar e perseguir Bolsonaro de maneira ilegal”.

A ex-ministra Damares Alves (Republicanos-DF) chegou a sugerir que o julgamento fosse interrompido, alegando violações de direitos humanos. Parlamentares governistas ignoraram a sessão, e apenas dois senadores do PT compareceram, sem integrar oficialmente o colegiado.

Augusto de Sousa
Augusto de Sousa, 31 anos. É formado em jornalismo e atua como repórter do DCM desde de 2023. Andreense, apaixonado por futebol, frequentador assíduo de estádios e tem sempre um trocadilho de qualidade duvidosa na ponta da língua.