Entidades e líderes profissionais reagem à tentativa de censura do Cremesp contra Padilha

Atualizado em 26 de outubro de 2020 às 9:00
Alexandre Padilha. Foto: AGÊNCIA BRASIL/DIVULGAÇÃO

Entidades e profissionais da área da saúde e dos direitos humanos lançaram, na segunda (26), o manifesto “Loucura não tortura e as vozes não se calarão”. A ação é uma resposta à tentativa do Conselho Regional de Medicina do estado de São Paulo (CREMESP) de censurar o deputado Alexandre Padilha (PT-SP), que se manifestou publicamente de forma crítica às mudanças abusivas e retrógradas promovidas pelo governo Bolsonaro na política de saúde mental.

O manifesto conta com o apoio de entidades, parlamentares e nomes como Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, Instituto Vladimir Herzog, Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo, Senador Jaques Wagner, Senador Humberto Costa, Deputada Gleisi Hoffmann, Deputada Érika Kokay, Deputada Benedita da Silva, Deputada Jandira Feghali, Dilma Rousseff, Eleonora Menicucci, Arthur Chioro, Aloizio Mercadante, Gastão Wagner, João Pedro Stedile, Fábio Porchat, Gregório Duvivier, Tata Amaral, Teresa Cristina, entre outros.

Entenda o caso

Conselheiros do CREMESP abriram sindicância contra Padilha, que é médico infectologista, por suposta violação do Código de Ética Médica. A sindicância se baseia em denúncia feita por um médico a partir de postagem no Facebook, em que Padilha comenta matéria do jornal Estado de São Paulo que denunciava mudanças na política de saúde mental do Governo Federal.

Na postagem, Padilha fez uma crítica ampla e geral à política de saúde mental de Bolsonaro, que pretende ampliar de recursos públicos para hospitais psiquiátricos isolados e autorizar a internação de crianças e adolescentes nestes hospitais. Além disso, autoriza o financiamento pelo Ministério da Saúde da compra de equipamentos de eletrochoque para eletroconvulsoterapia, o que pode representar o retorno das práticas manicomiais.

Tentativa de censura

A partir dessas declarações públicas em defesa da luta antimanicomial, consolidada no Brasil e no mundo, o CRM-SP acusa Padilha de ter desrespeitado dois artigos éticos que vedam ao médico se manifestar sobre assunto médico de forma sensacionalista, mentirosa ou promocional. Na postagem, Padilha usa a frase histórica do movimento da luta antomanicomial, “loucura não se prende, loucura não se tortura”. O processo instaurado acusa Padilha de, por ser médico, não poder usar a expressão loucura, nem equipamentos para eletrochoque.

Liberdade de expressão

Em razão do artigo 85 da Constituição Federal, que proíbe que deputados e senadores sejam punidos por opiniões, palavras e gestos, a própria Câmara dos Deputados ingressou no Supremo Tribunal Federal em defesa de Padilha. A Câmara atuou, neste caso, em defesa da prerrogativa dos parlamentares de não sofrerem processo por manifestar uma opinião.

Possíveis punições

A ação envolve um processo ético-disciplinar que pode punir o médico com penas que variam entre a advertência e censura confidenciais, censura pública e suspensão do exercício profissional por até 30 dias. Em casos extremos, pode chegar à cassação do exercício profissional, neste caso, dependo de convalidação do Conselho Federal de Medicina.

Confira o manifesto abaixo:

Loucura não se tortura e as vozes não se calarão: Manifesto em apoio à luta antimanicomial e do deputado federal Alexandre Padilha.

Nós, signatários deste manifesto, nos manifestamos de forma solidária em apoio ao deputado Alexandre Padilha que está sendo atacado por ter se manifestado publicamente de forma crítica às mudanças abusivas e retrógradas promovidas pelo governo Bolsonaro na política de saúde mental.

Conselheiros do Conselho Regional de Medicina do estado de São Paulo (CREMESP) abriram sindicância contra o médico infectologista, professor, ex-ministro da Saúde e deputado federal Alexandre Padilha, por violação do Código de Ética Médica, a partir da denúncia de um médico.

Denúncia baseada em uma manifestação do deputado federal Padilha em seu perfil de uma rede social com o título “Loucura não se prende, loucura não se tortura”, onde fez uma crítica contundente à mudança do direcionamento de recursos públicos na política de cuidado na saúde mental pelo atual governo. Mudança que rompe com a política antimanicomial, consolidada no Brasil e no mundo, que tem como eixo a liberdade como prática terapêutica, uma importante conquista civilizatória do nosso país e da luta geral pela defesa da vida.
Esta guinada na política pública de saúde mental pelo governo Bolsonaro foi muito criticada por especialistas e estudiosos da área da saúde mental à época em diversas manifestações públicas que ajudaram a construir a crítica realizada na página da rede social de Padilha.

A liberdade de expressão e manifestação são um dos princípios basilares da organização da nossa sociedade e da democracia assegurados pela Constituição da República de 1988. Nos últimos anos, infelizmente, diversos atores e organizações brasileiras têm atuado contra esse direito, visando a criminalização, estigma e punição daqueles que se manifestam livremente em defesa da dignidade da pessoa humana em suas múltiplas facetas, em especial, da saúde pública. Não podemos aceitar que nos coloquem uma mordaça.

A decisão dos Conselheiros do CREMESP, de dar prosseguimento a este absurdo processo é um ataque claro à histórica luta de uma política de saúde mental humanizada e antimanicomial e também um ataque à liberdade de expressão É, portanto, um ataque não só ao deputado Alexandre Padilha mas a todos que defendem a democracia e o direito ao cuidado em liberdade.

Desta forma, nós, defensores da democracia e da liberdade de expressão, de uma política de saúde mental humanizada e antimanicomial, com eixo na autonomia dos usuários e que respeite a história das lutas e dos movimentos populares, nos manifestamos em solidariedade ao ex-ministro e deputado Alexandre Padilha e na defesa irrestrita da democracia e de uma saúde mental onde loucura não se prende e nem se tortura.