Envergonhada pelo apoio desastrado a Macri, a mídia brasileira esconde o caos na Argentina. Até quando? Por Donato

Atualizado em 5 de setembro de 2018 às 11:11
Mauricio Macri. Foto: Juan Mabromata/AFP

Já contabiliza uma morte a crescente onda de saques a supermercados na Argentina, algo que a mídia tradicional tem se esforçado para manter embaixo do tapete. 

O menino Ismael Ramírez, de apenas 15 anos, morreu na segunda-feira em decorrência de um disparo de arma de fogo na cidade de Saenz Peña. Há pelo menos mais uma vítima em estado grave que foi encaminhada ao hospital na província argentina do Chaco.

Em Comodoro Rivadavia o saldo foi de nove detenções também ocorridas durante o saque a um Carrefour e na noite de ontem (dia 4), ao menos outras duas ocorrências: em Mar del Plata um grupo de aproximadamente 15 pessoas saqueou um supermercado (na fuga quatro foram detidos), e uma tentativa a um pequeno comércio acabou frustrada pelo proprietário que disparou tiros para o alto.

Diversos vídeos têm circulado com imagens de pessoas carregando produtos de primeira necessidade.

Alguma dúvida que se fosse na Venezuela o assunto seria manchete? O estardalhaço que a mídia estaria fazendo colocando a culpa no ‘regime’ ocuparia muito mais espaço que o praticado em nome da Argentina. Claro, Maduro é o capeta. O tom das matérias seria apocalíptico.

Não é particularidade nossa. Também o jornal Clarín (o gigante conservador argentino, monopolizador e historicamente detentor de jornal, rádios e TVs) vinha abafando as crescentes manifestações de rua contra as medidas de Mauricio Macri e somente hoje, após a morte do adolescente, resolveu destacar que “o governo admite estar preocupado”.

Preocupado? 

Mauricio Macri – o Amoêdo argentino – foi vendido como antídoto contra a esquerda kirchnerista. Portador de medidas de austeridade, o ‘gestor’ que colocaria a casa em ordem. Agora, dois anos e meio após assumir a presidência da Argentina, mostra-se incapaz de cumprir o que pregava. 

O resultado é que esse João Doria dos pampas (em setembro do ano passado, Doria esteve em Buenos Aires em um encontro com Macri e declarou: “Nossas ideias são absolutamente iguais, sem retoque. Foi um encontro inspirador.”) acabou de anunciar corte em ministérios, aumento de impostos, o dólar disparou e o peso perdeu 50% do valor, endividou-se ainda mais com o FMI. Por fim, Macri admitiu que a pobreza irá aumentar na Argentina.

E as fórmulas e receitas liberais infalíveis?

Para Macri, a situação ruim se deve à seca que afetou o agronegócio, à instabilidade internacional devido os embates comerciais entre China e Estados Unidos e, claro, ao legado da gestão anterior.

É sempre assim: quando o governo é de esquerda, os resultados ruins da economia são fruto de incompetência, do excesso de corrupção, começam as campanhas por impeachment e pedidos de cadeia para os responsáveis, gritos de “cortem-lhes as cabeças!!”

Mas se o governo é de direita, que lá chegou desdobrando um folder liberal impresso em 4 cores em papel brilhante e ainda assim a economia vai mal, é porque a crise é global, a culpa é do clima, do furacão Katrina, do Messi, do mordomo que não veio trabalhar e, inegavelmente, do ‘legado’ que os esquerdistas comunistas bolivarianos corruptos deixaram.

Economia e crise são termos indissociáveis e sempre utilizados de maneira maliciosa em vésperas de eleições. O discurso de dez entre dez liberais é que a crise se deve por incapacidade do governo da vez e que os impostos estão arrochando a população.

Onda de saques atinge a Argentina (Foto: Reprodução)

Num país como o Brasil, criticar impostos pega os mais pobres na veia. Sem dúvida para esses os tributos pesam. O que ninguém lhes diz é que pesam porque só eles pagam. Quanto mais rico, menos o cidadão contribui.

É assim, com essa conversa fiada, que de tempos em tempos um Macri, um Skaf, um Amoêdo, chega ao poder. Mas uma vez lá, traem seus eleitores. O tucano FHC, por exemplo, pegou o país com uma carga tributária de 26%. Entregou a faixa para Lula com uma carga de 32% (dados da FGV compilados pelo IBGE). Isso a TV aberta também não fica repetindo, não é mesmo?