Escândalo de apostas no Brasileirão pode devastar o futuro de clubes, como na Itália. Por Luan Araújo

Atualizado em 10 de maio de 2023 às 20:30
Gabriel Tota em campo, sorrindo e olhando para o lado
Gabriel Tota se envolveu em polêmica recentemente – Reprodução/Instagram

Por Luan Araújo

Eu vou completar 33 anos de idade no próximo dia 16 e destes 33, 29 deles foram frequentando estádios de futebol. E a graça, além de acompanhar meu time e estar entre os meus, sempre foi ficar feliz, triste, eufórico, com raiva, chateado, indiferente. Mas com uma certeza: o que eu veria em campo seria o justo.

Essa inocência infantil se foi com o tempo, admito. Em 2005, quando eu era adolescente, vi a Máfia do Apito, uma quadrilha que usou dois árbitros para manipular resultados, ser desnudada e virar do avesso um Campeonato Brasileiro que parou na mão do Corinthians, o time que eu torço. Ali, a figura do juiz ladrão, que só era folclórica, virou real.

Juiz ladrão que foi aliciado por conta de apostas feitas em sites, à época, ilegais no Brasil. Só que na distopia grande que é o país, elas são permitidas hoje, desde que sejam sediadas em países de domínio de internet fora do país. E hoje elas atuam em todos os esportes. Todos mesmo. Desde futebol até campeonato universitário de xadrez. E não só o resultado, mas todas as partes do jogo, com faltas, laterais, escanteios e cartões.

E é no mote de cartões, incialmente, que a Operação Penalidade Máxima, do Ministério Público de Goiás, encontrou manipulações nas partidas, incialmente da Série B do Campeonato Brasileiro e agora, em outra etapa, também na primeira divisão. O caso mais escabroso é o de Eduardo Bauermann, zagueiro do Santos, que foi aliciado por 50 mil reais para tomar cartões em dois jogos do Brasileirão do ano passado.

E a coisa foi escalando nos últimos dois dias. Mais jogadores de primeira divisão sendo denunciados. Alguns, falando com criminosos apostadores dentro do vestiário antes de partidas, como o meia Gabriel Tota e o Zagueiro Paulo Miranda, ambos à época no Juventude, antes de uma partida.

Não é de hoje que o jogador de futebol de primeira linha, que representa 1% da classe no Brasil, se mostra completamente alienado sobre o que acontece em sua volta. Dentro deste grupo, o individualismo, o falso moralismo religioso e a completa falta de consideração com o torcedor, que paga ingressos cada vez mais caros que eles, são regra.

Os clubes também são culpados. Todos os 20 clubes da Série A têm algum tipo de patrocínio de casas de apostas. Os mesmos clubes, aliás, que contestam a proposta de regulamentação do Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, destes portais, sediados normalmente em paraísos fiscais, que não pagam nenhum tipo de imposto ao país.

Os jogadores Nathan, do Fluminense, Bauermann, do Santos e Richard, do Ceará, acusados de envolvimento com a máfia das apostas. Fotomontagem

Se os clubes querem tanto uma fatia no bolo dessa regulação, deveriam fiscalizar melhor quem contrata. Pois, para mim, quem permite isso dentro de seu elenco profissional é, no mínimo, negligente.

Em outros países, escândalos do tipo aconteceram. Na Itália, por exemplo, o “Totonero”, no início da década de 1980, foi escancarado após a descoberta de compra de jogadores para manipulação de resultados por parte de empresários da capital do país, Roma. Os clubes, que inicialmente não tinham relação com o caso, foram sendo cada vez mais expostos pela quantidade de atletas em seus elencos que toparam fraudar resultados. Isso resultou no rebaixamento de dois clubes: a Lazio, e o poderoso Milan, um dos clubes mais populares do país e um dos mais vitoriosos do planeta.

O Milan, aliás, caiu de novo após voltar à primeira divisão, desta vez no campo. Só foi se reerguer na segunda metade da década. Pagou, com justiça, pela negligência que teve ao deixar seu elenco ser subornado.

É possível que isso aconteça no Brasil? Não sei. Mas eu não acharia injusto. Estamos diante de um escândalo muito maior que o de 2005. Os sites de apostas no Brasil não podem continuar operando no Brasil sem nenhum tipo de regulamentação. E os clubes, que já recebem muitas benesses do governo, como perdão de dívidas e acordos como o Profut, deveriam se recolher. Melhorar a conformidade e pensar em toda uma credibilidade que está indo para o vinagre.

O torcedor que acompanha todos os jogos está revoltado, decepcionado, sem nenhuma distinção de time que torce. É um duro golpe que vai fazer com que a desconfiança em cima de qualquer lance seja tremenda. Uma verdadeira crise de credibilidade. E não há empolgação juvenil que impeça qualquer um que acompanha o futebol brasileiro de sentir isso.

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