“Esquizofrenia não justifica atos de racismo”, diz professor da USP sobre agressão a entregador

Atualizado em 9 de agosto de 2020 às 18:40

Publicado originalmente no Brasil de Fato

Por Vitória Rocha

Entregador se defende de ofensas | Reprodução

“Não dá pra gente justificar um ato pela presença de um transtorno como a esquizofrenia”. Essa é a avaliação do psicanalista Christian Dunker, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), a respeito da informação dita pelo pai do contabilista Mateus Abreu Almeida Prado Couto, sobre o comportamento do filho que humilhou o entregador Matheus Pires Barbosa, 19 anos, em um condomínio de luxo no interior de São Paulo.

“A esquizofrenia pode alterar a percepção do outro. Frequentemente isso acontece em uma condição conhecida como ‘delírio’. No entanto, quando a gente olha para atos agressivos que giram entorno de um transtorno, a pergunta é sempre como a pessoa está lidando com aquilo do ponto de vista da medicação, do tratamento”, explica Dunker.

Contradições sociais, como racismo e a desigualdade, também interferem na percepção de pessoas que sofrem com esse transtorno. “É importante lembrar que os delírios frequentemente captam algo da contradição de um determinado ambiente social onde aquela pessoa está. O antagonismo social se traduz em uma prática racista, de preconceito, e que, muitas vezes, se infiltra nesses sintomas”, afirma o psicanalista.

Em 31 de julho, o contabilista Mateus Abreu Almeida Prado Couto foi filmado humilhando o entregador e motoboy Matheus Pires Barbosa no Condomínio Vila Boa Vista, no bairro Invernada, em Valinhos, interior de São Paulo. Na gravação é possível ver o contabilista apontar para o próprio braço – num gesto tradicionalmente racista – e dizer “você tem inveja disso aqui”. Em seguida, afirma: “Você nem deve ter onde morar”.

Na delegacia, o caso foi registrado como injúria racial. Couto se defendeu, afirmando que usou as palavras “preto, favelado e marginal”, mas que não fez ofensa em “relação à cor da pele”. Em seu depoimento, Fernando Magalhães Couto, o pai do contabilista, afirmou que o filho sofre de esquizofrenia.

Edição: Michele Carvalho