Avental muda tudo, diz cineasta que denunciou “preconceito brasileiro contra serviçais”
Do iG:
Cineasta, músico e escritor. Anderson França, o Dinho, de 41 anos, mora na periferia do Rio de Janeiro e trabalha desde o início do ano como cozinheiro.
Na última semana, um texto dele sobre um jantar em uma área nobre carioca viralizou após ser publicado no Facebook. O texto fala sobre preconceitos sofridos por ele e pela equipe de cozinheiros que trabalha com a mulher dele, chef de um buffet que atende em domicílio.
“Maluco acha que é melhor porque fez produção cultural e usa um rádio da firma na cintura”, diz um trecho da publicação, que, segundo ele, não conta a história completa.
França relata que a confusão começou após sua cliente, que mora em uma área nobre carioca, tratar mal tanto ele como seus colegas de trabalho.
França acha que isso se deve a um sentimento de superioridade em relação a prestadores de serviço. “Vestiu um avental, tudo muda”, diz ele.
O texto registrou mais de 20 mil curtidas e 6 mil compartilhamentos em menos de uma semana na rede.
Leia o depoimento de Anderson França à BBC Brasil:
“O que aconteceu foram palavras, expressões e comportamento que configuram assédio moral. Presenciamos humilhações verbais.
Fomos fazer um buffet para um cliente e, durante a madrugada, uma pessoa começou a questionar a qualidade da comida. A gente percebeu que, na verdade, era algo além daquilo. Então, ela começou a fazer questionamentos cada vez mais pessoais.
Ela passou a expor a equipe publicamente até com xingamentos, falando alto. Ela expôs todas as pessoas e a chefe do trabalho, que é a minha esposa. Sentimos muito preconceito naqueles discursos.
Aquilo ocasionou uma pressão insustentável e administramos até o ponto que a gente não conseguiu. Guardamos tudo e fomos embora.
O pior é que no evento tinha uma galera que milita em coletivos de direitos humanos, feministas, de arte e cultura. Eu venho do setor de cultura e esperava muito mais consciência deles na relação do trabalho. Como pode pessoas terem discursos tão contraditórios?
Tem muita gente também que se diz um cara de esquerda, mas nunca entrou numa favela. Nunca pegou um trem. Como essa pessoa vai dialogar com a periferia?