Barroso: “Sou contra todos os penduricalhos que os juízes ganham”
Do ministro do STF Luís Roberto Barroso, defensor da Operação Lava Jato, em entrevista à Folha:
Folha – O empresário Donald Trump acaba de ser eleito presidente dos EUA. Há uma onda conservadora no mundo e também no Brasil?
Luís Roberto Barroso – A onda da eleição acabou de estourar, estamos no meio da espuma. Não há visibilidade para grandes interpretações. É preciso esperar. Mas que [Trump] é uma opção conservadora, ninguém duvida.
E o Brasil?
Eu não acho que o Brasil viva propriamente uma onda conservadora. É preciso inclusive identificar o que é progressista e o que é conservador. Existe uma esquerda extremamente conservadora, defensora de dogmas que a realidade já superou.
Mas o Brasil está indo para a frente ou para trás?
Caminha para a frente, mas devagar demais.
Por exemplo, quando houve a mudança de governo, de Dilma [Rousseff] para o de Michel Temer, o grande debate era: quem é o melhor nome para ser ministro da Fazenda. Pois eu defendo que a educação deva ter o mesmo status, a mesma prioridade.
Para evitar intriga: não há reserva ao atual ministro da Educação [Mendonça Filho], até já o recebi, é uma pessoa distinta, bem intencionada. Mas a educação não é tratada como a economia.
Como consequência disso, eu não acho que o maior problema brasileiro seja a corrupção. O nosso maior problema é a mediocridade, é a escassez de pessoas pensando o país lá na frente.
Os críticos da PEC do teto de gastos dizem que ela imporá, no longo prazo, cortes drásticos justamente na educação.
A vida não é feita de tudo o que a gente quer. Ela é feita do possível. A responsabilidade fiscal não tem ideologia. O Estado não pode gastar mais do que arrecada porque os juros sobem, gera inflação, e isso penaliza os mais pobres.
Há uma discussão desfocada. Quando você diz que não pode gastar além de determinado patamar, não está dizendo que vai cortar da educação ou da saúde.
A disputa não deve ser contra a PEC. E sim na discussão do orçamento, que não existe no Brasil. É nela que o país define suas políticas públicas e faz as suas escolhas trágicas.
No Brasil, com interesses corporativos tão consolidados, os da educação não acabam sempre sacrificados?
Eu sou contra todos os interesses corporativos, inclusive os do Judiciário, inclusive todos os penduricalhos que os juízes ganham.
São valores maiores do que o teto estabelecido por lei.
Não eu, e não os ministros do Supremo, tenho que dizer.
Mas os próprios juízes se dão aumentos. Quem pode controlá-los?
Os juízes devem ser bem pagos. Mas devem ter remuneração transparente. Esse Judiciário em que nem o tribunal de contas consegue saber quanto juízes ganham dá um mau exemplo.
Não é o limite de gastos que precisa ser enfrentado. E sim os privilégios, onde quer que existam.
É preciso diminuir o Estado. Não há alternativa. Vamos precisar de menos Estado, menos oficialismo, mais República. E talvez até um pouco de capitalismo, que aqui vive de financiamento público e reserva de mercado.
O modelo no Brasil não é propriamente capitalista. É um socialismo para ricos.
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