Como Lula adquiriu o hábito de ler livros

Do valor:

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva trocou as metáforas sobre futebol pelas citações históricas em seus últimos discursos. A mudança reflete o fato de que Lula tornou-se um leitor dedicado nos últimos anos e suas avaliações políticas refletem o novo hábito.

Nas rodadas de conversas com petistas e aliados que promoveu neste mês, em Brasília e Belo Horizonte, Lula comparou o momento atual do partido, mergulhado em denúncias de corrupção, à perseguição aos judeus na Segunda Guerra Mundial. Ele já havia feito essa alusão durante a campanha, em outubro, mas foi mais cáustico nas últimas análises.

No jantar com petistas na semana passada, ao se referir à biografia do general Alex Dumas, pai do escritor Alexandre Dumas, instou os correligionários a agirem como os três mosqueteiros: o “PT tem que defender o PT”, independentemente do governo, tem de ser “um por todos e todos por um”.

Em conversas reservadas, Lula comentou, segundo relatos de interlocutores ao Valor, que a atitude dos petistas, diante do vendaval de denúncias, lembra a dos judeus diante do trem que os conduzirá ao campo de concentração nazista: se saírem correndo, levam tiros. Se embarcarem, só lhes resta a esperança de que a guerra termine antes do fim da viagem. Lula avalia que o PT está paralisado, acovardado, e se não reagir, acabará na câmara de gás.

A alusão ao martírio judaico parte da leitura do romance russo “Vida e Destino”, de Vassili Grossman, obra de fôlego sobre a Segunda Guerra, que vem sendo chamada de “o novo Guerra e Paz”, de Liev Tolstói. O calhamaço de 920 páginas foi presente do ex-ministro Franklin Martins.

Já a citação ao brado de Athos, Porthos e Aramis parte da leitura de “O Conde Negro”, de Tom Reiss. A obra, agraciada com o Prêmio Pulitzer, narra a trajetória do general Thomas-Alexandre Dumas, pai do autor de “Os Três Mosqueteiros”, filho de um nobre com uma escrava, que foi herói da Revolução Francesa.

Amigos e auxiliares próximos afirmaram ao Valor que Lula adotou a leitura como hábito a partir das horas de solidão que lhe foram impostas no quarto do Hospital Sírio-Libanês entre 2011 e 2012, durante o tratamento do câncer na laringe, e depois durante a convalescença, em casa.

“Por conta desse câncer, eu li mais do que eu já tinha lido em toda minha vida”, disse Lula na última semana, ao discursar no ato público em defesa da Petrobras no Rio de Janeiro. “Eu li biografias importantes e sobre movimentos históricos importantes, e pude entender um pouco mais a vida política desse país”, justificou.

(…)

Paulo Nogueira

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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