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Desembargadora de SP pode ser punida por soltar presos que já haviam cumprido pena

Da Carta Capital:

 

A desembargadora Kenarik Boujikian, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), corre o risco de ser punida por fazer cumprir a lei. Conhecida por sua atuação na defesa dos direitos humanos e por ser co-fundadora da Associação Juízes para a Democracia (AJD), a magistrada expediu alvarás de soltura para dez presos que, embora encarcerados preventivamente, tinham cumprido a pena fixada em suas sentenças.

A decisão incomodou colegas da Corte, e o desembargador Amaro José Thomé Filho ingressou com uma representação contra Boujikian por violação do princípio da colegialidade. A soltura dos presos foi determinada pela magistrada na condição de relatora dos processos, sem que os casos fossem apreciados pela 7ª Câmara Criminal do TJ-SP.

Boujikian afirma que agiu monocraticamente em situações nas quais o procedimento era permitido. Segundo ela, o episódio tem suas raízes no conservadorismo e, ainda, no machismo do Judiciário. “Na cultura do encarceramento massivo, arraigada no cotidiano dos fóruns, qualquer pensamento dentro do marco punitivo que não seja daquela maioria momentânea soa como alerta contra alguém que coloca em perigo a ‘segurança’. Penso que, se for uma mulher a fazer esse rompimento, as questões passam a ter maior gravidade, pois o mundo penal ainda é dos homens.”

A socióloga Julita Lemgruber, ex-diretora-geral do sistema penitenciário do Rio de Janeiro, concorda. Boujikian, diz a socióloga, tornou-se alvo por “personificar” a luta pela preservação da lei e dos direitos humanos. “Isso mostra a realidade de um Judiciário extremamente conservador e, pior, um Judiciário que não tem defendido a lei”, diz. “A Kenarik é vista com restrições pelos mais conservadores porque sempre teve atitudes muito progressistas, mas garantistas.”

A trajetória de Boujikian é marcada por certo enfrentamento do senso comum. Em novembro de 2013, quando os primeiros condenados no “mensalão do PT” começavam a ser presos, o juiz que coordenava as detenções foi afastado da Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal após aparente desentendimento com o então presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa.