Dilma: “Fomos ingênuos em relação aos meios de comunicação”
Em entrevista ao Página 13, Dilma Rousseff falou sobre sua relação conturbada com a mídia: “Eu não quero o controle econômico do conteúdo. Nem o controle monopolista nem o oligopolista do conteúdo. Nós não soubemos colocar bem essa discussão. E fomos ingênuos em relação aos meios. Eles não têm nem princípios democráticos, nem republicanos. Com eles não dá para fazer ‘senta que o leão é manso’. O leão não é manso. Come sua mão, sua perna e sua alma”.
Agora pegando o lado mais político, a relação do seu governo e também do governo Lula com os meios de comunicação, tendo em vista isso que você disse acerca da postura do grande empresariado: poderia ter sido diferente? Você acha que poderia ter sido diferente em relação à questão da comunicação de massa?
Eu acho que sim e mais do que isso… No início de tudo, estou me referindo a 2003, todos os grupos estavam em crise. Endividadérrimos até a alma. É muito difícil, no início, você ter uma visão que você tem hoje. Teria sido possível uma maior democratização dos meios de comunicação. Nós não podemos nunca deixar que se faça uma confusão entre duas coisas. Os meios de comunicação de massa enquanto negócio são iguais a qualquer negócio de qualquer empresa e, portanto, é inadmissível que eles sejam monopólios ou oligopólios. Isso é contra a democracia. Não é só contra a economia popular, mas é contra a democracia. Então, são esses os dois motivos e isso é eminentemente uma relação econômica. Primeiro de tudo, você não pode deixar que tenha junto jornal, televisão, rádio e revista e qualquer outro, tudo junto no mesmo conglomerado. E esta é uma questão de regulação econômica. Tem que impedir, como você impede no CADE. Mesmo no Brasil, você impede pouco. No mundo, se impedia mais. Hoje, também, está se impedindo pouco. Está lá o Trump querendo revogar algumas das regulações. Então, o que é que tinha que ser feito naquele tempo? Ao invés de você ajudar um grupo, o que tinha que fazer era viabilizar as formas mais democráticas possíveis. Mas a gente não sabia disso direito. Ninguém ali tinha essa proposta. Ninguém… Falar depois é fácil. Mas ali é que estavam as condições materiais para fazer. Por que tinha condições materiais para fazer? Porque tinha crise.
Segundo lugar, tinha que ter tido uma Lei de Meios. Eu não acredito na tese de que nós somos republicanos demais. É impossível não ser republicano, se não você passa a ter uma defesa meio malandrinha de algumas coisas. Mas ser republicano não significa não impedir que haja o controle econômico da mídia no Brasil. Porque o controle da mídia é econômico. O que a mídia faz? Ela exibe e arma contra nós a imprensa livre e democrática como fundamento da democracia. Perfeito. Agora, o fundamento da democracia não é igual a monopólio nem oligopólio. Nós defendemos a liberdade de imprensa. Não quero controle de conteúdo nenhum. Eu não quero o controle econômico do conteúdo. Nem o controle monopolista nem o oligopolista do conteúdo. Nós não soubemos colocar bem essa discussão. E fomos ingênuos em relação aos meios. Eles não têm nem princípios democráticos, nem republicanos. Com eles não dá para fazer “senta que o leão é manso”. O leão não é manso. Come sua mão, sua perna e sua alma.
No final do período Lula, não tinha mais força política suficiente para regular a mídia. Muito menos na presidência da Câmara o Eduardo Cunha. Como é que foi que o Eduardo Cunha se elegeu? Ah! Foi só com o Congresso? Não! O Eduardo Cunha foi lá na Globo e negociou com a Globo: “Ela [Dilma] está dizendo, na eleição, que vai fazer a regulação da mídia. Eu não vou! Ela não passa aqui!” Ele contava em prosa e verso. Eu não acho que ali a gente tivesse mais força para fazer. Talvez, no finalzinho do Lula. Talvez. Acho que o Franklin não conseguiria. Agora, não tenho dúvida de que esta é uma questão crucial no Brasil. Ou democratiza isso ou vai ser muito difícil. Porque duas forças aqui no Brasil, hoje, são contra a mudança e a favor de medidas regressivas. Duas grandes forças. Uma são os meios de comunicação. Os meios de comunicação são antidemocráticos!
