Elio Gaspari: Bolsonaro não é Trump, a alma de sua retórica está em Duterte
A Coluna de Elio Gaspari na Folha de S.Paulo aborda governantes externos que influenciam Jair Bolsonaro. “Comparar Jair Bolsonaro a Donald Trump pode ser até chique, mas é o mesmo que viver na Barra da Tijuca pensando que se está em Miami. A alma da retórica do capitão está bem mais longe, nas Filipinas. Seu presidente chama-se Rodrigo Duterte, prometeu reformas econômicas e celebrizou-se pela política de combate à criminalidade, sobretudo ao tráfico de drogas. Visitando o quartel do Batalhão de Operações Especiais da PM do Rio, Bolsonaro disse à tropa que ‘podem ter certeza, chegando (à Presidência), teremos um dos nossos lá em Brasília’. Em seguida, deu o grito de guerra da corporação: ‘Caveira!'”.
O jornalista desenvolve o raciocínio: “comparado com Duterte, Bolsonaro é uma freira, pois o presidente filipino vai além: ‘Hitler matou 3 milhões de judeus. Temos 3 milhões de viciados, eu gostaria de matá-los’. Está cumprindo. Em dois anos de governo morreram 4.500 pessoas segundo as estatísticas oficiais e 12 mil, segundo organizações da sociedade civil. Como Bolsonaro e Donald Trump, Duterte manipula sua incontinência verbal. Põe na roda a mãe de quem o desagrada, do papa ao ex-presidente Barack Obama. Quando uma missionária australiana foi morta e estuprada, ele disse que lastimava o crime porque ela “era tão bonita, foi um desperdício”. Em alguns casos desculpou-se. Aos 75 anos, tem o cabelo curto e negro de tintura, gosta de andar de motocicleta, teve um divórcio agreste, propala sua virilidade e as virtudes da pílula azul. Ele diz que ‘meu único pecado são os assassinatos extrajudiciais'”.
E ele finaliza, falando sobre os esquadrões da morte nas Filipinas: “se ‘execuções extrajudiciais’ fossem remédio, o Brasil seria uma Dinamarca. Em 1970, uma pesquisa realizada no Rio e em São Paulo mostrou que 46% dos entrevistados estavam a favor do ‘Esquadrão’. Há uns 20 anos, quando surgiram as primeiras milícias nas cidades brasileiras houve quem achasse que elas eram remédio contra o crime. Passou o tempo e os problemas agora são dois: o crime e as milícias. A ideia do combate aos bandidos partindo da suposição de que ‘direitos humanos’ não devem ser confundidos com ‘direitos dos manos’ (palavras de Jair Bolsonaro) pode estatizar algumas ‘boas’ milícias. Em dezembro de 1993, quando a polícia colombiana botou para quebrar no combate aos bandidos e conseguiu matar o traficante Pablo Escobar, símbolo do narcotráfico latino-americano, os louros da vitória foram para o presidente César Gaviria. Conhecendo a questão da violência e do tráfico, no ano passado ele escreveu um artigo intitulado ‘O presidente Duterte está repetindo meus erros’. O filipino respondeu: ‘Isso só seria possível se eu fosse um idiota, como você’. A popularidade de Duterte está em 75%. Vive-se melhor na Colômbia”.

