Elio Gaspari diz que a história não fica em pé e pergunta: “onde está o Fabrício Queiroz?”
A Coluna de Elio Gaspari na Folha de S.Paulo discute o caso de Queiroz, ex-assessor da família Bolsonaro. “O PM Fabrício Queiroz continua sumido. Quem conhece o mundo das malfeitorias garante: ‘É suicídio’. Ele não aparece em casa e não compareceu aos depoimentos combinados com o Ministério Público. Admita-se que esteja com os nervos em pandarecos, pois passou de amigo da Primeira Família para o centro de uma rede de movimentações financeiras pra lá de suspeitas. Seu ex-chefe, o senador eleito Flávio Bolsonaro, diz que ouviu seu relato e achou-o ‘bastante plausível’. Só se poderá confiar nessa plausibilidade depois que o relato se tornar público”.
O jornalista desenvolve o raciocínio e aponta inconsistências: “uma coisa é certa: a história segundo a qual Queiroz deixou a assessoria de Flávio Bolsonaro no dia 15 de outubro para tratar de sua aposentadoria não fica em pé. Ele foi exonerado no dia seguinte ao aparecimento da notícia de suas movimentações bancárias ‘atípicas’. Além disso, no mesmo dia, foi exonerada sua filha Nathalia, que estava lotada no gabinete de Jair Bolsonaro, em Brasília. Quando os dois tornaram-se ‘ex-assessores’, faltavam 13 dias para o segundo turno. O silêncio de Queiroz faz com que suas movimentações financeiras ‘atípicas’ continuem apenas como algo suspeito. Um depósito de R$ 24 mil na conta da mulher de Jair Bolsonaro já foi explicado por ele como parte do pagamento de um empréstimo pessoal”.
E fala mais sobre o ex-assessor: “outros murmúrios, saídos de fontes anônimas, falam em venda de objetos eletrônicos a conhecidos. Coisa de R$ 600 mil ao longo de 13 meses, caso se olhe só para o que entrava em sua conta. Mesmo assim, o feirão de Queiroz movimentava quantias muito superiores ao seu rendimento como suboficial da PM e assessor de um deputado estadual. Queiroz não é um PM qualquer. Além da ligação com os Bolsonaro, sua folha é a de um militar premiado. Foi homenageado pela Assembleia Legislativa e ganhou a medalha Pedro Ernesto. Há anos, como soldado, recebeu o abono, hoje extinto, dado aos PMs por atos de bravura em confrontos com bandidos. Era a ‘gratificação faroeste’. (Quando esse benefício foi instituído, em seus confrontos a PM do Rio matava duas pessoas e feria uma. Dois anos depois, matava quatro para cada ferido.)”
E finaliza: “o silêncio de Queiroz pode ser eficaz para quem olha para o tempo político. É suicídio porque esse tempo nada tem a ver com o do Ministério Público. Os procuradores não têm pressa, têm perguntas. Se ele movia tanto dinheiro porque transacionava com mercadorias, deverá dizer de quem as comprava e para quem as vendia. A esperança de que Queiroz passe pelo Ministério Público administrando um silêncio seletivo é suicida. Peixes grandes como Marcelo Odebrecht e Antônio Palocci tiveram a mesma ilusão. Queiroz é um lambari, sua movimentação financeira não compraria um dos relógios com que as empreiteiras mimavam maganos. Contudo, sua trajetória e seu silêncio são ilustrativos do que vem junto com a ‘cultura da violência’. Ele foi da PM para um gabinete na Assembleia Legislativa do Rio, empregou parentes e tem a confiança da Primeira Família da República, cujo chefe elegeu-se presidente com uma plataforma moralista e justiceira”.
