Ex-paciente acusa João de Deus de abuso sexual na casa dele em Goiás

A jornalista Fernanda Mena, da Folha de S.Paulo, relata a acusação de abuso sofrido pela empresária paulistana de origem libanesa Aline Saleh, 29, por parte do medium João de Deus. Caso teria ocorrido em 2013.

(…)

Quando começou a sessão, sai da cadeira, e João pediu que eu me sentasse logo ao lado. Ao final, fui para a sala dele, onde havia novamente duas ou três mulheres na espera. De novo, apenas mulheres. Isso me chamou a atenção.

Ele chamou a minha avó e começou a dizer que eu tinha um dom e que poderia trabalhar com ele, fazendo o bem e curando as pessoas. Minha avó ficou toda orgulhosa.

Aí ele disse: “A senhora já almoçou? Não? Então vá, que eu vou ficar aqui conversando um pouquinho mais com a Aline”. Um ajudante levou minha avó.

Nessas, eu já estava supertensa. Ouvi-lo gritando no dia anterior me fez pensar: “Epa, um líder espiritual não deveria berrar desse jeito”.

O ajudante voltou e falou ao médium que ali estava “aquela moça com o filho”.

Entrou uma senhora simples com um menino de mais ou menos 10 anos, que claramente tinha algum problema mental. Ela disse ao “Seu João” que era a terceira vez que ia à Casa, sem observar melhora no filho.

O médium olhou pra mim e disse: “Dá um passe nele”. Falei que não sabia. E ele: “Sabe, sim!”.

Olhei para aquela mulher como se lhe pedisse desculpas, levantei e dei um passe no menino. Não sabia direito o que estava fazendo. Quando terminei, ele falou para a mãe do garoto: “Pronto, ele já vai melhorar”.

Não fiquei confortável com aquela situação. E piorou. Quando a mulher, o filho e o assistente saíram da sala, João passou a chave na porta de vidro jateado. Virou e começou a falar: “Olha, menina, você tem um dom. Você é muito especial. Viu o que acabou de fazer no menino?”. E eu, quieta.

“Agora, vou reenergizar os seus chacras. Fica de pé!”, mandou. E começou a pegar nas regiões dos sete chacras do corpo [pelve, umbigo, estômago, coração, garganta, testa e topo da cabeça].

Disse que eu estava com muita energia e precisava de um realinhamento. Em seguida, e muito rapidamente, abriu a porta do banheiro da sala e me colocou pra dentro. Pediu que eu virasse de costas, colocasse as mãos nos meus quadris e me mexesse. Disse que era para liberar a energia. Muito esquisito.

E, nisso, você se vê acuada e não sabe o que fazer. Sentia meu corpo todo gelado, dos pés à cabeça. Ele falava “mexe, mexe”. E eu dizia: “não quero, não consigo”.

João falava o tempo todo que estava “tudo certo”, e começou a me encoxar, rebolando. Aí pegou a minha mão e colocou para trás, no pinto dele, flácido, que estava para fora da calça.

Puxei a mão de volta. Ele disse que era “assim mesmo”, que era importante e tal.

Tentou, de novo, conduzir minha mão para o seu pênis. Eu reagi. “O que é isso? Isso não está certo!”. E me virei. Ele saiu pra sala, fechou a calça, se sentou no sofá. Eu me sentei no segundo sofá da sala, petrificada.

João abriu a porta. Perguntou minha avó já tinha almoçado, e pediu que a trouxessem ali. Quando minha avó apareceu, ele voltou a me elogiar para ela. Comecei a me sentir mal. Pedi licença e saí correndo.

Do lado de fora da casa, desabei num choro que não acabava. Fiquei confusa e liguei pra minha tia em busca de ajuda. “Será que eu estava ficando louca? Será que tinha de ter cedido?”.

Ela falou: “Sai daí agora, Aline! Esse cara é louco!”.

Para minha tristeza, minha avó desconfiou do meu relato de que João de Deus havia me levado para dentro do banheiro onde tentou, por duas vezes, colocar minha mão no seu pinto. Ela disse que o médium era um homem maravilhoso, que curava as pessoas, e que eu estava confundindo os fatos.

Queria ir embora dali imediatamente. Era insuportável permanecer num lugar onde as fotos de João de Deus estão por toda parte. Consegui remarcar o voo de volta a São Paulo no dia seguinte.

Ainda na pousada, comecei a fazer pesquisas na internet. Não encontrei nenhuma associação de termos como “fraude” ou “abuso sexual” e o nome de João de Deus, a não ser um comentário num blog. Resolvi procurar em inglês “John of God” e encontrei bastante coisa. Fiquei com medo. Achei que ele poderia vir atrás de mim porque eu havia fugido.

(…)

Médium João Teixeira de Faria, 76, conhecido como João de Deus
Foto: Divulgação
Pedro Zambarda de Araujo

Escritor, jornalista e blogueiro. Autor dos projetos Drops de Jogos e Geração Gamer, que cobrem jogos digitais feitos no Brasil e globalmente. Teve passagem pelo site da revista Exame e pelo site TechTudo. E-mail: pedrozambarda@gmail.com

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Pedro Zambarda de Araujo

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