Folha diz que “década perdida” surgiu “na desastrosa gestão de Dilma”, negando o golpe
Do editorial da Folha de S.Paulo.
O Brasil perdeu a década que chega ao fim. Em termos objetivos e mensuráveis, conforme reportagem publicada nesta Folha, é mais pobre hoje do que há dez anos, condição impensável para um país de tantos atrasos, carências e desigualdades. Entretanto um fracasso dessa magnitude não se limita aos aspectos econômicos.
A considerar só estes, o desastre de agora pode ser tido como menos traumático que o do período 1981-90, a primeira década a merecer o epíteto de perdida —aqui e no restante da América Latina.
Naquele decênio entrava em colapso um modelo de desenvolvimento que proporcionara, desde meados do século 20, taxas aceleradas de expansão industrial, urbanização e enriquecimento, ainda que com distorções e disparidades.
Agora, o país conta com protocolos econômicos para evitar uma explosão inflacionária como a que se seguiu à crise da dívida externa de 40 anos atrás —ao menos até a tempestade perfeita formada pela pandemia, por Jair Bolsonaro e pela necessidade de ajuste fiscal anterior até mesmo a este governo.
No mais, o Brasil se encontra integrado ao comércio e aos mercados financeiros globais; no decênio, ampliou o aparato de seguridade social para minorar os impactos da pobreza e do desemprego.
Rupturas na trajetória de desenvolvimento se correlacionam, de modo inevitável, com abalos nos alicerces políticos e institucionais.
Se a derrocada dos anos 1980 contribuiu para que o término da ditadura fosse menos lento, seguro e gradual do que gostariam os militares, a dos 2010 abrigou a pior recessão desde o restauro da democracia, gestada na desastrosa gestão de Dilma Rousseff.
Houve pane no que parecia um consenso mínimo para o funcionamento do país pós-Constituição de 1988 —a convivência entre um Estado amplo, com missões sociais, e o respeito a normas básicas de responsabilidade econômica, ambos geridos por coalizões partidárias que esvaziavam radicalismos.
Assim se deu ao longo de quatro mandatos presidenciais, divididos entre o tucano Fernando Henrique Cardoso e o petista Luiz Inácio Lula da Silva. Esse aprendizado em governança, porém, não se mostrou sólido o bastante.
O primeiro pilar a ruir, já no final dos anos Lula, foi o da prudência orçamentária. Uma quadra de prosperidade, impulsionada pela fartura chinesa e global, inebriava o Planalto e encorajava o presidente a escolher uma sucessora que não deveria lhe fazer sombra.
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