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Hostilidade à ONU, China e Mercosul: na prática, como será a política externa de Bolsonaro?

ONU. Foto: Wikimedia Commons

A Sputnik Brasil ouviu o doutor em Ciências Políticas e professor de Política Internacional da Universidade Estadual do Rio Janeiro, Paulo Velasco para tentar entender quais serão os rumos do país a nível global. Embora admita se tratar de um “exercício de futurologia” baseado em declarações do futuro chanceler, Ernesto Araújo e do próprio presidente eleito, Velasco pontuou alguns temas que indiciam qual será a postura brasileira a partir de 2019.

No que tange aos BRICS — grupo de economias emergentes formado pelo Brasil, pela Rússia, China, Índia e África do Sul — ainda é difícil prever o comportamento do presidente. No ano em que assume a presidência rotativa do bloco, o Brasil vê a relação com a maior economia dos BRICS — a China — ligeramente estremecida.

Quando ainda era pré-candidato, Bolsonaro irritou Pequim com uma viagem a Taiwan. Eleito, chegou a declarar que “nem a China nem ninguém poderá comprar o Brasil”. A resposta veio por meio de editorial do China Daily, visto como a voz do Partido Comunista: a política anti-Pequim “pode servir para algum objetivo político específico, mas o custo econômico pode ser duro para a economia brasileira, que acaba de sair de sua pior recessão da história”, escreveu o jornal.

Apesar das rusgas, Velasco avalia que dificilmente o Brasil deixaria os BRICS. Para o professor, o grupo oferece “uma vitrine, uma forma de se projetar internacionalmente onde o Brasil um poder de barganha ampliado e sua legitimidade também fica reforçada”.

Mercosul

Logo após a eleição, foi recebida com supresa a ríspida declaração do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, a uma repórter do jornal argentino Clarín. Questionado sobre o papel do Mercosul no novo governo, Guedes respondeu dizendo que o bloco “não era prioridade” do novo governo. A ruptura com a união entre Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Venezuela (suspensa) representaria um ponto fora da curva desde a assinatura do Tratado de Assunção que deu vida ao Mercosul em 1991.

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Velasco afirma que, diferentemente dos BRICS, o Mercosul representa obrigações profundas do Brasil, com consequências mais drásticas. O principal ponto de desacordo entre o governo Bolsonaro e o bloco seria, na visão do especialista, a tarifa externa única, o imposto cobrado de forma igual e conjunta pelos membros do Mercosul que obriga o Brasil a fazer negociações apenas em bloco. Paulo Guedes, diz Velasco, vê esta imposição como desvantajosa, já que considera que a negociação unilateral daria “maior massa de manobra, maior liberdade de ação” ao país.

“[O posicionamento de Guedes] pode significar talvez não a saída do Brasil do Mercosul, mas uma tentativa de renegociar as bases do bloco, tentando fazer com que deixasse de ser uma união aduaneira e retrocedesse à condição de área de livre-comércio. Isso significaria o fim da tarifa externa comum e a negociação conjunta”, afirma.

ONU e o multilateralismo

Durante a campanha, Bolsonaro chegou a dizer que, caso eleito, “deixaria a ONU”. O então candidato retrocedeu logo depois dizendo que pensava em abandonar o Conselho de Direitos Humanos da ONU, considerado pelo pesselista parcial em relação a Israel. Ele também cita as decisões do órgão favoráveis à candidatura do ex-presidente Lula como um dos motivos para a decisão.

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Para o professor, “historicamente, a diplomacia brasileira entende o multilateralismo como um espaço natural de ação para o país” e a ONU “é o grande espaço multilateral no mundo, que alcança temas super importantes como meio-ambiente, direitos humanos, desenvolvimento e, evidentemente, segurança internacional”.