Ignorado, morador de rua morre agonizando em frente a padaria em Ipanema
Do Globo

Sexta-feira passada, 7h20. Um homem entra e clama por ajuda na Confeitaria e Lanchonete Ipanema, na esquina das ruas Visconde de Pirajá e Joana Angélica. Em meio a uma crise de tosse, implora que alguém ligue para o Samu, mas a súplica parece não chegar aos ouvidos de clientes e funcionários do lugar. Morador de rua há pelo menos quatro anos, Carlos Eduardo Pires de Magalhães, de 40, tornou-se invisível aos olhos da sociedade. E assim morreu. Nem mesmo a repentina morte, decorrente de uma tuberculose em estágio avançado, fez com que ele fosse notado. Sem a assistência que precisava, caiu morto ali mesmo, no chão da padaria. Mas o café da manhã não parou de ser servido. A poucos metros do plástico preto que cobria o corpo, cercado por cadeiras, fregueses continuaram a comer e a beber indiferentes por duas horas, até Carlos Eduardo ser recolhido pelo rabecão da Defesa Civil.
Pequeno e negro, ele não era chamado pelo nome. Num país de racismo estrutural, era chamado por quase todos de Macaquinho. As horas que se seguiram à sua morte mostraram que, mais do que esquecido, ele era um pária da sociedade. Como estava sem documentos, o cadáver teria sido encaminhado para o Hospital municipal Miguel Couto, na Gávea, segundo o Corpo de Bombeiros. Mas o corpo estava desaparecido até a noite de noite de ontem. Ele não chegou ao Instituto Médico-Legal (IML), de acordo com a Polícia Civil. E a Secretaria municipal de Saúde nega que tenha sido levado para qualquer hospital de sua rede.
— Cheguei exatamente na hora em que ele morreu. Estava com a camisa ensanguentada, de tanto tossir e cuspir sangue. Mas, como sempre acontece, as pessoas não ouvem os moradores de rua e só oferecem a eles o desprezo. Ele não conseguiu ajuda — lamentou o jornaleiro Tarcísio Filho, dono de uma banca na Praça Nossa Senhora da Paz. (…)