Juiz vê inconsistência no argumento de que empreiteiras só pagaram propina sob ameaça
Da Folha:
O juiz federal de Curitiba (PR) Sergio Moro, responsável pela Operação Lava Jato, escreveu que “aparenta ser inconsistente” a alegação da empreiteira Mendes Júnior de que só pagou sob pressão e ameaças um total de R$ 8 milhões de propina ao esquema montado na Petrobras.
Argumento semelhante foi apresentado pela empreiteira Galvão Engenharia, que disse ter desembolsado R$ 12,8 milhões a dois grupos –um do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e outro ligado à Diretoria de Serviços– porque foi ameaçada e temia não obter novos contratos ou perder os que já detinha na petroleira.
Se comprovado, o ato poderia caracterizar concussão, crime praticado por servidor público ou contra a administração pública, que é, segundo o Código Penal, “exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida”.
Embora tenha ressaltado que ainda não é o momento para uma análise mais aprofundada dessas alegações, Moro escreveu que “algumas circunstâncias […] dificultam a admissão do álibi para fins de revogação da [prisão] preventiva”.
“Quem é vítima de concussão, busca a Polícia e não as sombras. Não há registro de qualquer resistência da parte do investigado quanto à suposta exigência, surgindo a admissão parcial dos fatos somente agora, quando já preso cautelarmente por esse mesmo crime e outros”, escreveu Moro.
O despacho diz respeito a um pedido de revogação da prisão preventiva do vice-presidente executivo da Mendes Júnior, Sérgio Cunha Mendes, que está na carceragem da PF de Curitiba. O juiz não acolheu o pedido.
Moro afirmou ainda que o longo período em que os pagamentos foram feitos parceladamente pela Mendes Júnior, cerca de dois anos, sugere “inconsistência” no argumento de que houve concussão.
“A concussão é usualmente fruto de exigência ilegal momentânea, que reduz a capacidade da vítima de resistir, como, exemplificadamente, policial que ameaça a vítima de prisão ilegal se não houver imediato pagamento de vantagem indevida, e não fruto de uma relação prolongada entre o particular e o agente público, como, no caso presente, no qual empresa agraciada com contratos públicos concorda em realizar pagamentos a agentes públicos para persistir em sua atividade lucrativa.”