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Justiça julga mais um participante da morte de jornalista e presidente do PT

Edinaldo Filgueira foi morto em 2011 na sede de seu jornal em Serra do Mel/RN

Ocorreu neste dia 25 de abril, o julgamento de mais um indiciado por participação na morte do Blogueiro e jornalista Edinaldo Filgueira. Edinaldo também era presidente do PT de Serra do Mel, município do interior do Rio Grande do Norte. O julgamento foi da comerciante Cícera Soares da Silva, proprietária do restaurante Padre Cícero, localizado naquele município. Segundo as investigações da polícia civil conduzidas pelo delegado Odilon Teodósio, a ré era a responsável pelo repasse dos recursos aos assassinos e levava as ordens do mandate ao bando.

As investigações deu-se no âmbito da operação denominada “Matadores de Aluguel” e contou com a colaboração da Polícia Federal que produziu farto material probatório como escutas telefônicas, busca e apreensão de documentos e quebra de sigilo bancário dos envolvidos, a conclusão foi que o restaurante recebia pagamento por serviços não prestados à Prefeitura comandada por Josivan Bibiano Azevedo (PSDB) e repassava esses valores para a quadrilha chefiada pelos primos do mandatário. Ao todo, foram indiciados oito pessoas, entre elas o então prefeito do município, Josivan Bibiano de Azevedo. Sete foram condenados e o processo do suposto mandante, arquivado.

Relembre o caso

Ednaldo Filgueira, de 36 anos, foi executado com seis disparos de arma de fogo por volta das 22h do dia 15 de junho de 2011, quando saía da sede do seu jornal na Vila Brasília, bairro de Serra do Mel. Ednaldo era blogueiro, jornalista, dono do “Jornal O Serrano” e presidente do PT no mesmo município. As investigações da Polícia Civil apontaram para motivações político-partidárias como as causas do crime. Em agosto de 2011, oito pessoas foram indiciadas criminalmente pelo delegado Odilon Teodósio. Cícera Soares da Costa, proprietária do restaurante Padre Cícero, em Serra do Mel, foi indiciada, juntamente com Rafânio Brito de Azevedo, Raniely Brito de Azevedo e Daniel dos Santos Azevedo, como agenciadores do crime. Abnadabe Nunes Ismael Pereira da Silva (Foguinho), Francisco Fábio Ferreira (Galego), Paulo Ricardo da Costa (Paulinho) e Marcélio de Sousa Moura também foram indiciados, apontados como envolvidos diretamente na execução do jornalista. Ao concluir a investigação, o delegado Odilon Teodósio creditou a autoria intelectual do crime ao prefeito do município, Josivan Bibiano de Azevedo (PSDB). O delegado afirmou, à época, que a execução do jornalista ocorreu em decorrência das críticas à gestão de Bibiano Azevedo no jornal de Ednaldo Filgueira. Bibiano teve a prisão preventiva decretada no dia 24 de dezembro do mesmo ano e foi solto, por força de habeas corpus, no dia 3 de janeiro de 2012. Voltou a ser preso no ano seguinte e foi novamente solto pelo mesmo desembargador Rafael Godeiro, posteriormente afastado do Tribunal no âmbito da Operação Judas por desvio milionário de precatórios e venda de sentenças.

Após perder o foro privilegiado o processo do ex-prefeito desceu à primeira instância e foi arquivado por questões processuais.

Embora a justiça tenha sido feita quanto aos executantes do crime, parece não ter alcançado o mandante. Por algum motivo irracional o judiciário potiguar produziu uma verdadeira aberração ao concluir pela existência de um crime de pistolagem, com pagamentos identificados, agenciadores condenados, mas, sem mandante.

Interrelações

O crime contra Edinaldo foi considerado crime político e tem várias interrelações com outros escândalos recentes da política estadual, seja pelos atores envolvidos ou por outras circunstâncias curiosas. Vejamos alguns:

Operação Judas – operação conduzida pelo ministério público estadual que prendeu Carla Ubarana, chefe de secretaria do TJRN e afastou os desembargadores Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro acusados de partição num esquema milionário de desvio de precários. O desembargador Rafael Godeiro também é acusado de venda de sentenças. Por coincidência este foi o desembargador que concedeu habeas corpus para a soltura do ex-prefeito quanto este estava cumprindo prisão preventiva.

Operação Pecado Capital – apurou um esquema de desvio de recursos federais repassados ao Instituto de Pesos e Medidas do Rio Grande do Norte (Ipem/RN). O empresário RYCHARDSON DE MACEDO BERNARDO, preso nesta operação diz nos autos que, em 2011, quando esteve preso com o então prefeito de Serra do Mel, Josivan Bibiano de Azevedo, o mesmo o indicou seu advogado FRANCISCO WELITHON DA SILVA que teria um esquema de compra de sentença que poderia beneficiá-lo. A revelação dessa informação desencadeou outra operação do MPF denominada Alcmeon.

Operação Alcmeon – Operação conduzida pelo MPF e Polícia Federal para desarticular um grupo criminoso que explorava a compra e venda de votos junto a uma turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Segundo a PF, o grupo agiu, inclusive, em processos relacionados à Operação Lava Jato. Advogados e um desembargador aposentado foram os alvos da operação. Nesta operação encontra-se indiciado o advogado do Josivan Bíbiano de Azevedo, Dr. FRANCISCO WELITHON DA SILVA. O voto do então desembargador ajudou a pôr em liberdade o empresário Rychardson de Macedo Bernardo, preso em uma operação em 2011, e que teve os bens bloqueados. Também foi uma decisão do magistrado que abriu caminho para o desbloqueio dos bens de Rychardson.

Impunidade

O julgamento ocorre 07 anos depois do crime e reforça a sensação de impunidade para o caso.

O Committee to Protect Journalists – CPJ, organização sediada em Nova Iorque e ligada a ONU, diz que no caso do Brasil, há uma série de assassinatos que não foram esclarecidos, em particular de blogueiros e jornalistas de meios de comunicação digitais de Estados do interior do País. “As forças da polícia e do Poder Judiciário, principalmente em pequenas cidades, são muito vulneráveis às pressões de poderosos grupos locais”, afirmou Veridiana Sedeh, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, citada no relatório do CPJ. “Inclusive existem casos nos quais as próprias autoridades cometem os crimes e posteriormente impõem obstáculos para as investigações”, acrescentou.

Homenagens

O caso do blogueiro e editor do Jornal O SerranoEdinaldo Filgueira, assassinado por denunciar a corrupção na política do seu município, foi lembrado com destaque. Blogueiros reunidos num encontro nacional da categoria, no ano seguinte, instituíram o dia 15 de junho como o Dia Nacional do Blogueiro, data de sua morte.

No ano de 2012 os documentaristas Thiago Aguiar e Adriana Amorim, produziram o documentário “De Ferro e de flor” contando a história desse que foi considerado o primeiro blogueiro assassinado no Brasil por causas relacionadas a sua atuação jornalística (veja aqui).

Edinaldo Filgueira, jornalista que foi morto. Foto: Reprodução/MeioNorte