Apoie o DCM

Mandetta acusa Bolsonaro de minar o SUS: “O que vem pela frente é mais complicado”

Jair Bolsonaro e Mandetta. Foto: Wikimedia Commons

De Afonso Benites e Beatriz Jucá no El País Brasil.

Desde que foi demitido em abril do Ministério da Saúde por não embarcar na política negacionista e anti-ciência do presidente Jair Bolsonaro, o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (Campo Grande, 1964) está em quarentena laboral. Impedido de assumir outro trabalho durante seis meses por ter exercido cargo de confiança no Governo, segue recebendo o salário de cerca de 30.000 reais. Por ora, divide seu tempo entre escrever um livro contando os bastidores de Brasília durante a pandemia de coronavírus, visitar a fazenda da família no Mato Grosso do Sul e exercer seu hobby de marceneiro. Médico ortopedista e ex-deputado pelo DEM, Mandetta tem participado de várias entrevistas e lives ―como a que esteve nesta quinta-feira (13) no EL PAÍS― nas quais costuma fazer críticas ao Governo principalmente pelas políticas de enfrentamento ao coronavírus.

(…)

A falta de um ministro titular durante a crise

Trocar o ministro pode não ser o ideal, mas não deveria ter trocado a equipe técnica. Os técnicos do Ministério da Saúde tinham todo o contexto em suas mãos. Quando saiu o Wanderson [de Oliveira, ex-secretário da Vigilância], tirou todo mundo abaixo dele. Eles perderam completamente qualquer ponto de referência. Nosso sistema de saúde é como se fosse um bicho de três pernas. Você tem o municipal, o estadual e o federal. A ordem que veio foi para o federal sair da epidemia. Não dê mais entrevistas, não fale, se possível não mostre os dados. Tentaram deixar de mostrar até os números. Faz de conta que nós não temos nada a ver com isso. Jogaram isso, e o SUS está tentando lutar somente com duas pernas, a estadual e a municipal. (…) Então, você minou o SUS. Tirou o ente federativo que era para fazer a coordenação e que dava o respaldo técnico, o empoderamento, e chamava a atenção do eventual prefeito que estivesse fazendo algo fora da curva. Como eles saíram, começou a ser uma terra de ninguém.

Você colocar um interino que não é do ramo ―e não é por ser militar, poderia ser um físico nuclear― é como ter uma guerra e colocar um pediatra para comandá-la. Então esta foi uma escolha dura para o sistema de saúde, com um diálogo dificílimo.

(…)

Se você olhar o número de mamografias que fizemos na média no ano passado e neste primeiro semestre, o número caiu lá para baixo. O que significa isso? Quando voltarmos a fazer as mamografias, vamos encontrar muito câncer de mama já com metástase, no estágio quatro. Nós deixamos de fazer o preventivo, a avaliação cardíaca, uma parte grande e o sistema está desorganizado. Planejar esse sistema e ter equipe para voltar a enfrentar isso exigiria hoje o melhor que tivéssemos dentro da saúde pública para planejar uma retomada e um recálculo. O que vem pela frente é mais complicado do que o que já ficou para trás. Vem pela frente um sistema todo para reorganizar, precisa de gente técnica. O Brasil tem técnicos maravilhosos, não precisa ser ligado nem a quem já passou lá.

(…)