Da BBC Brasil:
BBC Brasil – Como o senhor vê o crescimento dos movimentos de classe média? É saudável essa ascensão da direita na democracia?
Fernando Haddad – Nos dez anos de crescimento econômico que tivemos, a classe média tradicional presenciou um fenômeno inédito no Brasil, que foi o distanciamento dos ricos, que se tornaram ainda mais ricos, e a emergência dos pobres, que se tornaram menos pobres. E a classe média viu a sua posição relativa se deteriorar, embora não tenha perdido o poder de compra.
Ela manteve o seu poder econômico, mas viu milhões de brasileiros se aproximarem dela no ponto de vista de status e posição social. Isso (aconteceu) somado a uma agenda de intolerância cultivada desde 2006 sobretudo pelo PSDB – uma agenda antissocial, que discutiu de forma totalmente artificial temas caros às mulheres, aos jovens negros da periferia, à comunidade LGBT.
A maneira como o PSDB organizou a intolerância desde 2006 se fez notar agora. Então, esse ressentimento foi nutrido pelo preconceito, que foi sim patrocinado pela oposição.
Não há como negar o tipo de abordagem que eles fizeram nas sucessivas campanhas eleitorais, sobretudo de 2002, 2006, 2010 e 2014. Eles foram alimentando uma agenda de intolerância muito notável que, quando combinada com a crise econômica, gerou o surgimento de movimentos bastante conservadores. Alguns até de viés neo-fascista.
BBC Brasil – O senhor vê a ascensão desses movimentos como um reflexo do preconceito e divisão de classes?
Haddad – Eu vejo como a conjugação desses dois fatores. A conjunção de uma relativa perda de prestígio econômico-social, de status de uma classe média tradicional, nutrida por uma agenda partidária envolvendo o preconceito. A maneira como foram abordados temas como aborto, combate à homofobia, questão racial e, mais recentemente, maioridade penal tem tudo a ver com essa perspectiva de intolerância que agora tem uma representação política mais bem definida.
O que fica claro nesse movimento é que o PSDB não parece ser o maior beneficiário daquilo que ele patrocinou. Você vê que nas camadas mais ricas da sociedade o (deputado Jair) Bolsonaro tem mais intenção de voto que (Geraldo) Alckmin e Marina (Silva), por exemplo, e que o próprio Aécio (Neves).
Nunca é bom alimentar a intolerância. A humanidade já está recheada de exemplos disso, mas como eles não tinham uma abordagem socioeconômica alternativa para apresentar, apostaram no retrocesso do comportamento, da cultura.
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